sexta-feira, 29 de julho de 2016

Lula, Delcídio, e mais cinco viram réus por tentar obstruir Lava-Jato


O ex-presidente Luiz Inacio Lula da Silva vira réu na Justiça Federal do Distrito Federal - Edilson Dantas / Agência O Globo


André de Souza - O Globo


A Justiça Federal do Distrito Federal aceitou denúncia contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-senador Delcídio Amaral, o banqueiro André Esteves e outras quatro pessoas por tentativa de obstrução das investigações da Operação Lava-Jato. Com isso, eles passam a ser considerados réus. A decisão foi tomada pelo juiz federal Ricardo Augusto Soares Leite.

Em 21 de julho, a Procuradoria da República no DF reiterou denúncia contra eles, acusando-os dos crimes de organização criminosa, exploração de prestígio e patrocínio infiel. Também são réus o pecuarista José Carlos Bumlai, seu fiho Maurício Bumlai, o advogado Edson Ribeiro, e Diogo Ferreria, ex-assessor de Delcídio.

A primeira denúncia foi feita em dezembro pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, quando o caso ainda tramitava no Supremo Tribunal Federal (STF). Um aditamento foi feito posteriormente para incluir Lula entre os denunciados. Com a cassação do mandato de senador de Delcídio em maio deste ano, ele perdeu o foro privilegiado e a investigação foi enviada para a Justiça Federal de Brasília.

Numa das diligências das investigações, a Procuradoria Geral da República (PGR) pediu dados bancários que comprovassem as movimentações financeiras dos Bumlai com vista a barrar a delação do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró. Essa diligência foi autorizada pelo STF, segundo fontes com acesso às investigações. As provas, obtidas após o ex-presidente ser denunciado, corroboraram as acusações e foram incluídas na reiteração da denúncia. Todo o material é mantido sob sigilo.

Em delação premiada, Delcídio acusou o Lula de participação na tentativa – frustrada – de derrubada da delação de Cerveró. Segundo o delator, o ex-presidente agiu para que a família Bumlai interferisse – inclusive financeiramente – nos rumos da colaboração do ex-diretor da Petrobras.

Delcídio disse ter procurado o filho do empresário, Maurício Bumlai, e obtido repasses em dinheiro vivo. O próprio senador disse ter feito um repasse de R$ 50 mil ao advogado de Cerveró, Edson Ferreira. Os dados bancários mostram uma movimentação financeira pouco antes dos repasses em dinheiro vivo, conforme a denúncia, e reforçam a participação do grupo na atividade criminosa. André Esteves, do Banco BTG, fez o mesmo a partir de uma ofensiva do grupo de Delcídio, ainda conforme a delação. O caso levou à prisão de Delcídio em novembro do ano passado. Ele foi solto em fevereiro após virar delator.

Na decisão, o juiz explicou que ainda não analisou a defesa feita por alguns dos réus. 

Segundo ele, o momento para isso é posterior ao recebimento da denúncia. De acordo com o juiz, há "lastro probatório mínimo apto a deflagrar a pretensão punitiva" no caso. Ele também atendeu pedido do Ministério Público para levantar o sigilo do processo, com exceção dos dados bancários, fiscais e telefônicos.

LULA DIZ QUE AINDA VAI AVALIAR DECISÃO


— Eu não quero falar dos meus problemas pessoais para não transformá-los em coletivos. Mas enquanto estou aqui conversando com vocês eu fiquei sabendo que foi aceita uma denúncia contra mim de obstrução da Justiça. Eu não conheço a notícia, vamos ver o que é — disse Lula, em palestra na Conferência Nacional dos Bancários, em São Paulo.

Por meio de nota, a defesa de Lula disse que ele ainda não recebeu citação relativa ao processo. Quando isso ocorrer, os advogados apresentaram sua defesa.

"Lula já esclareceu ao Procurador Geral da República, em depoimento, que jamais interferiu ou tentou interferir em depoimentos relativos à Lava Jato. A acusação se baseia exclusivamente em delação premiada de réu confesso e sem credibilidade - que fez acordo com o Ministério Público Federal para ser transferido para prisão domiciliar. Lula não se opõe a qualquer investigação, desde que realizada com a observância do devido processo legal e das garantias fundamentais", diz a nota.

A defesa de Bumlai informou que, caso o processo seja mantido, irá provar que o empresário jamais deu dinheiro a Cerveró ou sua família para comprar silêncio ou obstruir a Justiça. "A maior confirmação de que essa situação não procede é que a delação foi concretizada e o próprio Cerveró afirmou, em outro processo, que nunca tratou com Bumlai sobre qualquer irregularidade no âmbito da Petrobras", diz o advogado Conrado de Almeida Prado, por meio de nota.


André Esteves, do BTG Pactual - Chris Ratcliffe / Bloomberg News/21-1-2015



Também por meio de nota, o advogado de André Esteves, Sepúlveda Pertence, disse não haver justa causa para abrir processo penal "em bases tão fracas”.

“O juiz deve ainda examinar se é caso de absolvição sumária ou mesmo de rejeição da denúncia, e nós vamos lutar por isso, pois estamos convencidos de que nosso cliente não cometeu nenhuma irregularidade. Não há justa causa para abrir processo penal em bases tão fracas”.

Na Procuradoria da República do DF, a ratificação da denúncia da PGR foi feita pelo procurador Ivan Cláudio Marx. Ele fez acréscimos, ampliando a descrição dos fatos e as provas contra os acusados.

O crime de constituição de organização criminosa tem pena prevista de três a oito anos de prisão. Exploração de prestígio com o fim de influenciar uma testemunha leva a reclusão de um a cinco anos. Patrocínio infiel, quando um advogado prejudica os interesses do cliente, é punido com detenção de seis meses a três anos.

Após a cassação do mandato do senador, Janot queria que as investigações fossem transferidas para a 13ª Vara Federal em Curitiba, onde o juiz Sérgio Moro conduz os processos da Lava-Jato. Mas o ministro Teori Zavascki, relator da Lava-Jato no STF, ponderou que o caso não tem relação direta com os desvios da Petrobras. O ministro também explicou que os supostos crimes teriam ocorrido na capital federal, daí a remessa dos autos para um juiz de Brasília.