Janaina Figueiredo - O Globo
Pablo Giancaterino, que defende detentores individuais de bônus da Argentina, diz que conflito mostra fracasso da reestruturação da dívida do país
BUENOS AIRES - Os fundos abutres que foram beneficiados pela sentença do juiz de Nova York, Thomas Griesa, para receber US$ 1,5 bilhão da Argentina, não são os únicos credores do país que não participaram das operações de reestruturação da dívida realizadas em 2005 e 2010, e que também estão, há mais de dez anos, brigando nos tribunais americanos para receber 100% do que investiram em papéis argentinos. Em muitos casos (não justamente o dos abutres), os credores adquiriram os títulos antes do histórico calote de 2001, quando comprar bônus da dívida argentina era considerado um bom negócio.
Eles se consideram, segundo disse ao GLOBO o advogado argentino Pablo Giancaterino, do estúdio Dias Reus, que defende um grande grupo de holdouts, “credores legítimos, que nada têm a ver com a especulação dos fundos abutres”. Os clientes de Giancaterino já obtiveram sentenças favoráveis e, embora façam questão de se diferenciarem dos abutres, seu futuro depende do chamado “julgamento do século”, em Nova York. “Nós sempre quisemos negociar”, enfatizou o advogado.
O senhor defende um grupo grande de holdouts?
Sim, não são fundos de investimento, são credores individuais, que possuem oito tipos diferentes de bônus argentinos, dos 24 que entraram no calote e são regulados pelas leis de Nova York.
O caso já foi tratado pela Justiça americana?
Sim, já temos uma sentença a nosso favor, mas, ao contrário dos abutres, nosso caso não chegou à Corte Suprema dos Estados Unidos. No entanto, a decisão da Corte de ratificar a sentença de Griesa a favor dos abutres nos favorece. O que deveria ter acontecido, que nunca aconteceu, é que o governo argentino teria de ter convocado todos os advogados, de todos os holdouts, para uma negociação. Vamos continuar insistindo, não pode haver uma negociação bilateral, com um pequeno grupo de credores, e com os demais não.
Qual é o montante da dívida de seus clientes?
Entre US$ 700 milhões e US$ 1,5 bilhão. São credores argentinos e de outros países também. Este é um universo muito grande. Somente em Nova York, existem cerca de 180 demandas contra a Argentina. São centenas de credores.
Como o senhor avalia a estratégia do país no caso dos fundos abutres?
Não vemos boa-fé. Se negociaram com o Clube de Paris, com a Repsol, por que não com os credores? Nesta história existe muita hipocrisia. Muitos fundos foram muito beneficiados pelas operações de renegociação da dívida. Fizemos várias trocas e hoje a dívida do país é ainda maior (cerca de US$ 250 bilhões). Nossos clientes são credores legítimos, não são especuladores. São pessoas que investiram em bônus da dívida argentina antes do calote e jamais foram ouvidos.
Por que eles não aceitaram as trocas de 2005 e 2010?
Porque consideram injusto aceitar uma redução do dinheiro que investiram nos papéis. É confortável para o governo colocar todos no mesmo barco, mas não são todos iguais. Este conflito foi banalizado pela guerra entre o governo e dois grandes fundos de investimentos que especularam e tudo isso o que demonstra é o fracasso das operações de troca. O poder político não controla estas reestruturações e todo o processo, a nível mundial, deveria ser analisado e modificado.
O senhor está otimista?
Sim, porque sempre defendi um acordo judicial. O problema é que, por incrível que pareça, o calote é um bom negócio para muitos especuladores e, até mesmo, para alguns políticos.