Depois de começar a campanha sem praticamente nenhum apoio partidário e sob a desconfiança do mundo político, o deputado Jair Bolsonaro , candidato do PSL à Presidência nas eleições 2018, chega à reta final do segundo turno projetando construir uma ampla base parlamentar, na hipótese de ser o eleito no domingo.
Em nome da governabilidade, o capitão reformado tenta agora enquadrar a base do PSL, que conta com 52 deputados eleitos, enquanto faz acenos ao Centrão, que perdeu força, mas segue sendo um bloco com poder de fogo na Câmara. Com 142 deputados eleitos – 22 a menos que na legislatura anterior –, o grupo integrado por DEM, PP, PR, Solidariedade, PRB, PSC e PTB quer manter o controle de postos-chave da Casa, entre eles a presidência.
Para ter um ponto de partida confortável e acalmar o DEM, que elegeu 29 deputados federais, Bolsonaro promoveu a primeira intervenção direta na bancada do PSL ao afirmar, na quinta-feira passada, que o partido não vai disputar o comando da Câmara. Anunciado como chefe da Casa Civil caso Bolsonaro seja eleito, o deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS) tem feito a ponte com o DEM, que articula a reeleição de Rodrigo Maia (DEM-RJ) à presidência da Casa.
O movimento do presidenciável parte de duas constatações. A primeira delas é que, se quiser tirar do papel algumas de suas propostas de campanha, terá de garantir apoio confortável na Câmara. Para uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) ser aprovada pelo plenário em dois turnos, por exemplo, são necessários os votos de 3/5 dos deputados (ou 308 votos). A outra constatação é que, seja quem for o novo presidente, ele terá de lidar com um Congresso mais pulverizado – uma dificuldade extra para costurar apoios.
Ministério. Além da sinalização de apoio a Maia, visto pelo presidente do PSL, Gustavo Bebianno, como um “bom nome”, Lorenzoni tem conversado com caciques do DEM sobre eventual participação do partido na Esplanada dos Ministérios.
Derrotado na disputa por uma vaga no Senado por Pernambuco, o ex-ministro da Educação Mendonça Filho (DEM-PE), que é conselheiro da campanha de Bolsonaro, é cotado para reassumir a pasta.
Outro partido que já se aproxima de Bolsonaro é o PSD. A sigla ficou neutra no segundo turno, mas o ministro das Comunicações, Gilberto Kassab, que comanda a legenda, declarou apoio a Bolsonaro. Segundo ele, a maioria do partido segue essa linha e a neutralidade foi declarada a pedido dos diretórios da Bahia e de Sergipe, que apoiam Fernando Haddad (PT).
Com esse dois apoios, Bolsonaro começaria sua eventual gestão com um núcleo duro de 144 deputados governistas: 52 do PSL, 10 do PTB, 8 do PSC, 34 do PSD, 29 do DEM e 11 do Podemos. Tirando o PSD e o DEM, os demais partidos já declararam apoio ao presidenciável do PSL. Quando começou seu mandato em 2003, Lula tinha cerca de 230 deputados na base de apoio.
A projeção do PSL é superar esse número. “Acredito que teremos uma maioria ampla. Bolsonaro não fará braço de ferro pela presidência da Câmara”, disse ao Estado o senador eleito Major Olímpio, presidente do PSL de São Paulo.
Pelas contas dos operadores políticos de Bolsonaro, ele deve contar com uma base superior a 300 deputados, caso seja eleito. Essa projeção foi feita após a formalização do apoio das bancadas evangélica, rural e da segurança.
Reeleito por São Paulo, o deputado Eduardo Bolsonaro, filho do presidenciável, chegou a ser lançado pela sigla como candidato a presidente da Câmara. Outro nome que foi colocado na bolsa de apostas foi o do fundador do PSL, Luciano Bivar. “Em função da cláusula de barreira, 31 parlamentares ficarão sem partido. Pelo menos 15 deles devem vir para o PSL. Com isso, seria natural disputar a presidência da Casa. Manter o Rodrigo Maia seria manter o mesmo rosto”, disse a deputada eleita Joice Hasselmann (SP).
Ela defende o próprio nome para a liderança do governo, Luciano Bivar na presidência da Câmara e a procuradora e deputada eleita Beatriz Kicis no comando da comissão mais cobiçada da Casa, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
Analistas põem em xeque nova tática de negociação
A ideia de negociar diretamente com frentes parlamentares temáticas, aventada pelo presidenciável Jair Bolsonaro (PSL), divide especialistas no assunto. Somadas, as bancadas ruralista, evangélica e da bala, com quem o capitão reformado tem afinidade, representam cerca de 200 votos na Câmara. Alguns analistas políticos, no entanto, duvidam que esses grupos formem uma base sólida para votar temas que não sejam de seu interesse.
“Isso é uma furada. Bancada informal se organiza em torno de um interesse muito exclusivo que, em geral, busca se apropriar de recursos do Orçamento”, diz o analista político e diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Antônio Augusto Queiroz.
A professora do departamento de Ciência Política da Unicamp Andrea Freitas concorda. “Pode funcionar para temas específicos, como o tema da redução da maioridade penal. Mas não se tratará só dessas questões no governo todo”, afirma Andrea. “Terá muito mais dificuldade para aprovar uma reforma econômica polêmica.”
A base dos partidos que fazem parte de sua coligação partidária ou demonstraram apoio no segundo turno (PSL, PTB, PSC, PSD, DEM e Podemos) equivale a pouco mais de 140 deputados.
Para Queiroz, será inevitável articular uma coalizão nos moldes tradicionais, especialmente com caciques do chamado Centrão que demonstraram disposição para apoiá-lo na semana passada. “Eles (Centrão) querem declarar o apoio, e ficam utilizando a retórica de que estão independentes, apenas vão liberar as bases, mas, na verdade, estão é temerosos de que, uma vez declarado o apoio, o candidato descarte.”
Já o cientista político Murillo de Aragão, da Arko Advice, vê um enfraquecimento dos líderes partidários tradicionais, após a renovação de mais da metade da Câmara. O prestígio do Centrão, diz ele, depende da aprovação de matérias favoráveis ao próximo governo ainda no fim deste ano.
Pedro Venceslau e Tulio Kruse , O Estado de S.Paulo