segunda-feira, 16 de setembro de 2019

OAS afirma que assumiu obra deficitária na Bolívia por exigência de Lula, ladrão número 1 da Lava Jato

Ao negociar acordo de delação, o empresário Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS, mencionou o ex-presidente Lula (PT) como intermediador de negócios da empresa com governos na Costa Rica e no Chile e afirmou que a construtora assumiu uma obra na Bolívia para agradar ao petista.
O então presidente, segundo Léo Pinheiro, queria evitar um estremecimento nas relações do Brasil com o governo de Evo Morales.
A obra mencionada é a construção de uma estrada entre as cidades de Potosí e Tarija, que havia sido iniciada pela Queiroz Galvão em 2003. A Queiroz, porém, se envolveu em uma disputa com o governo de Evo, que cobrava a reparação de fissuras em pistas recém-construídas, e teve contrato rompido em 2007.
De acordo com o relato do empreiteiro, Lula articulou financiamento do BNDES no país vizinho e prometeu à OAS a obtenção de um outro contrato na Bolívia como forma de compensação por tocar um projeto problemático.


Evo Morales e Lula, em evento no Rio, em 2010
O presidente boliviano, Evo Morales, com o hoje presidiário Lula, em evento no Rio, em 2010 - Rafael Andrade - 28.mai.10/Folhapress
O governo brasileiro, disse Léo Pinheiro, afirmou que o impasse proporcionava “riscos diplomáticos” ao país. A paralisação da construção da estrada começou a gerar protestos nas regiões afetadas.
Em encontro em data não informada, Léo Pinheiro diz ter afirmado ao então presidente Lula que a obra seria deficitária, diante dos trechos que precisariam ser consertados e dos preços previstos.
A resposta, ainda de acordo com o relato, foi a de que Evo estaria disposto “a compensar economicamente a empresa, adjudicando um outro contrato em favor da OAS”.
O relato está em proposta de delação de Léo Pinheiro que foi compartilhada por procuradores da Lava Jato no aplicativo Telegram e que foi enviada ao site The Intercept Brasil. Os arquivos foram analisados pelo site e pela Folha (site e Folha são porta-vozes do covil do Lula).
Segundo o depoimento, a Bolívia retirou sanções impostas à Queiroz Galvão, autorizou a transferência do contrato e licitou um outro trecho no qual a OAS se saiu vencedora. Após a empresa assumir a obra em 2009, segundo Pinheiro a situação desandou mais adiante, já no governo Dilma Rousseff (PT), quando a área técnica do BNDES pôs entraves ao financiamento.
O contrato da OAS acabou cancelado pela Bolívia e, segundo Pinheiro, à empresa só restou negociar para retirar seus equipamentos e obter uma devolução de garantias, “após apelos de Lula”.
A construção da estrada, de 340 km, despertou controvérsia na política local. Ainda no ano passado, por exemplo, um senador pediu acesso a dados, como contratos, da obra. O custo total foi estimado pela Bolívia na década passada em US$ 226 milhões (atualmente, em torno de R$ 925 milhões).


