domingo, 9 de julho de 2017

Rodrigo Maia assume tom ‘institucional’ para se distanciar de Temer

O presidente Michel Temer, ao lado do presidente da Câmara, Rodrigo Maia - Givaldo Barbosa / Agência O Globo/7-6-17


Fernanda Krakovics e Cristiane Jungblut - O Globo
Primeiro na linha sucessória da Presidência da República, o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), já cerrou fileiras na tropa de choque do governo Michel Temer e, logo após a delação da JBS vir a público, chegou a se emocionar em defesa do presidente durante uma reunião no Palácio Alvorada para discutir a crise. Esse tempo ficou para trás. Nas últimas semanas, à medida que o esfacelamento do governo cresce e a perspectiva de tornar-se presidente da República começa a se tornar real, Maia passou a assumir uma postura que vem sendo qualificada por alguns como “institucional”.
Na prática, trata-se de uma postura de maior distanciamento do governo, sem ruptura. É também a demonstração pública de que tem condições de comandar o país até as eleições de 2018. Isso ficou evidenciado, por exemplo, quando defendeu em redes sociais na última sexta-feira a necessidade da aprovação de reformas da Previdência, tributária e de mudanças na legislação de segurança pública. Hoje, a grande preocupação do mercado é com o imobilismo que Temer vem demonstrando nas últimas semanas, especialmente em relação à reforma da Previdência.
Diferentemente do peemedebista, que liderou as articulações no Congresso para que o impeachment contra Dilma fosse aprovado, Maia, mesmo nos bastidores, não trabalha para derrubar Temer, segundo o relato de deputados e senadores próximos. Enquanto Temer montou um quartel-general no Palácio do Jaburu no qual discutia abertamente cargos e ministérios para derrubar Dilma, Maia não faz gestos explícitos. No entanto, o fluxo de deputados dos mais diversos partidos na residência oficial da Câmara não para de crescer. O entorno de Maia é unânime em garantir, no entanto, que ele não está conspirando contra Temer.
— Ele não foi mordido pela mosca azul, mas é humano, passa pela cabeça dele que pode ser presidente da República. E ele tem o dever institucional de desenhar esse cenário — disse um deputado do PMDB.
Recentemente alguns deputados notaram, no entanto, que a perspectiva de poder teria alterado a rotina de Maia na Câmara. Há duas semanas, ele avisou ao vice-presidente da Câmara, deputado Fábio Ramalho (PMDB-MG), que ficaria mais nas articulações da reforma política e que deixaria o comando das sessões para ele e outros integrantes da Mesa. Essa mudança para ficar apenas articulando foi a senha para os demais de que ele estava “operando”.
Maia tem sua “candidatura” estimulada por parlamentares, em especial do DEM e do PSDB, além de alguns integrantes da oposição, especialmente no PCdoB. Um dos argumentos que incensam aliados é o de que sua eventual ascensão à presidência não mudaria o grupo que comanda o país. Quando confrontado, o próprio Maia já sinalizou que não faria mudanças significativas na equipe.
PRÓXIMO DA OPOSIÇÃO
Uma alteração que muitos consideram provável, no entanto, é a incorporação de pessoas ligadas ao PCdoB e até de alguns parlamentares do PT no segundo escalão de um eventual governo. Sem se posicionar explicitamente como alternativa, Maia tem no diálogo com todos os campos políticos o trunfo para não precisar dizer explicitamente a já martelada frase de Temer de que “alguém” precisaria unir o país.
Os mais entusiasmados com a estratégia dizem que o PMDB já estaria brigando pela Presidência da Câmara, com o líder Baleia Rossi (SP) e o atual ministro do Esporte, Leonardo Picciani (PMDB-RJ), pleiteando a vaga.
Em meio ao aprofundamento da crise, uma das preocupações de Maia é receber a má fama de traidor. Ele foi eleito para o comando da Câmara com a ajuda de Temer:
— Ele é o número dois no país e está cuidadoso. A pior pecha que se pode colocar em uma pessoa é a de traidor, ainda mais na política — disse um deputado que acompanhava Maia em viagem oficial à Argentina, na última quinta-feira.
Amanhã, Maia terá uma sinalização clara sobre seu destino próximo, quando o relator da denúncia contra Temer por corrupção passiva, Sergio Zveiter (PMDB-RJ), apresentar seu voto na Comissão de Constituição e Justiça, o passo anterior à decisão do plenário. Zveiter deve concordar com a admissibilidade da denúncia do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, enfraquecendo ainda mais a situação de Temer na Câmara. A avaliação majoritária entre deputados é que o parecer terá papel decisivo para o resultado final.
Integrantes da cúpula do DEM tentam minimizar a passividade de Maia, afirmando que ele tem um estilo diferente de Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara, e não vai assumir a linha de frente da defesa do governo, mas que continua leal. Para deputados do PMDB, no entanto, ele está jogando parado:
— O não movimento do Rodrigo é um movimento — disse um peemedebista próximo do presidente da Câmara.
GOVERNO NÃO CRITICA MAIA
Apesar da mobilização crescente no meio político em torno do presidente da Câmara, auxiliares de Temer dizem que não há nenhum reparo a fazer no comportamento de Maia. Como prova de que o presidente da Câmara continua trabalhando a favor do governo, um auxiliar de Temer citou o fato de ele ter tomado café da manhã no Palácio do Jaburu, na última terça-feira, junto com o presidente do Solidariedade, deputado Paulo Pereira da Silva (SP). O objetivo do encontro seria manter o partido, que faz parte do chamado centrão, próximo ao governo.
— Ele tem sido corretíssimo. Tem é um enxame de mosca azul tentando picá-lo: moscas com bico de tucano, moscas com bico petista — afirmou um auxiliar de Temer.
Integrantes do Palácio do Planalto também afirmam que o cronograma feito por Maia para a tramitação da denúncia na Câmara atende o governo, que tem pressa, mas que ele não pode interferir no funcionamento da Comissão de Constituição e Justiça da Casa. A CCJ é presidida pelo deputado Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), que passou a ter uma atuação independente depois que foi preterido para assumir o Ministério da Justiça.
Apesar de ressaltar a lealdade de Maia a Temer, um dirigente do DEM afirmou que a obrigação do presidente da Câmara em relação ao governo tem limite e disse que ele não pode ser cobrado, já que o relator da denúncia na CCJ é um deputado do PMDB, partido do presidente da República, e deve apresentar um parecer favorável à investigação. Zveiter é próximo de Rodrigo Maia, mas aliados dos dois afirmam que a única pessoa que tem influência sobre o relator é seu irmão, o desembargador Luiz Zveiter, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
— Ele carregou o caixão até aqui, mas não vai se enterrar junto. Ele já se expôs pra caramba depois da gravação da JBS, se expôs também defendendo as reformas, e chegou ao limite. Ele tirou o pé — disse um dos deputados mais próximos de Maia.