segunda-feira, 17 de julho de 2017

EUA entenderiam imunidade a ‘quem entrega um presidente da República’, diz Janot


Michel Temer. Foto: Dida Sampaio/Estadão

Julia Affonso, Fausto Macedo e Luiz Vassallo - O Estado de São Paulo

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, revelou em evento nos Estados Unidos nesta segunda-feira, 17, os critérios que o levaram a dar imunidade ao empresário Joesley Batista, da JBS. Janot afirmou que tomaria a mesma decisão se tivesse o caso em mãos hoje.
“Passado o período, com toda a discussão que surgiu, se hoje essa situação surgisse novamente, eu faria de novo sem o menor drama de consciência. Faria de novo tranquilamente”, afirmou.
Joesley delatou o presidente Michel Temer, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) e um procurador da República infiltrado como supostos beneficiários de propinas do grupo.

Em troca, teve garantida imunidade, ou seja, livrou-se de processos penais relacionados à sua delação e está completamente livre. As vantagens concedidas ao empresário provocaram críticas a Janot.
O empresário gravou conversa com Temer na noite de 7 de março no Palácio do Jaburu. O diálogo mostra que o empresário contou ao presidente práticas criminosas, inclusive o pagamento de mensalinho a um procurador da República, Ângelo Goulart, que está preso, e propinas a Eduardo Cunha – detido na Lava Jato desde outubro de 2016 – em troca do silêncio do ex-presidente da Câmara.
“Vamos falar claro: a pessoa que entrega, no curso de cometimento de crime, um presidente da República no exercício do cargo da Presidência, uma pessoa que entrega, no curso de cometimento de crime, um senador da República que teve 50 milhões de votos na última eleição presidencial, uma pessoa que entrega um colega meu procurador da República recebendo dinheiro infiltrado dentro da nossa instituição, para dizer dos nossos movimentos nessa ou naquela investigação, olha, eu duvido que para os padrões americanos se isso não teria sido suficiente para entender a imunidade”, afirmou.
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Segundo Janot, o grande critério para negociar delação premiada precisa ser ‘vaso comunicante’.
“Muita colaboração é: você oferece várias pessoas, você desmantela uma organização, você favorece encontrar e recuperar o ativo, enfim, muita colaboração, muita premiação. Um outro critério que nós utilizamos: um colaborador quando chega, ele não pode dizer assim, ‘olha, eu vou lhe entregar uma estrutura da organização criminosa deste andar para baixo’. Não, é no mínimo do andar dele e do andar dele para cima. Depois, sim, podem existir pessoas dos andares de baixo. Mas no mínimo o próprio andar dele. Se ele chegar, ‘vou colaborar, entregando quem está embaixo’, não me interessa fazer o acordo. Não me interessa fazer. Porque o que nos interessa é desbaratar a organização criminosa. Para que eu possa desbaratar, você tem que me entregar as entranhas dela, tenho que conhecer a estrutura dessa organização criminosa. E a qualidade das pessoas que são entregues”, disse
O procurador destacou que, como o crime estava em curso, ele tinha o monopólio da ação penal.
“No crime em curso eu ia ter que dizer ‘eu vou engolir seco, vou deixar que essas pessoas continuem praticando crime em curso, porque eu não quero conceder imunidade a esse criminoso’. E mais: antes de eu elaborar o acordo esses criminosos concordaram em participar de um outro meio de obtenção de prova que é previsto na lei de organização criminosa que é ação controlada. Sem a garantia do acordo, que não tinha sido realizado, que não tinha sido proposto e a gente estava em negociação, eles se colocaram, se grampearam com áudio e vídeo e foram efetuar pagamento de propina a essas pessoas que cometiam crime”, declarou.
“Esses foram os critérios que nos levaram a admitir a imunidade. E digo mais: passado o período, com toda a discussão que surgiu, se hoje essa situação surgisse novamente, eu faria de novo hoje sem o menor drama de consciência. Faria de novo tranquilamente.”