Cúmplice dos surtos ditatoriais do TSE, refém ideológica do PT e carente de verbas públicas federais, a velha mídia quer estrangular a liberdade de expressão no Brasil
A escalada autoritária do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) atingiu patamares inéditos na história brasileira. Para reconduzir o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao Palácio do Planalto, a Corte está determinada a asfixiar as verdades inconvenientes do petismo. A velha imprensa, com seus irremediáveis impulsos liberticidas, tornou-se cúmplice da trama.
Uma das decisões que visam a estrangular a realidade foi proferida na quarta-feira 18. O corregedor-geral da Justiça Eleitoral, ministro Benedito Gonçalves, suspendeu a monetização de jornais e empresas como a Brasil Paralelo, a Foco do Brasil, a Folha Política e o Dr. News. A medida permanecerá em vigor até 31 de outubro, depois das eleições. Mas não é apenas isso. Benedito Gonçalves também decidiu censurar previamente o documentário Quem Mandou Matar Jair Bolsonaro?, da Brasil Paralelo. A multa diária pelo descumprimento da determinação é de R$ 500 mil. Para ter uma ideia da gravidade dessa decisão, a prática da censura prévia não foi utilizada nem durante o regime militar.
Segundo o jornalista Kennedy Alencar, do portal UOL, sufocar financeiramente a produtora não é o bastante. “A Brasil Paralelo é difusora de fake news conhecida na praça”, disse o colunista, ao celebrar a censura. “Temos de aplicar o princípio follow the money. Tem de ver quais são os empresários que financiam a produção de conteúdo falso. É uma organização de extrema direita, que dissemina mentira no debate público brasileiro e precisa ser combatida.”
Acusar os dissidentes de propagar fake news e propor abertamente o cerceamento da liberdade de expressão tornou-se prática comum na imprensa militante. No primeiro debate do segundo turno das eleições, por exemplo, promovido pela TV Bandeirantes, a jornalista Patrícia Campos de Mello, da Folha de S.Paulo, perguntou se os candidatos à Presidência estavam dispostos a criar uma lei para “punir” aqueles que divulgassem informações “factualmente inverídicas”. A introdução da pergunta chama a atenção: “As fake news divulgadas por autoridades eleitas e altos funcionários do governo têm prejudicado a implementação de políticas públicas, e o debate eleitoral se transformou em uma guerra suja. Há uma avalanche de mentiras sobre as urnas, sobre o sistema eleitoral, sobre as vacinas e sobre a saúde pública”. Antes de interpelar o presidente da República, a jornalista o condenou.
Colega de Patrícia na Folha, Mônica Bergamo desponta como a favorita a ser punida em eventual lei contra a divulgação de fake news. Em 12 de agosto deste ano, a jornalista impulsionou uma reportagem mentirosa intitulada “Jair e Michele [sic] Bolsonaro almoçaram com Guilherme de Pádua, o assassino de Daniela Pérez”. Ela não apenas manteve a notícia falsa no ar, como também produziu mais textos sobre o assunto. Em nova publicação na Folha, Mônica informou: “Mulher de Guilherme de Pádua, assassino de Glória Perez [sic] e hoje pastor, diz que Michelle não sabia quem ela era ao tirarem uma foto”. O TSE ainda não se manifestou sobre o caso.
Por influência de reportagens do Grupo Folha, a Jovem Pan tornou-se alvo da sanha totalitária da Corte Eleitoral. A marcha da insensatez começou com a divulgação pelo jornal de um estudo produzido por ativistas homiziados na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Depois de algumas incursões pelo universo cibernético, os jalecos a serviço do PT concluíram que era para privilegiar uma emissora reduzida a bolsão bolsonarista que o YouTube vinha recomendando aos internautas, com suspeitíssima frequência, uma visita aos vídeos da Jovem Pan. Nenhum dos acadêmicos desconfiou que o algoritmo do YouTube se limita a remeter os usuários aos conteúdos com maior número de visualizações. Como a íntegra do programa e trechos extraídos de Os Pingos nos Is são campeões nacionais de audiência, é natural que liderem o ranking dos mais indicados.
O batalhão de trapalhões foi engrossado por advogados de Lula, que acionaram o TSE “para impedir que o YouTube siga privilegiando os vídeos da Jovem Pan”. Confiante no pronto socorro dos juízes de estimação, o ex-presidiário também exigiu que a Google Brasil, proprietária do YouTube, adote as medidas necessárias para “cessar a irregularidade”. Incontrolavelmente ansiosa, uma repórter da piauí jurou que o YouTube havia limitado a publicidade do canal de Os Pingos nos Is. “Isso se deve à inadequação do conteúdo para os anunciantes da plataforma”, explicou. “Manda quem pode, obedece quem tem juízo”, celebrou a colunista social da Folha. O bloqueio jamais ocorreu.
