LIMA - O presidente do Peru, Martín Vizcarra, anunciou nesta segunda-feira, 30, que está dissolvendo o Parlamento após a Casa desafiar seus alertas e instalar a eleição dos membros do Tribunal Constitucional. Parlamentares da oposição maioria no Congresso, liderada pelo partido fujimorista Força Popular, afirmaram logo em seguida que vão mover uma ação para destituir Vizcarra do poder.
Em pronunciamento na TV, o presidente justificou sua decisão. “Estou dando uma solução democrática e constitucional ao impasse que enfrentamos há meses ao permitir que os cidadãos definam nas urnas o futuro do país”, justificou Vizcarra.
O Peru enfrenta uma disputa entre os poderes Executivo e Legislativo, em decisões que podem interferir nas sentenças decorrentes do envolvimento de políticos em casos de corrupção com a empreiteira brasileira Odebrecht. Vizcarra havia pedido no domingo para que fosse votado um voto de confiança na Câmara dos Deputados, sob a ameaça de dissolução do parlamento.
Nesta segunda, os deputados não discutiram no plenário o voto de confiança, que propunha impedir o processo eleitoral para membros do Tribunal Constitucional, e elegeram um novo membro para o tribunal.
A decisão do poder legislativo, dominado pela oposição fujimorista, foi considerada encaminhada de “maneira altamente apressada, em apenas cinco dias”, como disse no plenário o primeiro-ministro do Peru, Salvador del Solar. Na prática, porém, a votação forçaria uma interrupção do atual processo de substituição dos juízes.
Apesar dos protestos dos deputados liberais e de esquerda, que liberaram o acesso de Solar ao plenário, o presidente do Congresso, Pedro Olaechea, encaminhou a eleição de seu primo Gonzalo Ortíz de Zevallos para a primeira das seis vagas disponíveis no Tribunal Constitucional. O órgão tem sete vagas no total.
Zevallos conseguiu o número mínimo para aprovação, de 87 votos, de um total de 130. O resultado apertado foi contestado pela oposição, que denunciou fraude na votação. Um segundo nome chegou a ser colocado para votação nesta segunda, mas não foi aprovado.
Olaechea afirmou nesta segunda que as votações para os demais nomes seriam encaminhadas na tarde de terça-feira, sem precisar se o voto de confiança será inserido na pauta.
Pela constituição peruana, o presidente pode dissolver o Parlamento se este conceder duas negativas em votos de confiança presidenciais. Segundo o presidente peruano, essa confiança já havia sido negada duas vezes anteriormente, quando o Parlamento rejeitou projetos de reforma política apresentados este ano, e novamente com o início da votação para escolha dos novos integrantes do Tribunal Constitucional, mesmo sob ameaça de dissolução.
Vizcarra assumiu o cargo em 2018 após a renúncia do ex-presidente Pedro Pablo Kuczynski, envolvido em esquemas com a Odebrecht, sob um discurso anticorrupção.
Existe o receio de que personalidades políticas como Keiko Fujimori, filha do ex-presidente Alberto Fujimori e ex-presidenciável, sejam liberadas da prisão com uma nova composição majoritária na Corte escolhida por seus aliados.
Candidata derrotada nas eleições presidenciais de 2016, Keiko está presa e sob investigação por sua ligação com o escândalo de corrupção envolvendo a empreiteira brasileira Odebrecht.
Vizcarra chegou a propor a antecipação das eleições para 2020, o que reduziria o seu mandato e dos parlamentares em um ano. Porém, a proposta foi arquivada na quinta-feira pelo Congresso. Pela legislação eleitoral peruana, não é possível a reeleição para nenhum cargo, o que gera receio dos congressistas, em sua maioria fujimoristas, de perderem o comando do Parlamento no próximo pleito.
Posicionados em frente ao Congresso desde o domingo, quando começaram a circular as informações sobre a votação dos membros do Tribunal Constitucional, manifestantes favoráveis à dissolução do Parlamento comemoraram a decisão de Vizcarra.
A última vez que um presidente do Peru fechou o Congresso foi em 1992, quando Alberto Fujimori alegou obstrução a temas de segurança e economia. Seus opositores, no entanto, afirmam que ele fez isso para barrar investigações de corrupção.
O escândalo da Odebrecht atingiu quatro ex-presidentes do Peru: Pedro Pablo Kuczynski, que cumpre prisão domiciliar; Alejandro Toledo, que aguarda decisão sobre sua extradição dos EUA; Ollanta Humala, que responde em liberdade após a promotoria do Peru pedir pena de 20 anos de prisão; e Alan García, que se suicidou em abril antes de ser preso preventivamente por envolvimento no escândalo. / EFE, REUTERS e AFP
O Estado de S.Paulo