LONDRES - Após 11 meses de negociações, Reino Unido e União Europeia formalizaram na quarta-feira, 30, o acordo do Brexit, que mudará a relação entre os dois lados do Canal da Mancha, após quase meio século de integração. O texto foi aprovado com folga no Parlamento britânico e assinado pelo premiê, Boris Johnson, pela presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e pelo chefe do Conselho Europeu, Charles Michel.
O acordo, que entra em vigor a partir da meia-noite desta quinta-feira, 31, (20 horas em Brasília), encerra uma saga de quatro anos, que começou com o plebiscito de 2016, mas não acaba com as incertezas econômicas – principalmente para os britânicos, que temem ficar atolados na burocracia que impede a livre circulação de bens, serviços e pessoas.
As 1,2 mil páginas do acordo garantem trocas comerciais sem direitos aduaneiros, cotas ou tarifas para todos os bens, o que evita o chamado “Brexit duro”, que provocaria gargalos no setor produtivo. No entanto, as empresas terão de preencher formulários e documentos para atravessar de um lado para o outro do Canal da Mancha, o que pode causar engarrafamentos e prejuízos para quem depende da entrega rápida de produtos.
Se manter a circulação de bens favoreceu o Reino Unido, o acordo no setor de serviços foi um desastre – e Johnson foi criticado até por membros de seu próprio partido. Como o capital terá portas fechadas na Europa, muitas firmas se mudaram para o continente. Empresas de serviços financeiros que operam no Reino Unido transferiram 7,5 mil funcionários e mais de US$ 1,6 trilhão de ativos para a UE.
O fim da livre circulação de pessoas também muda vários aspectos da vida cotidiana – muitas vezes para pior. Se quiserem passar férias no continente, os britânicos terão de carregar um passaporte emitido há menos de 10 anos que tenha 6 meses de validade, além de visto para quem estender a viagem por mais de 90 dias – o mesmo vale para os europeus no Reino Unido.
Os britânicos também perderão o direito de usar as filas exclusivas para europeus nos aeroportos, terão de fazer um seguro de saúde e, em alguns casos, só poderão conduzir veículos com uma permissão internacional – isso ocorre quando a habilitação britânica for emitida em papel.
Para o consumidor, o Brexit pode trazer outros custos. As principais operadoras de celular do Reino Unido – O2, EE, Vodafone e Three – prometeram não restabelecer as tarifas de roaming para os britânicos na Europa, mas estão livres para voltar a adotar a prática no futuro próximo.
O Brexit terá impacto também no futebol. Os jogadores que não nasceram no Reino Unido precisarão de autorização de trabalho especial, atribuída por um sistema de pontos – como todos os imigrantes – com base na experiência internacional, nível do clube de origem e resultados. Como os grandes clubes já contratam craques renomados, não devem enfrentar problemas. No entanto, times médios e pequenos, que compram jogadores em ascensão no exterior, devem se concentrar agora em jovens britânicos.
A saída da UE, no entanto, não tem apenas aspectos negativos. Desde o início, o Brexit foi vendido como sendo a retomada da soberania do Reino Unido, da capacidade de Londres estabelecer suas próprias leis e regras. A aprovação rápida das vacinas contra covid-19, antes de europeus e americanos, foi um exemplo dos benefícios da autonomia, segundo Johnson.
“O Brexit é um excelente negócio para o país”, disse o premiê, após a assinatura. “É o desejo soberano do povo britânico de viver sob suas próprias leis soberanas feitas pelo seu próprio Parlamento soberano.”
AP, NYT e REUTERS