De lá para cá, a pressão sobre a emissora aumentou. Nesta semana, por exemplo, a Jovem Pan comunicou que está sob censura. A empresa foi proibida pelo TSE de informar os brasileiros sobre os fatos que envolvem as condenações de Lula. Em editorial, a Jovem Pan argumenta que a decisão da Corte foi proferida “ao arrepio do princípio democrático de liberdade de imprensa”, que proíbe qualquer forma de censura e obstáculo para a atividade jornalística. “Não importa o contexto, a determinação do Tribunal é para que esses assuntos não sejam tratados na programação jornalística da emissora”, diz o texto. A emissora alerta para os riscos da escalada autoritária do TSE, visto que a decisão de cercear a liberdade de imprensa pode afetar todos os veículos de comunicação do país. “Enquanto as ameaças às liberdades de expressão e de imprensa estão se concretizando como forma de tolher as nossas liberdades como cidadão neste país, reforçamos e enfatizamos nosso compromisso inalienável com o Brasil”, comunicou o grupo empresarial. “Acreditamos no Judiciário, nos demais Poderes da República e nos termos da Constituição Federal de 1988. Defendemos os princípios democráticos da liberdade de expressão e de imprensa e fazemos o mais veemente repúdio à censura.”
A repressão não parou por aí. Em um de seus recentes surtos ditatoriais, o TSE censurou a Gazeta do Povo. Isso porque o jornal paranaense publicou, no Twitter, notícias sobre a expulsão da CNN da Nicarágua. Lula não gostou: tem amizade de longa data com o ditador do país, Daniel Ortega. O petista ficou com medo de que a tirania do sandinista pudesse lhe tirar votos no segundo turno das eleições brasileiras. Em nova representação, o PT solicitou ao TSE a censura prévia de reportagens da Gazeta do Povo que associam Lula a Ortega. O pedido foi negado.
Na semana passada, a campanha do ex-presidiário pediu o bloqueio de 34 perfis no Twitter, incluindo o da Revista Oeste. “A bomba foi anunciada por um veículo de comunicação, que fez questão de aplaudir a tentativa de amordaçar parte da imprensa, jornalistas e formadores de opinião”, explica Paula Leal, em reportagem publicada na Edição 134. “Sem ter acesso ao conteúdo da representação, Oeste buscou amparo jurídico para exercer seu direito de defesa. A prática de não dar acesso integral ao processo, aliás, tem se tornado recorrente no Judiciário. O maior exemplo é o inquérito das fake news, em que as partes não sabem nem por qual crime estão sendo acusadas.”
Se de um lado a onda de repressão conta com a cumplicidade da maioria da imprensa brasileira, por outro, há baixa adesão no levante contra a tirania do TSE. A Folha, por exemplo, tratou do assunto em apenas um editorial. No texto, o jornal paulista alerta para os perigos da escalada autoritária do Tribunal. “Ao expandir seu raio de atuação, a Corte pode descair para a censura pura e simples”, diz um trecho. O Globo foi mais incisivo: “TSE foi longe demais no combate à desinformação”. Segundo o portal carioca, “não é papel da Corte julgar a qualidade dos veículos de imprensa, muito menos censurá-los preventivamente apenas por causa de um título malfeito, nem mesmo pela eventual publicação de informações erradas, que podem perfeitamente ser corrigidas”. A Gazeta do Povo, alvo constante do TSE, encerrou o assunto. “A adoção da censura prévia nesta reta final de campanha é a comprovação de que o TSE considera não haver freio nenhum à sua atuação”, diz o jornal paranaense.
Para a jornalista Cristina Graeml, o TSE ultrapassou a última barreira da liberdade ao censurar previamente veículos de comunicação e empresas independentes. “Sou absolutamente a favor da liberdade de imprensa e de expressão”, afirmou. “Rejeito qualquer tipo de cerceamento das liberdades.” Ela também critica a imprensa tradicional, que vem endossando a censura promovida pelo TSE. “Veículos como a Globo, a CNN e a Folha noticiam seletivamente aquilo que lhes interessa”, observou. “Eles dão voz a pessoas que divulgam fake news. A história do Bolsonaro ‘pedófilo’ é um exemplo. Quantos comentaristas não disseminaram essa história? É triste ver a imprensa se prestando a esse serviço ideológico.”
O ex-assessor político Herbert Passos Neto segue na mesma linha. Ele argumenta que a formação dos estudantes de jornalismo é voltada para a militância política. “Os professores colocam nos alunos uma carga emocional e tentam transformá-los em justiceiros sociais”, considerou. “Isso resulta nos jornalistas que estão endossando a censura. Eles pensam que estão fazendo algo justo. Esses ‘profissionais’ se sentem ‘agredidos’ com a forma de se comunicar de empresas como a Revista Oeste, a Jovem Pan, a Gazeta do Povo e a Brasil Paralelo. O jornalismo de direita conquistou um espaço muito grande.”
O escritor e analista político Flavio Morgenstern afirma que a proliferação de jornalistas engajados deformou o comportamento profissional: “Não se vigiam mais os políticos. Age-se com os políticos para vigiar a sociedade”. Para Morgenstern, o objetivo de jornais como a Folha “vai além da tentativa de monopólio das narrativas: quer-se criar uma versão ‘oficial’ dos fatos — e isto só pode ocorrer censurando-se desabridamente quem não siga a cartilha”. “O jornalista de hoje quer demonizar seus concorrentes ideológicos, para que sejam perseguidos pelo estamento judicial”, acrescenta o analista político. “As críticas da Folha querem ter peso de lei, e seus jornalistas agem como esbirros a apontarem quem deve ser constrangido pela lei.”
