sexta-feira, 27 de janeiro de 2023

'Conservadores da Flórida recapturam a universidade pública', por Christopher Rufo

 

A hegemonia de esquerda sobre as universidades públicas, em departamentos acadêmicos e governos, é a antítese da livre investigação e do debate civil| Foto: Bigstock


A história política mais significativa da última metade do século XX é a "longa marcha da esquerda rumo às instituições". No começo dos anos 60, ativistas e intelectuais de esquerda, inspirados por teóricos políticos como o comunista italiano Antonio Gramsci e o filósofo neo-esquerdista Herbert Marcuse, fizeram um esforço orquestrado para incluir suas deias na educação, no governo, na filantropia, na mídia e noutros setores importantes.

Esse processo deu frutos espetaculares em 2020 após a morte de George Floyd, quando parecia que toda instituição de prestígio nos Estados Unidos estava empenhada na promoção da mesma linha ideológica sobre raça, gênero e cultura — no que, soubessem elas ou não, imitavam precisamente os mesmos temas que os antigos radicais propuseram no começo.

A longa marcha rumo às instituições, noutras palavras, estava completa.

Mas os conservadores também atualizaram o seu manual. Leram Gramsci e começaram a entender que a captura ideológica lança uma grave ameaça ao sistema americano. O Presidente Donald Trump chacoalhou os conservadores para fora de sua complacência, por meio de suas reações culturais instintivas, se bem que cruas. O governador da Flórida, Ron DeSantis, aprimorou essa abordagem e agora oferece uma agenda política sofisticada para proteger as famílias das burocracias capturadas.

Na última semana, DeSantis aumentou a aposta e propôs, pela primeira vez, uma estratégia para reverter a longa marcha sobre as instituições, começando com aquela que Marcuse acreditava ser a instituição revolucionária inicial: a universidade. O governador publicou uma seleção de novos indicados para o quadro do New College of Florida, um campus notoriamente esquerdista, similar ao Evergreen State em Olympia, Washington. DeSantis incumbiu o novo quadro de transformá-lo, nas palavras do indicado do governador, na "Hillsdale do Sul”— noutras palavras, uma faculdade de artes liberais clássicas que oferece uma feição distintamente tradicional de ensino e pesquisa.

A câmara estadual da Flórida há muito está desanimada com o New College, sua menor universidade pública estadual, por fracassar repetidamente nas metas de recrutamento, na conquista da estabilidade financeira, ou na melhoria de suas taxas desastrosas de evasão e conclusão de curso. A faculdade aceita quase todo o mundo, com uma taxa de admissão de 74%, mas poucos escolhem frequentar um curso seu: a taxa de matrículas é de meros 13%.

Nos últimos anos, os deputados pensaram em fechar a faculdade completamente e redistribuir os recursos pelo sistema de universidades públicas. Mas, num lance drástico, DeSantis propôs uma última tentativa: trazer um novo quadro de reformadores e reverter o estado da faculdade.

Eu tive a honra de ser indicado para esse quadro, junto com amigos e colegas do movimento conservador, dentre os quais Charles Kesler, pesquisador do Claremont Institute, Matthew Spalding, vice-presidente da Hillsdale College, e Mark Bauerlein, ex-professor da Emory University. O Governador DeSantis nos incumbiu de algo que nunca foi feito: recaptura institucional. Se tivermos sucesso, o esforço poderá servir de modelo para outros estados.

A premissa dessa reforma é simples. Os eleitores da Flórida, que outorgam e financiam o sistema público de universidades por meio de seus representantes legislativos, merecem ter seus valores refletidos e transmitidos em suas instituições públicas. A hegemonia de esquerda sobre as universidades públicas, em departamentos acadêmicos e governos, é a antítese da livre investigação e do debate civil. Com o New College of Florida transformado numa instituição clássica, os eleitores terão acesso a um leque maior de vozes, acadêmicos e oportunidades para seus filhos. Num momento em que as universidades estão se transformando num lamaçal homogêneo de "diversidade, equidade e inclusão", é essencial que os representantes eleitos do povo criem alternativas reais.

Essa tarefa não será fácil. O consórcio da imprensa já se empenhou em retratar essa tentativa como "bárbaros nos portões da universidade". Mas a verdade aponta para a outra direção. Como observou em 1968 o respeitado historiador Daniel Boorstin, os ativistas da Nova Esquerda — isto é, os progenitores das ideologias "lacradoras" que sequestraram as instituições dos EUA — foram "os novos bárbaros" que rejeitaram os ideais da Fundação da América e buscaram destruir a sociedade. "Não devemos nos deixar enganar por nossas consciências liberais hipersensíveis, nem pelos rótulos familiares e respeitados com os quais os Novos Bárbaros gostam de circular", escreveu Boorstin. "Se a civilização dos EUA for sobreviver, se formos resistir e derrotar o Novo Barbarismo, temos que enxergá-lo de verdade."

Mas os conservadores e os liberais à moda antiga não deram ouvidos ao alerta de Boorstin. Década após década, cederam território institucional à esquerda radical até que, meio século depois, as narrativas básicas do Weather Underground e do Black Panther Party, traduzidas para a linguagem da teoria crítica da raça e da "diversidade, equidade e inclusão", prevaleceram por quase toda parte.

Esperamos reverter esse processo, começando pelo campus Sarasota do New College. O quadro de indicados irá se reunir nos próximos meses, mas, nesse ínterim, propus várias mudanças de políticas que podem ajudar o começo da reinvenção da universidade. Minhas propostas incluem o redesenho do currículo para se alinhar ao modelo clássico; abolir os programas de "diversidade, equidade e inclusão" e substituí-los pelos princípios de "igualdade, mérito e colorblindness"; a adoção da declaração de Kalven sobre a neutralidade institucional; a reestruturação da administração acadêmica e os departamentos; recrutar novos docentes com experiência na tradição das artes liberais clássicas; e estabelecer uma faculdade de graduação para formar os professores escolares na educação clássica. [Colorblindess é o termo usado em inglês para se opor às políticas segregacionistas. Como o mundo ibérico não tem um histórico de políticas de segregação racial, não há uma palavra em português para designar a oposição a elas. Literalmente, colorblindess significa "cegueira para cores". (N. t.)]

Nosso projeto é de recaptura e reinvenção. Os conservadores têm a oportunidade de finalmente demonstrar uma reação eficaz contra a longa marcha sobre as instituições. Os esquerdistas que estão na burocracia permanente vão cair matando nessa jogada; mas, se for exitosa, é possível uma nova era para o ensino superior. E para o país também.


Tradução de Bruna Frascolla, City Journal

Gazeta do Póvoa