Eduardo Bresciani - O Globo
Uma empresa da família do relator da CPI do Carf, o deputado João Carlos Bacelar (PR-BA), foi um dos alvos ontem da Operação Tabela Periódica, da Polícia Federal, que investiga a atuação de um cartel de empreiteiras em licitações da Valec, estatal federal da área de ferrovias. A Embratec foi apontada em acordo de leniência da empreiteira Camargo Corrêa como uma das empresas do esquema. Pela investigação, chegam a 37 as empresas que participaram do cartel.
Bacelar é herdeiro da empresa, que permanece tendo como sócio-administrador nos registros da Receita Federal o pai do deputado, já falecido. O deputado nega que a empresa da família tenha participado do cartel.
— A empresa da família foi extremamente prejudicada com esta situação, pois seu consórcio além de participar e perder o processo licitatório foi envolvido erroneamente no chamado cartel. Cartel para perdedor? — respondeu o parlamentar, por mensagem de texto.
A Operação Tabela Periódica investiga prejuízos aos cofres públicos de R$ 631,5 milhões. Foram cumpridos ontem 44 mandados de busca e apreensão e 14 mandados de conduta coercitiva em Goiás e outros oito estados. O objetivo é colher provas adicionais sobre o envolvimento de empreiteiras e seus executivos em crimes de formação de cartel, fraudes e pagamento de propinas.
Desdobramento da Lava-Jato, a operação é também uma nova etapa da Operação O Recebedor, deflagrada em 26 de fevereiro. A Camargo Corrêa já se comprometeu a devolver R$ 800 milhões aos cofres públicos, dos quais R$ 65 milhões destinados a ressarcir os danos causados à Valec.
Segundo o documento do acordo de leniência da Camargo Corrêa, tornado público pelo Conselho Administrativo e Defesa Econômica (Cade) ontem, a Embratec participou do cartel em licitações no ano de 2010 de obras das ferrovias Norte-Sul e Oeste-Leste. A empresa, porém, fez parte de um consórcio que acabou perdendo o lote que lhe tinha sido direcionado pelo acordo dos empreiteiros, gerando até surpresa entre os participantes do esquema. “A expectativa do cartel era que o Consórcio Ferrovias do Brasil (composto pelas empresas Embratec/ Paviservice/ S.A. Paulista/ Somague/ Top) se sagrasse vencedor”, diz trecho do documento.
Em gravação obtida pelo GLOBO, em 2012 a ex-mulher do deputado, Isabela Suarez, afirmou que o parlamentar tinha tentado direcionar um lote da ferrovia Oeste-Leste para a empresa da família. Segundo o relato dela, a tentativa foi frustrada porque o deputado Valdemar Costa Neto, líder do PR, interferiu a favor de uma empresa portuguesa, a Cavan.
Na gravação, Isabela disse: “João foi tirado, João não participa mais. Na época foi o maior bafafá, a gente tentou articular para ele voltar. Na época foi a maior confusão porque tinha um lote destinado a ele. Parece que Valdemar Costa Neto se juntou com uma empresa de Portugal e o tirou da jogada. Ele foi limpado do processo”.
Os executivos da Camargo Corrêa contam que o cartel existe, ao menos, desde o governo Fernando Henrique. Relatam uma licitação dessa época na qual teria havido direcionamento por ele para beneficiar Camargo, Mendes Jr., SPA e Andrade Gutierrez.
Segundo o documento, a prática se consolidou a partir de 2003 e foi ampliada em 2010, chegando a contemplar as 37 empresas. José Francisco das Neves, o Juquinha, ex-presidente da Valec, teria sido o responsável pela ampliação do cartel, incluindo construtoras de menor porte. Juquinha ocupou o cargo por indicação do PR, partido de Bacelar e Valdemar.