Jim Lo Scalzo - 28.fev.17/Associated Press | |
Trump discursa em sessão conjunta do Congresso americano em fevereiro de 2017 |
DO "NEW YORK TIMES"
O presidente Donald Trump passou seu primeiro ano no cargo rompendo todas as regras da comunicação presidencial, conduzindo a elaboração de políticas e a diplomacia pelo Twitter e evitando o tom cuidadoso e mais moderado da maioria dos presidentes em favor de ataques diretos a seus adversários e aliados, igualmente.
Mas nesta terça-feira (30) Trump aproveitará o mais tradicional dos meios presidenciais —uma sessão conjunta do Congresso em que fará seu primeiro discurso sobre o Estado da União— para apresentar o que seus assessores descrevem como uma mensagem otimista, que tentará alcançar além das pessoas que votaram nele em 2016.
Se Trump seguir o roteiro, deverá pedir que o Congresso gaste pelo menos US$ 1 trilhão para reconstruir pontes, rodovias, esgotos e aeroportos. E usará o discurso para tentar influenciar milhões de espectadores a aprovar seu plano de uma série de reformas conservadoras no sistema de imigração do país enquanto também concede a cidadania a até 1,8 milhão de jovens imigrantes.
Mas se seu primeiro ano provou alguma coisa é que não há nada garantido quando Trump encara uma câmera de televisão. Reuniões de gabinete se transformaram em sermões presidenciais. Discursos memoriais viraram momentos de autocongratulação. Sessões rápidas de fotos acabaram sendo longas entrevistas coletivas.
"Quando Trump lê o teleprompter, parece um presidente normal", disse Michael Waldman, que foi diretor de redação de discursos para o presidente Bill Clinton de 1995 a 1999 e escreveu quatro sobre o Estado da União. "Sem o teleprompter, ele soa como um substituto de apresentador de programa de entrevistas."
Quando Trump fez seu primeiro discurso a uma sessão conjunta do Congresso, em fevereiro —que tecnicamente não era sobre o Estado da União—, ele deu uma visão otimista dos EUA, falando com sobriedade e quase literalmente o texto preparado.
Mas antigos autores de discursos disseram que os tradicionais sobre o Estado da União não serviam bem a Trump porque tendiam a ser longas listas de propostas de políticas públicas, montadas ao longo de meses em um processo que envolve funcionários de órgãos de todo o governo federal. Durante seu primeiro ano, o presidente só demonstrou um interesse esporádico pelos detalhes da elaboração de políticas.
Jonathan Horn, que foi redator de discursos para o presidente George W. Bush, disse que o hábito de Trump usar o Twitter poderá minar os benefícios políticos do discurso. Pairando sobre o mesmo, há uma investigação sobre a Rússia que se acelera e um impasse no Congresso sobre gastos.
"No dia seguinte pode haver um tuíte e então o trabalho sobre um discurso muito, muito longo é obscurecido por 280 caracteres", disse Horn, que fez parte de uma equipe que redigiu o discurso sobre a União de Bush em 2008.
Outros presidentes tentaram maximizar os benefícios políticos do enorme público que assiste ao discurso —48 milhões de pessoas viram o presidente Barack Obama fazer o seu primeiro, em 2010— realizando eventos em todo o país nos dias seguintes ao mesmo. Autoridades da Casa Branca não quiseram na última semana dizer se Trump fará isso.
A mensagem de Trump poderá ser um momento crucial no debate sobre seu plano de imigração, que foi condenado pelos dois lados desde que foi apresentado ao Congresso na quinta-feira (25).
Defensores dos imigrantes disseram que a proposta —que encerraria décadas de políticas migratórias baseadas nas famílias e traria uma vasta repressão aos imigrantes que vivem no país ilegalmente— é um plano cruel para fechar as fronteiras do país. Os críticos, que rejeitam a proposta de abrir caminho da cidadania aos "dreamers", a desprezam como uma anistia aos infratores da lei.
O discurso de terça-feira será uma oportunidade para Trump —e Stephen Miller, seu principal redator de discursos e o arquiteto do plano de imigração da Casa Branca— responder a seus críticos.
Autoridades graduadas da Casa Branca disseram que o presidente passará um tempo significativo lembrando a seus espectadores o quanto sua administração realizou desde que ele primeiro prometeu desafiar o establishment e confrontar o que chamou de "esta carnificina americana". Ao fazê-lo, ele refutará as críticas de que seu primeiro ano foi leve em grandes realizações legislativas, apesar de ter um Congresso republicano.
Como já fez diversas vezes, Trump enfatizará a alta recorde das ações, sua agenda desregulamentadora, a confirmação de Neil Gorsuch para a Suprema Corte, a aprovação de um corte fiscal de US$ 1,5 trilhão, a derrota do Estado Islâmico no Iraque e na Síria e um índice recorde de baixo desemprego.
Sobre segurança nacional, os assessores de Trump disseram que o presidente defenderá a tese de aumentar o poder militar, a segurança nas fronteiras e o comércio justo, que os críticos dizem ser um eufemismo para políticas protecionistas.
Trump pode salientar mudanças políticas seminais, por exemplo, a decisão de reconhecer Jerusalém como capital de Israel, como evidência de seu impacto global. Mas está menos claro de que modo o presidente abordará desafios como a ameaça nuclear da Coreia do Norte e o acordo nuclear com o Irã, que ele atirou ao Congresso com a ameaça de rasgá-lo se os legisladores não endurecerem as condições.
"O presidente deveria salientar os sucessos", disse Elliott Abrams, que serviu nos governos Ronald Reagan e George W. Bush.
Além de Jerusalém, Abrams salientou a decisão do governo de oferecer armas letais à Ucrânia, sua imposição de duras sanções à Coreia do Norte e as críticas de Trump à Otan, que segundo ele incentiva seus membros a gastar mais com as forças militares.
Segundo ele, Trump também precisa "analisar francamente as maiores ameaças dos adversários dos EUA", o que o governo fez na estratégia de segurança nacional divulgada no mês passado. Ele citou a China e a Rússia como os maiores inimigos políticos do país.
"Há uma oportunidade de explicar seu pensamento sobre políticas que preocupam as pessoas", disse James Carafano, vice-presidente de estudos de políticas estrangeiras e de defesa na Fundação Heritage, que trabalhou na transição de Trump. "Esses caras criaram um monte de políticas."
Cody Keenan, o principal redator de discursos de Obama durante seu segundo mandato, disse que vai observar se Trump tentará falar às pessoas que não o apoiaram durante a campanha, depois de um ano em que os atos do presidente pareceram mais dedicados a reforçar sua base do que a atrair novos apoiadores.
"Há algum sentido em ele querer falar para as pessoas que não votaram nele?", perguntou Keenan.
"Alerta de 'spoiler': ele vai parecer presidencial", acrescentou Keenan. "Essa é a coisa mais presidencial que um presidente faz, com toda a pompa e circunstância. A pergunta é: o que ele disser será presidencial?"
Tradução de LUIZ ROBERTO MENDES GONÇALVES