segunda-feira, 31 de janeiro de 2022

Santos Dumont vai ser leiloado sozinho e deve evitar 'contaminar' privatização de outros aeroportos

 

Expectativa é que leilão do Santos Dumont gere R$ 1,3 bilhão em investimentos. Foto: Fabio Motta/Estadão


O governo federal, em conjunto com autoridades do Rio, decidiu leiloar o aeroporto Santos Dumont (RJ) isoladamente, mudando o desenho da sétima rodada de concessões aeroportuárias, que irá transferir à iniciativa privada 16 terminais. A alteração pode dar um susto inicial nos investidores interessados, mas deve ter saldo positivo por “isolar” o certame do seu ponto alto de tensão, avaliam técnicos ouvidos pela reportagem. 

Agora, a sétima e última rodada será composta por quatro blocos de aeroportos, e não três, como inicialmente previsto. Na avaliação de especialistas que acompanham o caso, a solução de isolar o Santos Dumont é a menos drástica para o imbróglio envolvendo a resistência do Rio à privatização do terminal. Resta saber, apontam, se o edital de concessão do aeroporto trará restrições de movimentação, como sugerem políticos fluminenses.

Dentro do governo, o entendimento é de que nada extremo será sugerido para a modelagem do aeroporto carioca, apenas medidas “mitigadoras” para rebater a resistência da classe política sobre a privatização do ativo. A modelagem final, no entanto, só será conhecida em meados de fevereiro, quando o grupo de trabalho criado para discutir ajustes no edital de concessão encerrará as atividades. A força-tarefa foi montada após o Rio alegar que o impulso dado ao Santos Dumont fragilizaria ainda mais a concessão do Aeroporto Internacional Tom Jobim (RJ), o Galeão.

Em agenda no Rio, o ministro da InfraestruturaTarcísio de Freitas, anunciou nesta segunda-feira, 31, o leilão solo do Santos Dumont. Inicialmente, o aeroporto seria transferido à iniciativa privada num bloco com outros três aeroportos mineiros (Montes Claros/MGUberlândia/MG e Uberaba/MG) e o terminal de Jacarepaguá (RJ), destinado à aviação geral.

Com as mudanças, a 7ª rodada de concessões terá nova configuração. O Santos Dumont vai a leilão separadamente com uma outorga inicial de R$ 731 milhões, e R$ 1,3 bilhão de expectativa de investimentos.

Já os aeroportos mineiros estarão no bloco do Aeroporto de Congonhas, com 11 ativos no total, outorga inicial de R$ 255 milhões e investimentos em R$ 5,8 bilhões. A transferência dos ativos mineiros para o grupo de Congonhas teve como efeito prático reduzir a outorga do bloco.

Aeroporto de Campo de Marte (SP), que integrava o grupo de Congonhas, formará agora um novo bloco, junto do Aeroporto de Jacarepaguá (RJ), que inicialmente seria leiloado junto do Santos Dumont. A nova frente chamou a atenção do mercado, já que os dois aeroportos são destinados à aviação geral. Para técnicos, a configuração tem potencial de atrair um novo perfil de investidor ao leilão. O lote prevê R$ 560 milhões em investimentos e outorga inicial de R$ 138 milhões. “É um belo de um negócio, com potencial de exploração da parte imobiliária, por exemplo”, disse o secretário Nacional de Aviação Civil do Ministério da Infraestrutura, Ronei Glanzmann.

Por fim, o Bloco Norte II mantém a configuração inicial, com os terminais aéreos de Belém (PA) e Macapá (AP), R$ 875 milhões em investimentos previstos e outorga inicial de R$ 57 milhões.

O próximo passo para a concretização dessas mudanças é o envio de um ofício do Ministério da Infraestrutura para a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), que precisará encaminhar as alterações para o Tribunal de Contas da União (TCU), onde o processo da sétima rodada de concessões aeroportuárias já tramita.

Estratégia jurídica

Para reforçar o isolamento do Santos Dumont, o governo também deve optar pela estratégia jurídica de separar os editais dos blocos que irão a leilão na sétima rodada, segundo apurou o Estadão/Broadcast. Apesar de poderem ser arrematados por diferentes grupos, inicialmente os lotes teriam um único edital. Agora, cada um dos quatro blocos terá um edital individualizado. Se o risco envolvendo o Santos Dumont chegar na Justiça, por exemplo, a situação não afetará os demais aeroportos, uma vez que não se tratará mais do mesmo edital.

A expectativa é de que os quatro lotes sejam leiloados no mesmo dia, o que deve acontecer no primeiro semestre do ano. Técnicos que acompanham as discussões avaliam que ainda é possível manter o cronograma, uma vez que as alterações promovidas não mexem com a estruturação de venda de cada aeroporto, mas apenas no desenho dos blocos - algo mais superficial. 

Para esses especialistas, apesar de potencialmente provocar um choque nos investidores que estudam os terminais, a nova configuração deve, no curto prazo, provocar também um alívio. Uma fonte ouvida em caráter reservado aponta, por exemplo, que os investidores que interessados em arrematar o Santos Dumont tinham certeza das despesas que envolveriam o antigo bloco - com os aeroportos mineiros - mas ainda estavam inseguros com o lado das receitas, já que o edital de concessão do aeroporto carioca ainda é discutido entre o governo federal e o Rio.

Ao separar o terminal, o risco também é isolado, com a vantagem de o edital de privatização do Santos Dumont não levar mais consigo terminais deficitários. Outra avaliação feita nos bastidores é que a separação pode tornar o leilão do aeroporto mais atrativo para a concessionária que administra o Galeão entrar na disputa pelo ativo. A avaliação, por sua vez, não é unânime. A equação final, no entanto, só deve ficar mais clara quando o grupo de trabalho que debate ajustes no edital do Santos Dumont concluir suas atividades em fevereiro.

Amanda Pupo, O Estado de S.Paulo