Paul Chinn - 27.jan.2010/Associated Press | |
Steve Jobs, então presidente da Apple, durante o evento de lançamento do iPad, em 2010 |
FILIPE OLIVEIRA - Folha de São Paulo
Desde as primeiras décadas do século 19 se dizia que as notas de óperas e sinfonias brotavam no pensamento do compositor austríaco Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) com impressionante naturalidade.
As obras surgiam prontas em sua mente quando ele estava de bom humor, enquanto passeava de carruagem ou esperava o sono.
Mas, na verdade, o processo criativo do compositor austríaco era muito menos fantástico do que isso.
Segundo o pesquisador do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts, nos EUA) Kevin Ashton, Mozart sentava-se ao piano, esboçava uma composição, tocava alguns trechos, as corrigia, aprimorava, às vezes empacava em alguma passagem e trabalhava muito até solucioná-la.
O livro de Ashton "A História Secreta da Criatividade" tem uma missão: convencer leitores de que, assim como Mozart, todas as pessoas podem ser criativas se dedicarem tempo e esforço.
No livro, Ashton mistura casos de criadores em diversas áreas, da ciência às artes, passando pelos negócios e pela aviação, com resultados de estudos que avaliaram o modo como inventamos.
Ele próprio é um desses criadores –foi ele quem começou a conectar objetos cotidianos à internet, nos anos 1990, o que hoje é conhecido como "internet das coisas".
O autor mostra, a partir de experimentos nos quais participantes eram incentivados a resolver desafios dizendo em voz alta o que passava em seu pensamento, que a invenção é resultado de uma série de erros e ajustes de rumo, em vez de fruto da inspiração.
No desafio de encaixar uma vela de pé em uma porta usando uma caixa com tachinhas e fósforos, os bem-sucedidos na missão não achavam a solução sem passar pelos caminhos percorridos por quem não conseguiu resolver o desafio –era preciso esvaziar a caixa de tachinhas, prendê-la na porta usando-as e, depois, colocar a vela em cima da caixa.
Da mesma forma, criar, para Ashton, é sinônimo de esforço, tentativas, erros, reavaliações, aperfeiçoamentos e novas tentativas.
Por isso, Ashton critica as reuniões de "Brainstorming", nas quais participantes de um grupo são incentivados a dividir quaisquer ideias que venham à mente, sem fazer juízo de valor.
O livro de Ashton é útil ao mostrar o valor do esforço na criação e problematizar a crença na inovação fácil. Mas sua empolgação com a criatividade universal em muitos momentos soa ingênua por levar pouco em consideração a qualidade das invenções de cada pessoa.
Para voltar ao exemplo musical, claro que todos podem compor uma melodia.
Mas muitos compositores contemporâneos de Mozart certamente trabalharam tanto quanto ele ou mais, mas nem de longe atribuímos as suas obras a mesma importância.
Somos injustos ao avaliar a contribuição desses compositores menos famosos ou lhes faltava técnica ou criatividade? Ashton não se aprofunda em questões do tipo.
O apego incondicional do autor a alguns pontos de vista também incomoda.
Também causa estranheza o fato de ele se dizer convencido de a inspiração não vir em momentos inesperados quando histórias na própria obra aparentam ser exatamente isso.
A mais emblemática é a de Edmond, escravo que, aos 12 anos, usando um pedaço de bambu, descobriu como polinizar as orquídeas da baunilha no século 19, na pequena ilha de Reunião, no Oceano Índico, e permitiu que seu consumo se popularizasse mundo afora.
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Trabalho CRIATIVO
Livro critica crença na inspiração e destaca esforço de inovadores nas artes, nos negócios e na ciência
John Macdougall - 20.dez.2005/AFP |
Retrato do compositor austríaco Wolfgang Amadeus Mozart de 1790 |
Wolfgang Amadeus Mozart
Histórias sobre o compositor garantem que ele fazia música sem esforço, mas suas cartas indicam muito trabalho em cada composição
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Steve Jobs
Responsável pela criação dos iPhones, chegou ao modelo dos celulares da Apple solucionando problemas que via nos smartphones disponíveis no mercado
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Wassily Kandinsky
O pintor planejava cada pincelada por meses, fazendo dezenas de esboços e testando diferentes combinações de cores e materiais
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Isaac Newton
O físico celebrizou a frase "Se vi mais longe é porque estou sobre os ombros de gigantes", dando crédito a outros estudiosos em vez de à famosa maçã que teria caído em sua cabeça
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Christophe Ena/Associated Press/Mike Coppola/AFP |
O cineasta Woody Allen durante a pré-estreia do filme "Blue Jasmine", em Paris (França) |
Woody Allen
O cineasta diz que usa todo o tempo que tem, inclusive a hora do banho, para pensar em suas criações e buscar boas soluções para seus filmes
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Kevin Ashton
Autor de "A História Secreta da Criatividade", criou a internet das coisas em 1997 para melhorar a gestão de estoque de batons da P&G
Autor de "A História Secreta da Criatividade", criou a internet das coisas em 1997 para melhorar a gestão de estoque de batons da P&G
A História Secreta da Criatividade
QUANTO: R$ 39,90 (288 PÁGS.)
AUTOR: KEVIN ASHTON
EDITORA: SEXTANTE
QUANTO: R$ 39,90 (288 PÁGS.)
AUTOR: KEVIN ASHTON
EDITORA: SEXTANTE