Nada salva o período administrado pela dupla eleita para 2015-2018. Na quinta-feira, renovaram-se as nuvens que sempre pairaram sobre o governo Temer. As prisões decretadas pelo ministro Luís Roberto Barroso, atendendo a pedido da Procuradoria-Geral da República, atingem o círculo próximo do presidente da República. São prisões provisórias, e elas podem não ser renovadas, mas já serviram para enfraquecer o presidente nesta reta final. Ele ensaiava uma candidatura e agora fica a dúvida sobre se a manterá. Se for apresentada uma terceira denúncia, o presidente não terá, felizmente, capacidade de usar os recursos políticos e fiscais dos quais abusou para arquivar as duas primeiras. Um pato manco, investigado, com sigilo bancário quebrado e cercado de suspeitas terá que reunir votos para se proteger em uma Câmara esvaziada.
Nessa era da incerteza, a economia tentará, a duras penas, atravessar mais uma etapa da sua lenta e difícil recuperação da enorme recessão que a atingiu no fim de 2014. Os empresários que tentarem descortinar o futuro econômico do país, para fazer seus planos de investimento, verão apenas o espesso nevoeiro de uma campanha eleitoral de xingamentos e acusações. Tomara que haja espaço e tempo para alguma discussão séria sobre os muitos desafios que o Brasil tem que vencer para entrar na terceira década do século XXI.
Há uma disputa polarizada de versões sobre o que aconteceu nos últimos anos, mas o que arruinou este mandato é complexo e precisa ser entendido sem paixões. A verdade está no intervalo entre as posições extremadas, está nas nuances de um tempo em que cada um se isola na sua certeza. Não houve golpe contra Dilma, mas houve conspiração liderada pelo então vice-presidente. A economia foi jogada na recessão, houve desemprego e inflação de dois dígitos no período Dilma, e isso facilitou as articulações do seu companheiro de chapa para encurtar sua estadia no Planalto. Não se poderá contar a história do impeachment sem o desastre econômico que azedou a relação da então presidente com o país. Esse quadro sombrio da economia foi atenuado no governo Temer. Há fatos e números mostrando isso, mas não foi possível ainda vencer a crise fiscal. Não se pode dizer que havia um governo virtuoso que foi sucedido por um outro corrupto. Houve dois governos corruptos. Uma das provas disso é o número grande de políticos presos ou investigados que serviram aos dois. Pessoas como Geddel, Henrique Eduardo Alves, o doleiro Lúcio Funaro, Joesley Batista e até Eduardo Cunha, entre muitas outras, exerceram influência ou cargos nos dois períodos. Não há luz e sombras. Há sombras. E não será possível dissipá-las com mais maniqueísmo, visões simplistas e salvadores da pátria.
No próximo mandato, o Brasil vai atravessar um marco importante da história. Vai completar 200 anos de vida independente, em 2022. Qualquer país sensato estaria, neste momento, pensando no significado do que houve até aqui, nos obstáculos que foram superados com sucesso, no que tem bloqueado o caminho e impedido novos avanços. Uma análise sincera encontraria as raízes dos problemas que hoje nos machucam de forma aguda. Por ter se descuidado da educação, o país está completamente atrasado em qualquer comparação internacional. Por nunca ter enfrentado o terrível legado da escravidão, carrega ainda hoje fraturas sociais e desigualdades de tratamento entre brasileiros. O patrimonialismo é o pai de toda relação promíscua entre o público e o privado que degenerou na corrupção.
Contudo, o país derrotou o autoritarismo político, venceu a hiperinflação, reduziu a pobreza e dá combate à corrupção. Poderia aproveitar o recomeço, que toda eleição permite, para preparar o aniversário dos seus 200 anos com mais confiança no futuro.