sábado, 31 de março de 2018

Indústria e agropecuária geram emprego em cidades na contramão da crise


Mãos à obra. Fábrica da MAN, em Resende. Indústria automobilística ajudou na geração de vagas. Cidade foi a que mais criou empregos com carteira no Estado do Rio
Foto: Márcia Foletto / Agência O Globo



Diane Costa, O Globo

A recente recuperação do mercado de trabalho brasileiro ainda não chegou aos empregos formais. Como informou o IBGE esta semana, o número de trabalhadores com carteira assinada ficou em 33,1 milhões em fevereiro — o menor patamar dos últimos seis anos.

Em 2017, os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério do Trabalho registraram o fechamento de 20 mil vagas formais. Mas algumas cidades do país foram na contramão da tendência nacional.

Levantamento do Ibre/FGV com base no Caged mostra que em 54% dos municípios brasileiros o número de vagas formais abertas superou o de demissões. E as três cidades que mais geraram emprego foram Joinville (SC), com a criação de 5.467 novos postos; Bebedouro (SP), com 4.109; e Aparecida de Goiânia (GO), com 3.801. Em comum, esses municípios têm indústrias consolidadas, exportadoras, de segmentos que foram menos afetados pela recessão ou que tiveram a ajuda do campo — a agropecuária foi a atividade que mais cresceu em 2017.

EM JOINVILLE, GRANDES EXPORTADORES

O mercado de trabalho de Joinville, a cidade mais populosa de Santa Catarina, com cerca de 600 mil habitantes, tem se beneficiado nos últimos quatro anos da instalação de duas montadoras: a GM, no próprio município, e uma unidade da BMW, em Araquari, do qual é vizinho.

— Essas duas empresas não só geraram muitos empregos quando aqui se instalaram, como continuam fomentando toda a cadeia produtiva. Empresas de transporte, alimentação, peças para automóveis, comércio e serviços ligados à saúde do trabalhador foram segmentos impulsionados, gerando empregos — observa Jani Floriano, professora de Economia da Universidade da Região de Joinville (Univille).

Ela diz, ainda, que o município conseguiu passar quase ileso pela crise econômica que atingiu o país entre 2014 e 2016 porque é uma cidade de grandes indústrias exportadoras — ainda que hoje comércio e serviços representem 65% de sua economia —, com fabricantes de linha branca, compressores, tubos, conexões e materiais hidráulicos, motores e transformadores.

A indústria também foi a responsável por uma geração de vagas superior às demissões no município de Aparecida de Goiânia. A cidade, cuja população é semelhante à de Joinville, é localizada às margens da BR-153, a quarta maior rodovia brasileira — ligando o Rio Grande do Sul ao Pará —, e fica colada à capital goiana.

— É uma região com potencial de crescimento muito grande e em constante expansão devido à localização. A Belém-Brasília (a BR-153) é um importante ponto de escoamento. Por isso, temos atraído muitas transportadoras e centros de distribuição de medicamentos e atacadistas. É uma cidade bastante industrial, com quatro distritos de segmentos que pouco foram afetados pela crise, como alimentos e cosméticos. Além disso, o estado tem uma política de concessão de incentivos fiscais muito exitosa — explica Flávia Rezende, professora de Economia Regional e Urbana da Universidade Federal de Goiás.

LARANJA GARANTIU VAGAS EM BEBEDOURO

Já o bom desempenho da paulista Bebedouro, a segunda melhor do ranking, é explicado pelos empregos criados no setor agropecuário, cujo carro-chefe é a produção de laranja. Cinco anos depois de enfrentar demissões e uma das maiores crises do setor citricultor, a safra dessa fruta, ano passado, foi 60% maior do que em 2016, demandando mais mão de obra.

Reflexo da crise fiscal e econômica que atinge o governo estadual, atrasando salários e pagamentos de servidores e fornecedores, o Estado do Rio tem cinco cidades, além da capital, na lista dos 20 municípios do país que mais destruíram vagas em 2017. A capital é a primeira dessa lista. Perdeu quase 60 mil postos de trabalho. Destoando estão Resende, Piraí e Itaguaí. As três cidades foram as que tiveram os maiores saldos positivos no estado. Geraram, em 2017, 1.306, 553 e 546 vagas, respectivamente.

— Até 2014, nossos municípios vinham com saldos positivos. Isso se inverteu a partir de 2015, quando os saldos negativos se espalharam. Isso ocorreu, principalmente, pelo próprio comportamento do PIB do país, que começou a cair, levando com ele empregos em serviços, construção civil, comércio e indústria de transformação. O município que mais gerou vagas, Resende, recuperou apenas 2% do que a capital destruiu — avalia Luciana da Silva Ferreira, economista e professora da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.

Na avaliação de Luciana, a história de Resende é semelhante à de Aparecida de Goiânia: tem indústrias ou está próxima a segmentos que foram bem ano passado, como o farmacêutico e o automotivo. Itaguaí, por sua vez, se beneficia da atividade portuária. E Piraí colhe os frutos da digitalização.

— Resende é um município muito organizado e, por estar próximo de São Paulo e ficar à beira da Dutra (a rodovia), se beneficia disso. Piraí, com seu projeto Piraí Digital, organizou as finanças do município e atraiu empresas com uma melhor infraestrutura tecnológica que seus vizinhos no estado — observa Leonardo Mulls, professor de Economia da UFF.

No caso de Resende, a indústria automobilística voltada à exportação foi um grande incentivo ao emprego e à atividade econômica no ano passado. A cidade abriga a fábrica de ônibus e caminhões da MAN na América Latina. No ano passado, a unidade contratou 300 funcionários, 200 na linha de produção e outros cem no recém-criado centro para atendimento aos clientes das marcas Volkswagen Caminhões e Ônibus e MAN, o Customer Forum.

PETRÓLEO DEVE AJUDAR ESTADO DO RIO ESTE ANO

Na ponta oposta, além da capital, as cidades fluminenses que mais fecharam vagas foram Macaé (-8.941) e Duque de Caxias (-8.534).

Bruno Ottoni, economista do Ibre/FGV, diz que, para 2018, a tendência é que menos cidades do Estado do Rio figurem no ranking das piores empregadoras, devido ao preço mais alto do barril de petróleo — atualmente está em US$ 69 — commodity importantíssima para a economia fluminense:

— As perspectivas são melhores por razões externas. Com o preço do petróleo mais alto, o efeito será positivo inclusive sobre a situação das contas públicas estaduais. E com o governo federal acenando com a possibilidade de empréstimos, há esperança de que a questão da segurança melhore, o que também afetaria positivamente a economia.