Abuso de poder, condenações, rejeição de contas e outras situações descritas na Lei da Ficha Limpa representaram somente 12,3% dos motivos apontados pela Justiça Eleitoral para rejeitar candidatos a prefeito e a vereador nestas eleições.
A grande maioria dos candidatos é barrada, na verdade, por razões simples e burocráticas, como falta de documentos e não ter prestado contas de campanhas anteriores. A ausência de requisitos para o registro de candidatura aparece em 71,6% dos casos.
O indeferimento de partido ou coligação, por sua vez, equivale a 10,5% das justificativas para recusar um candidato, segundo levantamento feito pela Folha com base em dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Em 2,3% dos casos, o candidato foi barrado por não ter ou não comprovar domicílio eleitoral ou filiação partidária pelo período mínimo exigido.
É a primeira vez que o TSE disponibiliza as razões de indeferimento dos candidatos. Os dados são atualizados diariamente conforme as candidaturas tramitam na Justiça.
As informações são preenchidas diretamente pelos cartórios eleitorais e, portanto, podem carregar imprecisões.
Segundo o TSE, 14.121 candidatos tiveram seu pedido de candidatura indeferido até o momento –2,84% do total. Outros 5.369 recorreram da rejeição e aguardam julgamento em instâncias superiores da Justiça Eleitoral.
Esses candidatos, porém, podem concorrer normalmente enquanto aguardam a decisão final. Após a realização do primeiro turno, o TSE apontou que 145 candidatos mais votados para prefeito estavam nessa situação.
Como essas cidades não têm segundo turno, caso tenham o indeferimento confirmado, tais candidatos não poderão assumir as prefeituras e haverá novas eleições.
É o que deve ocorrer em Salto do Jacuí (RS). Na última quinta-feira (27), o plenário do TSE negou o recurso do candidato mais votado.
Para o advogado eleitoral Rodrigo Pedreira, embora as situações de "ficha suja" não sejam maioria, elas são relevantes. "O número absoluto [mais de 2.800 casos] é muito significativo", diz.
As ocorrências relacionadas à Ficha Limpa são prioridade no Ministério Público Federal, de acordo com o procurador regional eleitoral em São Paulo, Luiz Carlos dos Santos Gonçalves.
"A lei está cumprindo um papel extraordinário. Ela desestimula que fichas sujas se candidatem e, mesmo quando se candidatam, apesar dessa nova cultura que se forma, eles são de fato barrados", afirma Gonçalves.
Pedreira, no entanto, diz que a Ficha Limpa tutela demais o eleitor em alguns casos. "A lei impede que uma pessoa seja sufragada pelos eleitores. É preciso verificar se os motivos para ficar de fora são realmente graves."
Falta de documentos, como certidão criminal, idade não compatível e perda de prazos configuram falta de requisitos para o registro da candidatura.
"A lei exige uma série de requisitos e nem sempre as pessoas se preparam", diz Gonçalves. "A candidatura exige planejamento e as pessoas deixam para a última hora."