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Palestra da Abraji com o jornalista Martin Baron, do "Washington Post" |
NELSON DE SÁ - Folha de São Paulo
Para o editor-executivo do "Washington Post", Martin Baron, desde o governo de Richard Nixon a imprensa americana e o "WP" em especial não enfrentavam tanta "pressão" por parte de um presidente.
"Donald Trump usa linguagem até mais pesada do que Nixon", afirmou o jornalista, em entrevista pública no encerramento do congresso da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), neste sábado (1º), em São Paulo. O editor-executivo coordenou a equipe Spotlight, a mesma do filme vencedor do Oscar de 2016.
Entre as expressões usadas de Trump, ele citou "a forma mais baixa da humanidade" e depois "a forma mais baixa de vida", ou seja: "Ele tenta nos desumanizar".
Lembrou que, em seu primeiro dia no cargo, o presidente americano afirmou estar "em guerra com a mídia", o que ele questiona, da parte do jornal. "Nós não estamos em guerra. Estamos trabalhando."
A função da imprensa, sublinhou, já estava presente quando foi escrita a Primeira Emenda à Constituição americana, que proíbe restrições à liberdade de expressão.
"Eles queriam que nós cobrássemos responsabilidade do governo."
Baron alertou para não cair na armadilha de Trump, que quer tornar a imprensa o "partido de oposição". Segundo ele, "ser independente não é ser oposição".
Questionado sobre paralelos com a situação política no Brasil, o editor do "WP" sublinhou desconhecer, mas afirmou que "certamente envolve mais políticos do que Watergate", referindo-se à cobertura do "WP" que levou à queda de Nixon.
JEFF BEZOS
Sobre o impacto da aquisição do jornal em 2013 por Jeff Bezos, fundador e presidente da Amazon, o jornalista sublinhou que ela não se restrige aos investimentos financeiros.
"Nós estamos nos transformando numa empresa de tecnologia", diz Baron. "Tecnologia é hoje incrivelmente importante para o nosso setor [jornalismo]. E agora nós somos vendedores de tecnologia para outras empresas de mídia."
Segundo ele, a Redação cresceu em 160 jornalistas desde a chegada de Bezos, para pouco mais de 700. Também foram contratados mais de cem engenheiros, que ajudaram a publicação a crescer na internet.
O "WP" tem hoje perto de 80 milhões de visitantes únicos mensais, cerca de 10 milhões abaixo do "New York Times". No final da campanha presidencial, em outubro de 2016, chegou a passar o principal concorrente.