terça-feira, 2 de janeiro de 2018

Energia, gasolina e alimentos vão pesar mais no bolso em 2018


Alimentos consumidos em casa devem sair de deflação para alta de até 5% este ano - Hermes de Paula / Agência O Globo


Diane Costa - O Globo


Em 2017, os alimentos deram uma trégua no orçamento do brasileiro, com uma queda inédita de 5,3% no acumulado em 12 meses até novembro. Este ano, porém, o comportamento benéfico destes produtos consumidos em casa, que foram os verdadeiros “mocinhos” da inflação, não deve se repetir. As previsões apontam que a safra de grãos em 2018 deve ser quase 10% inferior à colheita recorde do ano anterior. Além da alimentação, que representa 25% dos gastos das famílias, outros itens devem fazer o papel de vilões na cesta de compras dos brasileiros, como a tarifa de energia elétrica e o preço da gasolina, que devem ter alta superior a 10% cada.

O resultado oficial da inflação do ano passado será divulgado no próximo dia 10, mas a expectativa do mercado é que o índice tenha encerrado o ano abaixo do piso da meta, de 3%. Apesar da pressão maior de alimentos, energia elétrica e gasolina sobre os índices de preços este ano, o próprio Banco Central, em seu último relatório trimestral de inflação, previu inflação abaixo do centro da meta, atualmente em 4,5% ao ano, até 2020. Neste cenário, a alta maior dos preços não será um problema macroeconômico, mas deve interferir na gestão da renda das famílias. Em 2017, com a queda no preço dos alimentos, os brasileiros puderam direcionar parte da sobra no orçamento para o consumo, o que contribuiu para ajudar o país a sair da recessão.

Luiz Roberto Cunha, economista da PUC-Rio, lembra que energia, gasolina e alimentos representam quase um terço dos gastos da família. Com a mudança no comportamento da inflação, o consumidor voltará a fazer mais trocas para equilibrar o orçamento:

— O consumidor já está acostumado a fazer trocas e deixar de comprar alguns produtos quando há alta de preços de alimentos. A previsão é que eles subam de 4% a 5% este ano. É óbvio que, quando esses itens estão mais baratos, sobra mais para outros investimentos, como ocorreu no ano passado — disse o economista, acrescentando que o aperto no orçamento pode ser menor em razão da recuperação do mercado de trabalho, o que significará mais gente com renda.

Menor reajuste do mínimo em 24 anos

A economista Maria Andreia Parente Lameiras, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), explica que a política de juros mais baixos do Banco Central — atualmente a Taxa Selic está em 7% ao ano, o menor patamar da história do país — e a perspectiva de recuperação da economia vão estimular o consumo, o que também acaba pressionando os preços para cima. Em compensação, o salário mínimo, fixado em R$ 954, tende a equilibrar essa balança. O reajuste aplicado, de 1,8%, foi o menor em 24 anos, já que é indexado à inflação, o que deve reduzir os custos salariais e impedir aumentos maiores nos preços dos serviços.

— Com reajustes salariais menores do que em anos anteriores, o custo com a mão de obra vai ser menor — ressalta a economista do Ipea.

Apesar de o Banco Central ter sinalizado recentemente a perspectiva de uma nova redução da taxa básica de juros, a Selic, no início deste ano, o diretor de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Ipea, José Ronaldo de Castro, acredita que os juros não devem pôr em risco o cumprimento da meta de inflação em 2018, pois são compatíveis com o atual grau de ociosidade da economia:

— Embora a taxa de desemprego tenha começado a ceder, ainda se encontra em patamar muito elevado em termos históricos, e a ociosidade ainda é grande na economia.

De acordo com as previsões de analistas, o IPCA, índice oficial de inflação, deste ano deve acelerar em relação a 2017, chegando a 3,96% contra menos de 3% no ano passado. Se as projeções se confirmarem, a taxa fica abaixo da meta do governo de 4,5%.

— Ainda que acelere, temos folga, pois vamos sair de um piso de 3%. Temos uma margem muito boa para não passar dos 4,5% de meta. O cenário é positivo — avalia a economista, que prevê inflação de 2,9% em 2017 e de 4% este ano.

Leandro Negrão, economista do Banco Bradesco, acredita em uma inflação de 3,9% para 2018. Ele pondera que será um ano de incertezas em relação aos preços administrados (controlados pelo governo) por causa do setor elétrico e dos preços do petróleo:

— Temos o petróleo, cujo barril está no patamar de US$ 65, mas é suscetível a riscos geopolíticos, e seu preço pode subir, pressionando a gasolina.

O combustível deve encerrar 2017 com alta de 10,95% e subir nessa mesma magnitude em 2018, de acordo com o diretor do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE), Adriano Pires.

Luis Otávio Leal, economista-chefe do Banco ABC, também destacou o risco de as tarifas pressionarem a inflação para cima. Mesmo assim, ele prevê que o IPCA fique em 2,8% em 2017 e em 4,2% em 2018:

— Em relação à energia elétrica, entramos o ano dependendo do regime de chuvas de verão e do nível dos reservatórios. A retomada da economia aumenta o consumo de energia. Na parte de óleo e gás, vamos depender do mercado externo.

Alessandra Ribeiro, economista da Consultoria Tendências, prevê inflação de 4,1% em 2018. Na sua avaliação, o maior risco para manter os preços comportados é a eleição:
— O cenário eleitoral pode ter efeitos importantes na percepção de risco e pode levar o mercado a desvalorizar o real, o que pressionaria a inflação — comentou a economista, em referência às eleições presidenciais deste ano.

O Banco Central, em seu relatório trimestral de inflação, traçou um cenário mais favorável para o país, apesar da turbulência política e do risco de não aprovação da reforma da Previdência. As expectativas são de retomada de crescimento mais acelerado e de inflação abaixo do centro da meta até 2020. De acordo com o texto, o IPCA deve oscilar em torno de 4% nos próximos três anos.

Quando o Banco Central descumpre a meta de inflação, o que deve ter ocorrido no ano passado, ele tem de mandar uma carta ao ministro da Fazenda para dar explicações. Será a primeira vez que um presidente do BC terá de se justificar por entregar uma inflação abaixo do piso desde que o regime de metas foi implantado, em 1999.

Nível de reservatórios em baixa

Com a falta de chuvas e o nível de reservatórios das hidrelétricas baixo, a conta de luz deve continuar apertando o orçamento do brasileiro este ano. Até novembro, enquanto a inflação geral oficial do país acumulava alta de 2,8% em 12 meses, a variação da energia elétrica chegava a quase 10%. Pelas projeções do diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Adriano Pires, a energia deve acumular em 2017 alta de 10,41% e manter esse patamar de alta em 2018:

— Ano passado, os níveis dos reservatórios ficaram baixos, e o governo teve de ligar as termelétricas, cujo custo de funcionamento é alto, o que levou a muitos meses de cobrança extra nas contas de energia. A tendência é bem parecida para 2018.

Ano passado, o brasileiro teve cobrança extra na conta de luz em nove dos 12 meses: três de nível amarelo, mais brando, e seis de bandeira vermelha, mais cara. Na última sexta-feira, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) anunciou que, este mês, não haverá cobrança extra.

De acordo com o Operador Nacional do Sistema Elétrico, o nível dos reservatórios no Sudeste e Centro-Oeste estava em 21,6% no último dia 28 — inferior aos 33,88% em igual dia de 2016. No Nordeste, o mais castigado, a situação é pior: o volume estava em 12,08%.