Construção e Pavimentação da rodovia Tarija-Potosí, no sul da Bolívia, pela OAS
Construção e Pavimentação da rodovia Tarija-Potosí, no sul da Bolívia, pela OAS - Divulgação OAS
A delação de Léo Pinheiro foi fechada com a Procuradoria-Geral da República e homologada neste mês pelo STF (Supremo Tribunal Federal). Seis procuradores que atuam em Brasília pediram demissão de um grupo da Lava Jato no início deste mês por discordarem da procuradora-geral, Raquel Dodge, em relação a providências quanto ao acordo, como arquivamento de trechos. 
Léo Pinheiro está preso desde 2016 e foi o principal acusador de Lula no caso do tríplex de Guarujá (SP), pelo qual o petista foi condenado e cumpre pena em Curitiba desde abril do ano passado.
Em junho, a Folha mostrou, com base em mensagens trocadas no Telegram, que o relato do empresário só passou a ser considerado merecedor de crédito pela equipe da Lava Jato após mudar diversas vezes sua versão sobre esse caso. (site e Folha são porta-vozes do covil do Lula).
O depoimento que cita o imbróglio na Bolívia foi citado em uma proposta de delação em junho de 2017. Nesse documento, além de casos já conhecidos, como o tríplex, o ex-presidente da OAS também menciona Lula ao falar de palestras contratadas pela empresa na Costa Rica e no Chile para “influenciar em negócios da empresa”.
Segundo o relato, no país da América Central Lula foi contratado pela empreiteira em 2011, por US$ 200 mil, para uma conferência, e intermediou um encontro de Léo Pinheiro com Óscar Arias, ex-presidente costa-riquenho e prêmio Nobel da Paz de 1987.
Também relatou reunião com a então presidente Laura Chinchilla, na qual Lula teria apresentado a empresa para que atuasse em concessões públicas. O negócio, contou Pinheiro, foi concretizado.
No Chile, a OAS tentava se fixar em 2013, quando já havia conseguido integrar um consórcio para a construção de uma ponte no sul do país.
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Segundo Léo Pinheiro, a OAS temia perder o contrato com a mudança de governo, no ano seguinte, e a situação foi explicada a Lula na ocasião de viagem para uma palestra. Michelle Bachelet, do Partido Socialista, tomaria posse em março de 2014.
Ainda segundo o relato, Lula falou que conversou com o ex-presidente chileno Ricardo Lagos, também do Partido Socialista, que teria garantido que a construtora brasileira continuaria na obra.
O empreiteiro disse ainda que, na sequência, Lula pediu dinheiro da OAS para a campanha de Bachelet. Pinheiro disse ter determinado, então, o pagamento de 101,6 milhões de pesos chilenos, o equivalente à época a cerca de R$ 400 mil reais, “nos interesses da campanha de Bachelet”. 
Esse valor, afirmou, foi pago por meio de contrato fictício firmado com a empresa Martelli y Associados, já depois de encerrada a campanha.
Nessa modalidade de repasse, a empresa firma um contrato falso, por exemplo, de consultoria ou de prestação de serviços que nunca foram feitos, para justificar a destinação de dinheiro em benefício de um grupo político.
Em 2017, a OAS foi alvo de mandados de busca em investigação no Chile. Bachelet, após a divulgação de reportagens sobre supostos elos com a OAS, negou irregularidades em sua campanha e disse que todo o financiamento foi regular.
Um outro país citado nos depoimentos é a Guiné Equatorial, na África. Pinheiro afirma que Lula defendeu em 2012, em reunião com o ditador de Guiné Equatorial, Teodoro Obiang, a contratação da OAS para um projeto no país africano, que acabou ficando com a construtora brasileira. 
Com a homologação do acordo, caberá ao Ministério Público e à Justiça decidir se há algum indício de irregularidade nos episódios relatados que exija a abertura de investigações.

OUTRO LADO

A defesa de Lula disse por meio de nota que "a mentira negociada é a estratégia da Lava Jato para promover uma perseguição política contra o ex-presidente".
Ela também afirma que o petista jamais solicitou ou recebeu qualquer vantagem indevida.
"Diálogos já revelados pela própria Folha (porta-voz do covil do Lula) envolvendo procuradores da Lava Jato mostram que Léo Pinheiro foi preso porque não havia apresentado uma versão incriminatória contra Lula. Da prisão, o empresário fabricou uma versão contra Lula para obter os benefícios que lhe foram prometidos, alterando o comportamento por ele adotado durante a fase de investigação", diz, na nota, o advogado Cristiano Zanin. 
"A versão de Léo Pinheiro é desmentida por manifestação apresentada em 07/02/2017 pela empresa do próprio executivo —a OAS— no processo, afirmando que 'não foram localizadas contratações ou doações para ex-presidentes da República, tampouco para institutos ou fundações a eles relacionadas'."
O embaixador da Bolívia no Brasil, José Kinn, afirma que não conhece as declarações de Léo Pinheiro.
Sobre a obra assumida pela empreiteira, disse que a Queiroz Galvão se recusou a reparar 92 km de estrada que estavam "com sérios defeitos" e que a empreiteira brasileira pediu permissão para transferir o contrato à OAS.
Segundo ele, "a OAS declarou que estava fazendo um sacrifício" e pediu que a Bolívia oferecesse outra obra, o que foi negado.
"Em nenhum momento nos comprometemos a 'compensar' com outro trabalho", afirmou o embaixador. 
A defesa de Léo Pinheiro não quis comentar.
A atual direção da OAS tem dito que os relatos feitos por ex-executivos "não competem mais" à companhia e que está colaborando com a Justiça. 
Folha procurou a fundação de Ricardo Lagos para comentar o assunto, mas não obteve resposta. Michelle Bachelet sempre negou irregularidades em relação ao financiamento de sua campanha.

Com informações da Folha de São Paulo