LUCIANA DYNIEWICZ - Folha de São Paulo
Se empresários brasileiros reclamam ao governo interino de Michel Temer de dificuldades para vender no mercado argentino, na Argentina empresários se queixam da abertura comercial aos produtos importados, principalmente do Brasil.
Acostumada com o protecionismo do governo de Cristina Kirchner (2003-2015), a indústria argentina passou a competir mais com mercadorias internacionais desde dezembro, quando Mauricio Macri, tido como pró-mercado, chegou à Presidência.
Ao assumir, o dirigente derrubou a Djai (Declaração Jurada de Autorização à Importação), documento que o exportador tinha de solicitar ao governo para seu produto entrar no país e para o qual não havia prazo de resposta.
O fim da Djai abriu o mercado, mas, mesmo assim, as importações argentinas caíram 5,8% nos seis primeiros meses deste ano.
A retração não deixou tranquilo o empresariado, que diz que a preocupação com a entrada de produtos estrangeiros é crescente devido à baixa competitividade –o peso está valorizado, e a inflação torna as mercadorias caras.
Segundo economistas, o recuo das importações é decorrente da recessão, e não de um aumento da participação do produto nacional no mercado doméstico –a produção industrial recuou 3,3% no primeiro semestre.
A UIA (União Industrial Argentina), entidade equivalente à CNI, estima que até 150 mil empregos possam ser fechados com o incremento das importações.
Membro da mesa diretora da entidade, José Urtubey evitou dar à Folha uma projeção, mas destacou que postos de trabalho já foram fechados na indústria, grande parte impactada pela concorrência com as importações. De dezembro a maio, 106.944 vagas foram encerradas no setor privado, segundo o governo.
Sob pressão, Macri criou uma lei que protege a indústria de autopeças e ampliou, neste mês, o número de licenças não automáticas de importação, que coloca um prazo de 60 dias para a liberação da entrada de um produto e torna o processo de compra internacional mais lento.
Para o economista Aldo Pinganelli, Macri alterou sua política de comércio exterior devido à crise interna, impulsionada tanto pela queda da demanda como pelo recuo das exportações brasileiras.
"O governo teve um primeiro momento de se abrir para importações. Depois, mudou e veio com as restrições não automáticas", diz Pignanelli, que presidiu o banco central em 2002 e integra a equipe de Sergio Massa (terceiro colocado nas eleições de 2015).
"A abertura da Argentina hoje é maior do que no kirchnerismo, mas mais protecionista do que se previa quando Macri assumiu", afirma o economista Gastón Rossi, da consultoria LCG.