segunda-feira, 31 de dezembro de 2018

Na onda de Bolsonaro, Twitter vira canal de anúncios e poemas

Não foi nenhum grande estudioso de redes sociais quem falou, mas um usuário assíduo do Twitter: "O poder popular não precisa mais de intermediação. As novas tecnologias permitiram uma relação direta entre o eleitor e seus representantes".
O usuário é Jair Bolsonaro (PSL). E as afirmações, feitas no discurso de sua diplomação como presidente, em dezembro, dão uma mostra do peso que a plataforma adquiriu no país, pelas mãos do próprio eleito e de outros políticos, magistrados e autoridades.
Na "república do Twitter", a caixa com limite de 280 caracteres virou canal de anúncios oficiais, tretas e até poemas.
Bolsonaro replicou aqui o comportamento do presidente americano, Donald Trump. Na campanha, o brasileiro já usava seu perfil para comunicados. Eleito, passou a publicar lá nomes de futuros ministros e planos do governo.
A rede social do passarinho azul já era habitada por políticos jovens, mas a adesão da "velha guarda" ganhou um impulso nos últimos meses.
O vice-presidente eleito, general Hamilton Mourão (PRTB), por exemplo, criou uma conta em novembro, na trilha de Bolsonaro (único perfil, aliás, que o vice segue).
Mourão posta pílulas de sua agenda, já alfinetou a "mídia tradicional" (por insistir "em criar antagonismos na equipe vencedora do pleito") e publicou um vídeo de feliz Natal.
Em geral ignora ataques, mas às vezes interage com outros usuários. A um seguidor que lhe disse que "vice só atrapalha, talquei?", o militar da reserva respondeu com ironia, replicando a expressão associada a Bolsonaro: "Talquei! Mas esse é um paradigma que queremos quebrar".
Uma das críticas que se faz à escolha da plataforma como meio oficial de comunicação é a possibilidade de as autoridades se blindarem de questões incômodas e reagirem só quando for conveniente.
Por outro lado, há a tal "relação direta" exaltada por Bolsonaro. "Quanto mais o dono do perfil for claro e usar uma linguagem informal, mais o público adora", diz Emmanuel Publio Dias, professor da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing) e especialista em marketing político.
"Antes, o Twitter ficava sob o comando de assessores. Eram informações frias. Trump confere relevância à plataforma quando chega e começa a tuitar como um adolescente: dá notícias, demite secretários, xinga inimigos", continua Dias.
No Brasil, personalidades do poder também aprontam as suas na rede social. Tuiteiro desde agosto, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) causou burburinho e cometeu gafes durante a campanha eleitoral.
Uma mensagem dele sobre o candidato a presidente ideal, sem citar nomes, foi considerada ambígua --uns acharam que era apoio ao nome de seu partido, o ex-governador Geraldo Alckmin, e outros viram um aceno a Bolsonaro.
FHC precisou fazer um post para deixar claro que se referiu a Alckmin. E escorregou de novo: escreveu o sobrenome do tucano sem o "c" (repetiria o erro mais três vezes e depois teria que se corrigir).
Já perto do segundo turno, voltou-se contra Bolsonaro, ao classificar como inacreditável um candidato à Presidência "pedir às pessoas que se ajustem ao que ele pensa ou pagarão o preço: cadeia ou exílio".
Para o especialista em marketing político Sergio Kobayashi, a chegada ao Twitter de pessoas como FHC, "que já não têm mais a abrangência e o espaço que possuíam quando eram ativos na vida pública", é uma tentativa de "ainda se fazerem presentes".
"É um meio em que os processos são instantâneos e o protagonismo é imediato, além de reverberar fora. Ganha quem souber trabalhar a ferramenta. Nesse aspecto, Bolsonaro é quem faz isso com mais eficiência", diz Kobayashi, que já trabalhou na comunicação do governo paulista e da prefeitura da capital.
O cenário político também não escapa aos comentários do ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, outro tuiteiro ativo. "Uauuuuu. Democracia 200%", postou ele como comentário à notícia da proibição de entrada da imprensa no plenário do Congresso em um evento com Bolsonaro, em novembro.
Janot também usou a rede para declarar voto em Fernando Haddad (PT). "Não posso deixar passar barato discurso de intolerância", justificou, cutucando Bolsonaro.
O ex-procurador-geral costuma ainda curtir os posts de Carlos Ayres Britto, ex-presidente do Supremo Tribunal Federal. O magistrado faz publicações diárias e nada convencionais: divulga versos.
À sua maneira, celebrou, por exemplo, o aniversário da Constituição: "Há 30 anos que a meta é uma fonte de nome Constituição. Banhar-se nela e beber das suas águas é tornar-se um obstetra da luz".
Por meio de "frases com pegada poética", como define, Ayres Britto reflete sobre a vida ("Não existe comida que não fique melhor com uma fatia de queijo por cima. E não existe pessoa que não fique pior com uma fatia de mágoa por dentro") e a política.
Um dia depois do primeiro turno, por exemplo, ele presenteou seus seguidores com esta: "A urna fala: só eu posso dizer quem vai governar o país. A Constituição completa: mas só eu governo quem governa. Só eu governo permanentemente quem governa transitoriamente".

Joelmir Tavares, Folha de São Paulo

Macron diz entender "raiva" no país, mas avisa que levará reformas até o fim

O presidente francês Emmanuel Macron faz discurso de Ano Novo no palácio do Eliseu, em Paris

O presidente francês Emmanuel Macron faz discurso de Ano Novo no palácio do Eliseu, em Paris - Michel Euler/Associated Press

O presidente da França disse nesta segunda-feira (31) em seu discurso de fim de ano que entende a "raiva" dos "coletes amarelos", interpretando-a como um "grito de não-conformismo". No entanto, Emmanuel Macron afirmou que não vai desistir de implementar as reformas que anunciou durante sua campanha presidencial.
Macron disse que "os resultados" dessas reformas serão obtidos no fim de seu mandato de cinco anos, e que a "falta de paciência" —que ele diz compartilhar com os cidadãos— não justifica os pedidos de demissão que tem ouvido de alguns manifestantes.
Sem mencionar especificamente os "coletes amarelos", o presidente francês disse que "as lágrimas e a raiva vêm de longe: uma raiva contra a injustiça, contra a globalização, muitas vezes incompreensível, contra um sistema muito complexo e insensível, raiva também contra as profundas mudanças que colocam em dúvida nossa sociedade e identidade".
"Essa raiva me mostrou algo: que nós não somos um povo conformista e que nosso país quer construir um futuro melhor, baseado em nossa capacidade de inovar, e de criar novas formas para trabalharmos juntos. Essa é a lição que levo de 2018", afirmou Macron.
Europa
Após um discurso que chamou de "verdadeiro" e "digno", o presidente francês apresentou um "discurso de esperança para nós mesmos, como povo, e esperança em nossa Europa". "O que nós queremos profundamente, é reencontrar o controle de nosso cotidiano e de nosso destino, para não sofrer mais", explicou.
"Recuperar o controle de nossa vida é escolher a comida que colocamos em nossos pratos, é garantir a justiça tributária, é nos proteger de nossos inimigos, é investir para inovar, é dar uma resposta comum às migrações; Acredito muito profundamente nesta Europa que pode proteger melhor as pessoas e nos dar esperança", afirmou.
"Isto também deve orientar o renovado projeto europeu, que irei propor nas próximas semanas", finalizou, referindo-se às eleições europeias de maio de 2019.

RFI