domingo, 6 de janeiro de 2019

No Congresso, Bolsonaro vai priorizar economia. Decretos devem tratar de segurança e costumes

Sessão no Congresso Nacional, em Brasília Foto: Ailton de Freitas / Agência O Globo
Sessão no Congresso Nacional, em Brasília Foto: Ailton de Freitas / Agência O Globo

A fim de aprovar areforma da Previdência no primeiro semestre de 2019, o governo de Jair Bolsonaro dará prioridade máxima ao tema e deixará outras propostas alardeadas como importantes durante a campanha em segundo plano na sua agenda legislativa, tramitando nas comissões. Na tentativa de acelerar a revisão das regras de aposentadoria, os ministros receberam a orientação de fazer um levantamento sobre as ações possíveis em suas pastas por meio de decreto, eliminando a necessidade de recorrer ao Legislativo.
Com esse foco, o governo conseguiu o compromisso do principal candidato à presidência da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), de dar prioridade à agenda econômica do ministro Paulo Guedes. No Senado, embora o cenário esteja mais indefinido, os principais candidatos ao comando da Casa — até Renan Calheiros (MDB-AL), tratado como inimigo pelo PSL de Bolsonaro — também sinalizaram disposição de dar prioridade à proposta de reforma da Previdência, ainda em formulação por Guedes.
Integrante da equipe do ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, para a articulação política do governo com a Câmara, o deputado Carlos Manato (PSL-ES), cujo mandato termina em fevereiro, diz que “o governo também está fazendo um grande esforço para ver o que pode ser feito por decreto”.
— Em todos os ministérios, há a intenção de aprofundar o estudo sobre o que pode ser feito desta maneira, como podemos publicar decretos para desburocratizar a vida das pessoas — diz ele, que disputou sem sucesso o governo do Espírito Santo.
Manato lista o pacto federativo e a reforma tributária como temas fundamentais para o governo, além de propostas que tratam do combate à corrupção.
Antes da posse, o presidente Jair Bolsonaro revelou uma das ações que pretende tocar via decreto. Ele quer garantir, por meio desse instrumento, a posse de armas de fogo a cidadãos sem antecedentes criminais. A posse dá o direito de manter a arma em casa. Para sair com a arma, é preciso ter autorização para o porte. Em entrevista ao SBT, Bolsonaro disse que também quer flexibilizar o porte por decreto.
Também integrante da equipe de Onyx, Leonardo Quintão (MDB-MG), que não se reelegeu, diz que as medidas por decreto visam a “facilitar o setor produtivo”.
— Vamos acabar com portarias, resolução normativas, toda uma burocracia que trava o ambiente de negócios — afirma.
O senador eleito Major Olímpio (PSL-SP) diz que os ministros ainda levantam quais serão as suas prioridades no Congresso, mas adianta que nenhum projeto terá mais urgência que a reforma da Previdência.
— Quando o paciente chega no pronto socorro com hemorragia, você tem que estancar o sangue. Ingressar em uma pauta de costumes, como Escola sem Partido, num momento em que se discute a reforma da Previdência, divide esforço e energia. O resultado pode não ser bom — diz Olímpio.
Na Câmara, a tendência é que os projetos de Guedes sejam analisados logo no início da legislatura. Caso o favorito para a eleição à presidência da Casa, Rodrigo Maia, seja eleito, a sintonia com o ministro da Economia será ainda maior.
Temas importantes abordados na campanha na área social podem ter mais dificuldades no primeiro ano de governo. A deputada eleita Joice Hasselmann (PSL-SP) admite que o acordo de seu partido para apoiar a reeleição de Maia é “apenas econômico”. Na área de costumes, a intenção do partido é usar as redes sociais e conclamar seus eleitores a pressionar parlamentares. A previsão dos pesselistas é que a esquerda se mobilizará para obstruir as pautas sobre esses temas.
A PAUTA GOVERNISTA
Prioridade máxima
Alta importância
Média importância
PAUTA DE COSTUMES
PAUTA ECONÔMICA
PAUTA DA JUSTIÇA
Escola sem partido
Projeto que pretende barrar a suposta “doutrinação” em salas de aula foi arquivado em dezembro em comissão especial
Prisão após condenação em segunda instância
Em discurso inaugural, o ministro Sergio Moro diz que quer “deixar mais claro na lei” a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância
Reforma da Previdência
O tema será o principal desafio do novo governo e o primeiro a ser discutido pelo Congresso
Privatizações de empresas estatais
Na campanha, Bolsonaro se comprometeu a criar um programa de privatização, mas ainda não está claro quais estatais serão vendidas pelo governo
Estatuto do nascituro
O projeto estipula um auxílio a mulheres grávidas que foram estupradas
Proibição de progressão de regime para membros de organizações criminosas armadas
Proposta faz parte do pacote de Moro e tem apoio da bancada da bala
Reforma tributária
Em discurso de posse, Paulo Guedes afirmou que quer unificar sete ou oito tributos em um imposto federal. Acrescentou, ainda, que também buscará descentralizar os recursos
Previsão de operações policiais disfarçadas
para combater o crime
Em seu discurso de posse, Moro anunciou a proposta para combater organizações criminosas
Outras
Redução da maioridade penal e flexibilização do porte e posse de armas

Guedes agradou

No Senado, o governo ainda não acertou seu posicionamento na disputa pela presidência. Por tradição, a maior bancada fica com o comando da Casa e, por isso, o MDB sai na frente. Renan insiste em ser o candidato da legenda, mas tem enfrentado resistências internas e externas. Caso o candidato do partido seja outro, como a senadora Simone Tebet (MS), atual líder, o PSL estuda retirar a candidatura de Major Olímpio.
Crítico à reforma da Previdência do ex-presidente Michel Temer, Renan, porém, tem se mostrado aberto a discutir o texto que será encaminhado por Bolsonaro. No fim de novembro, ele chegou a se reunir com Paulo Guedes. Simone Tebet também é simpática à pauta econômica de Bolsonaro:
— Colegas se disseram bem impressionados com o discurso de posse de Paulo Guedes. Ele colocou com todas as letras o que é importante para o governo. Mas também não passou ideia de radicalismo na reforma da Previdência. O que significa que uma reforma equilibrada, sem radicalismo, sem ser a ideal, mas a possível, passa no Senado.
O governo precisa, porém, vencer um problema numérico no Senado para ter tranquilidade nas votações. Diferentemente da Câmara, para a qual elegeu 52 deputados, o PSL de Bolsonaro terá quatro senadores. Com parlamentares do PSC, Podemos, DEM e outros partidos, o alinhamento ao Palácio do Planalto é calculado em cerca de 30 senadores.
Enquanto tenta ampliar sua base, o governo aposta no apoio à agenda econômica de siglas independentes. Senadores do PSDB têm dito que apoiarão a pauta de Guedes. Dizem que o partido é “reformista” e, por isso, não terá dificuldade em votar propostas como a Previdência. A “oposição construtiva”, em articulação por PDT, Rede, PSB e outros, também diz aceitar discutir assuntos econômicos com o governo.

Amanda Almeida e Bruno Góes, O Globo