segunda-feira, 1 de fevereiro de 2021

Tesouro dá pontapé inicial para Brasil emitir títulos com selo de boas práticas ambientais e sociais

O Tesouro Nacional deu o pontapé inicial para colocar o Brasil no mapa das emissões de títulos públicos com atestado de boas práticas nas áreas ambiental, social e de governança (conhecidas pela sigla ESG).

Os três temas têm sido cada vez mais foco de atenção no mercado internacional. Por isso, o governo brasileiro começou a mapear despesas do Orçamento que se enquadram nesses tópicos para atrair os investidores estrangeiros.

O ingresso nesse mercado é considerado estratégico porque o mundo vive um momento de grande oferta de recursos, ao mesmo tempo em que investidores têm cobrado cada vez mais um compromisso firme com a pauta ESG - já existem fundos que aplicam seus recursos exclusivamente nesse tipo de ação. Até agora, 22 países fizeram emissões de títulos públicos ligados ao "selo", número que tende a crescer rapidamente nos próximos meses. 

DesmatamentoFoto: Tiago Queiroz/Estadão

Outra vantagem é que esses papéis costumam ter custo menor para o emissor, já que o investidor se dispõe a receber menos juros em troca de financiar ações sociais, ambientais ou para melhorar a governança de um país.

A decisão do Tesouro de iniciar a construção de um arcabouço para emitir títulos ligados à temática ESG foi anunciada na última quinta-feira, 28.  O subsecretário da Dívida Pública do Tesouro Nacional, José Franco de Morais, afirma que ainda há um longo caminho a ser percorrido. Há chance de uma primeira emissão de bônus soberano relacionada à pauta ESG ocorrer ainda em 2021, mas não há garantia sobre isso. “A construção do arcabouço não é um processo de curto prazo”, alerta Franco.

Para Franco, o compromisso do governo brasileiro com a temática ESG vai servir a três frentes: mostrar o que o País tem de positivo, ser transparente em relação ao que há de negativo e ajudar a cumprir os objetivos de desenvolvimento sustentável estabelecidos pela Organização das Nações Unidas (ONU) por meio da Agenda 2030.

“O Brasil tem muitas coisas boas para mostrar. A matriz energética brasileira é majoritariamente energia limpa. É um exemplo. Agora, realmente, a reputação pode melhorar muito. Os investidores sentem falta de informações”, afirma o subsecretário. “Nosso papel é juntar todos esses argumentos para levar aos investidores, aumentando a transparência também. Quando a notícia não é boa, explicar por que ela não é boa e o que o País está fazendo para melhorar determinado indicador.”

Segundo Franco, a equipe da dívida pública já atua hoje como um “facilitador” de conversas entre investidores ou agências de classificação de risco e outras áreas do governo, mas a adesão à pauta ESG tende a ampliar esse papel. O coordenador-geral de Planejamento Estratégico da Dívida Pública, Luiz Fernando Alves, diz que os investidores passarão a olhar o Tesouro como um “ponto focal” para essas temáticas. “Muitas vezes não teremos as respostas, mas nosso papel é buscar aquela área dentro do governo e trazer a informação, ou eventualmente colocar o investidor em contato com essa parte especializada”, afirma.

O órgão dedicou um capítulo de seu Plano Anual de Financiamento (PAF), documento que mostra a estratégia do Tesouro para a dívida pública, à apresentação de suas intenções em aderir à agenda sustentável. No texto, os técnicos recorreram a dados do Banco Mundial para indicar como o Brasil está posicionado nessa temática.

No aspecto ambiental, segundo o Tesouro, o Brasil se sai melhor do que a maioria dos países, com alto consumo de energias renováveis, menor emissão de CO² e alto índice de proteção de recursos naturais. A recente aprovação do novo marco legal do saneamento, com metas de universalização, também é um ponto favorável. Na frente social, os indicadores também são positivos, segundo o governo, levando em conta gastos com educação, número de matrículas na escola primária, taxa de mortalidade infantil, entre outros. 

À medida que o arcabouço ESG brasileiro se consolide, esses dados ficarão ainda mais transparentes para investidores e para a sociedade como um todo. “Vai ser até uma boa maneira de a gente acompanhar, e a gente vai passar a divulgar também, como está o Brasil em relação a cada uma dessas metas. Agora, isso claramente é um projeto de longo prazo, seja a construção do arcabouço, seja contribuir de alguma maneira para que o País se aproxime cada vez mais das metas”, afirma Franco.

Idiana Tomazelli, O Estado de S.Paulo