Segundo o advogado e jornalista Taiguara Fernandes, o discurso de esquerda é hegemônico na imprensa tradicional. “Se você destoa um pouco disso, não tem direito de existir”, ressaltou. “Então, quando um órgão de imprensa está ‘fora do clubinho’, e começa a sustentar termos de debate que estão fora daquele universo de esquerda, o diálogo com ele não é admissível, porque ele nem deveria existir.” Ele considera que os altos índices de audiência dos veículos de “direita” incomodam a velha mídia. “Desta forma, até a censura se torna justificável contra o discurso distinto”, disse. “Isso parece demonstrar não só uma tentativa de limitar o debate público a um único lado, mas também de destruir concorrência e manter o monopólio da informação através do braço censurador do Estado.”
Nenhuma surpresa. Um levantamento recente da Universidade Federal de Santa Catarina constatou que 80% dos jornalistas brasileiros se declaram de centro-esquerda, esquerda ou extrema esquerda. Só 4% se consideram de centro-direita, direita e extrema direita.
Acostumada a ser irrigada com pomposas verbas publicitárias federais, a velha imprensa precisou se readequar durante o governo Bolsonaro. Lula, em seus oito anos na Presidência, gastou R$ 7,7 bilhões, em dinheiro dos pagadores de impostos, para a imprensa publicar propaganda oficial. Isso é 30 vezes mais que a despesa de Bolsonaro (R$ 258 milhões). Dilma Rousseff (PT), em quatro anos, gastou R$ 9 bilhões — 35 vezes mais.
“Se você ganha R$ 15 mil por mês, como salário ou fruto da sua atividade, as 30 vezes a mais de Lula seriam R$ 450 mil mensais no bolso”, pondera J.R. Guzzo. “As 35 vezes de Dilma dariam R$ 525 mil, entra mês, sai mês. Que tal? Nem todos ficariam indiferentes a esse tipo de dinheiro. Conclusão lógica: é preciso acreditar num desprendimento de São Francisco de Assis, por parte dos proprietários de veículos, para achar que eles não perceberam a diferença, ou que não se importam com ela.”
Mas os problemas da imprensa tradicional vão além da questão financeira. Se de um lado as emissoras, os jornais e as empresas independentes aumentam consistentemente seu público-alvo e diversificam sua receita neste ambiente dinâmico do mercado de informação, por outro, veículos com práticas obsoletas lutam pela sobrevivência. As publicações impressas, por exemplo, despencam anualmente. Pouco mais de 430 mil exemplares foram colocados em circulação nos primeiros seis meses de 2022. Há sete anos, eram 1,3 milhão. A queda mais perturbadora foi protagonizada pela Folha: 16%. A tiragem oscilava pouco acima de 60 mil exemplares. Desabou para desoladores 55 mil.
Tampouco as revistas impressas vão bem das pernas. Segundo o Instituto Verificador de Comunicação (IVC), a circulação sofreu uma queda de 28% ao longo de 2021. A Veja, por exemplo, já foi a terceira maior do mundo ao imprimir 1,2 milhão de exemplares. O tombo mais recente levou-a a perder 51 mil — e amargar, pela primeira vez desde o nascimento, uma tiragem que mal atinge a faixa dos 90 mil. Todas as revistas hoje lutam para sobreviver. Menos a piauí, que não depende de leitores. Depende da herança do dono, o banqueiro João Moreira Salles. A bolada parece muito longe do fim. Tanto assim que, mesmo bancando os rombos mensais da revista, tem dinheiro de sobra para figurar na lista dos dez maiores doadores da campanha de Lula.
“Além do dinheiro do governo que não está vindo mais, nada poderia mostrar tão bem a aliança de jornalistas e donos de veículos contra a liberdade de expressão, ou o seu reduzido apreço por ela, quanto esse ‘consórcio’ que formaram com tanto entusiasmo — um instrumento para darem todos a mesma notícia, ou o mesmo tom ao noticiário de todos os dias”, observa Guzzo, em artigo publicado na Edição 120 da Revista Oeste. “O ‘consórcio’ é uma negação grosseira da necessidade de haver concorrência entre os veículos, e conteúdos diferentes em cada um, para haver imprensa livre — não há liberdade verdadeira, na prática, se não for assim.” O colunista acrescenta que imprensa com um veículo só, como o Pravda russo ou o Granma cubano, é imprensa de ditadura. “O ‘consórcio de veículos’ é o maior esforço já feito até hoje pelos órgãos de comunicação brasileiros para se conseguir uma situação desta natureza”, afirmou. “Eles deixaram de ser um sistema independente de informação ao público. São hoje, pela ação das redações e pela falta de princípios, de talento e de energia por parte dos donos, mais um partido político.”
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Revista Oeste