sábado, 3 de março de 2018

Siderúrgicas brasileiras perdem R$ 1,9 bi em valor de mercado devido à decisão de Trump


Corretotres da Bolsa de NY no momento do fechamento dos mercados nesta sexta-feira (02/03). As ações americanas caíram, acompanhando o movimento em todo o mundo, por causa da decisão de Trump sobre o aço. - BRYAN R. SMITH / AFP


RIO, SÃO PAULO, BRASÍLIA E NOVA YORK - Enquanto o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, se gabava no Twitter de que “guerras comerciais são boas e fáceis de ganhar”, o restante do mundo reagia com perdas bilionárias nas Bolsas e ameaças de retaliação a sua proposta de taxar a importação de aço e alumínio. As siderúrgicas listadas na B3 (antiga Bovespa) perderam nesta sexta-feira R$ 1,91 bilhão em valor de mercado, devido à queda de suas ações. Diante do temor de uma guerra comercial global, organismos internacionais tradicionalmente cautelosos, como União Europeia e Organização Mundial do Comércio (OMC), foram contundentes.

Na quinta-feira, Trump anunciou que vai impor sobretaxa de 25% às importações de aço e de 10% às de alumínio, alegando motivo de segurança nacional: precisa ter aço para produzir equipamentos militares. Ontem, no Twitter, Trump empregou um tom desafiador para responder às críticas ao plano, sugerindo que uma guerra comercial seria bem-vinda. Um dos temas de sua campanha eleitoral fora suposta injustiça nas relações comerciais dos EUA, sobretudo com China e Japão.

“Quando um país (EUA) está perdendo bilhões de dólares no comércio com virtualmente todos os países com os quais faz negócios, guerras comerciais são boas e fáceis de ganhar”, escreveu o republicano na rede social. “Quando um país taxa nossos produtos em, digamos, 50%, e nós taxamos esses produtos em ZERO, isso não é justo nem inteligente. Em breve vamos ter impostos recíprocos de forma que tributaremos a mesma coisa que eles nos taxam. (Com um) déficit comercial de US$ 800 bilhões, não há escolhas!”

INSTITUTO QUER QUE BRASIL TAMBÉM ADOTE TAXAS

A possibilidade de aumento das tarifas de importação sobre o aço e o alumínio nos Estados Unidos atingiu em cheio o desempenho das ações do setor no Brasil. Na última semana, com o aumento da expectativa em relação à mudança, a desvalorização ultrapassou os 10%, mesmo que apenas uma pequena parcela das vendas das siderúrgicas brasileiras tenha como destino os Estados Unidos.

— O anunciado protecionismo ensejou fuga em massa dos ativos de risco, especialmente das Bolsas globais, além de ter semeado temores de que a iniciativa provoque uma guerra comercial mundo afora — avaliou Ricardo Gomes da Silva, superintendente da Correparti Corretora.

A expectativa das sobretaxas vinha ganhando força desde o carnaval, quando Trump tocou no assunto pela primeira vez, mas só na quinta-feira foi sinalizada como algo concreto. No acumulado da última semana, o papel que mais sofreu no Brasil foi o da CSN, com queda de 10,2%, a R$ 9,21. No caso da Usiminas, o tombo foi de 7%, para R$ 11,34. Os papéis menos afetados foram os da Gerdau, com recuo de apenas 1,5% na semana. A empresa também produz nos EUA e poderia se beneficiar das tarifas sobre produtos importados.

As ações da CSN e da Usiminas recuaram, só ontem, 5,05% e 3,89%, respectivamente. 

Com a queda, a primeira perdeu R$ 679,8 milhões em valor de mercado, enquanto a Usiminas registrou desvalorização de R$ 597,5 milhões. No caso da Gerdau, sua queda ontem foi de 2,38%, proporcionando uma perda de R$ 458,6 milhões em capitalização. A holding Metalúrgica Gerdau recuou R$ 180,1 milhões.

Foram esses papéis que mais pressionaram ontem o Ibovespa, principal índice de ações do mercado brasileiro. Pela manhã, a queda foi de mais de 1%. Mas, à tarde, a melhora dos mercados americanos e o desempenho positivo da Petrobras fizeram com que o índice encerrasse em alta de 0,45%, aos 85.761 pontos. Segundo Ari Santos, gerente de renda variável da corretora H.Commcor, os investidores exageraram no pessimismo em relação às sobretaxas e, aos poucos, corrigiram os excessos:

— Essa notícia causou um desgaste mundial, já que há um temor de uma guerra comercial. Mas, após esse impacto, as Bolsas nos Estados Unidos começaram a reagir, melhorando o desempenho do Ibovespa.

De fato, os principais índices americanos também conseguiram se recuperar. Depois de cair mais de 1%, o S&P 500 fechou em alta de 0,51%, enquanto a Bolsa eletrônica Nasdaq avançou 1,08%. A única queda foi no Dow Jones, mas de apenas 0,29% — pela manhã, também caíra mais de 1%. Já os mercados europeus, que fecham mais cedo pela diferença do fuso, encerraram em queda. O DAX, de Frankfurt, recuou 2,27%, e o CAC 40, de Paris, perdeu 2,39%. Em Londres, o FTSE 100 caiu 1,47%. Na Ásia, a Bolsa de Tóquio teve queda de 2,50%, e a de Hong Kong, de 1,48%.

Para o presidente do Instituto Aço Brasil, Marco Polo Mello Lopes, o governo brasileiro precisa aumentar as tarifas de importação sobre o aço, atualmente de 12%, em média. 

Isso, diz, seria uma forma de evitar que o Brasil seja invadido por produtos siderúrgicos de outros países que perderão acesso ao mercado americano com as sobretaxas.

— O Brasil não pode ser ingênuo. Também tem que subir suas alíquotas de importação, para que o mercado interno não seja inundado — disse Lopes.

Em nota, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) classificou a decisão do governo americano de “injustificada e ilegal”. Se adotadas as sobretaxas para o aço e o alumínio, alertou a entidade, as exportações brasileiras serão prejudicadas. Para a CNI, “o governo brasileiro deve utilizar todos os meios disponíveis para responder à decisão americana, inclusive no âmbito da OMC.

ELECTROLUX ADIA INVESTIMENTO NOS EUA

A agência de classificação de risco Moody’s, no entanto, acredita que a adoção de sobretaxas será administrável para os produtores brasileiros. Isso porque as exportações de produtos acabados (aços planos e longos) não representam 22% do volume total vendido aos EUA. Segundo a Moody’s, as exportações de Usiminas e CSN para os EUA não são significativas, e a Gerdau seria beneficiada por ter operações naquele país.

Trump, no entanto, já sofreu um revés por conta de sua decisão. A sueca Electrolux, maior fabricantes de eletrodomésticos da Europa, informou ontem que postergaria um investimento de US$ 250 milhões no estado americano de Tennessee por causa das sobretaxas.

— Estamos colocando esse plano em espera. Acreditamos que as tarifas podem causar um aumento significativo do preço do aço no mercado americano — afirmou Daniel Frykholm, porta-voz da Eletrolux.

A companhia compra localmente todo o aço que utiliza em suas operações nos EUA.