Tenho insistido que nossas instituições, na medida em que foram invadidas gradualmente por sectários de ideais marxistas, perderam aqueles princípios que motivaram seu surgimento: o judiciário abandonou a justiça, a arte abandonou a beleza, a política abandonou o bem comum, bem como a universidade abandonou o conhecimento, a verdade. Todas essas instituições passaram, sob domínio de mentalidades bárbaras, a causar a ruptura de nosso tecido social moral a partir daquilo que o filósofo Mário Ferreira dos Santos chamou de “invasão vertical dos bárbaros”.
E a barbárie parece não ter fim. Além disso, ela não está restrita às ditas “humanidades”. Ainda que as “humanidades” tenham concebido as ideias abjetas que, desde o interior de seus departamentos, fizeram metástase para a sociedade, ela também se espraiou para outras áreas do conhecimento. Por exemplo, recentemente um programa de pós-graduação em matemática divulgou suas áreas de pesquisa, dentre as quais estavam “educação em ciências e matemática para a diversidade sexual e de gênero e de justiça social” e “decolonialidade e relações étnico-raciais na educação em matemática e ciências”.
Ou seja, mesmo as áreas outrora consideradas “hard sciences” estão “amolecendo”, deixando de lado o rigor do método científico para se tornarem mecanismos para a ideologização de jaez marxista (contribuiu imensamente para isso a inserção de disciplinas oriundas das “humanidades” em outros cursos. Foram alterados projetos pedagógicos de vários cursos, permitindo que as “humanidades” se alastrassem para outras áreas, mesmo para as “hard sciences”, propagando nelas suas ideologias).
Mas, tendo em mente que na matemática há, hoje, áreas como as acima citadas, não surpreenderá se em breve os cursos de matemática “cancelarem” Euclides, Arquimedes, Descartes, Newton, Galileu, et al. Afinal, eram todos homens brancos, europeus e, até onde lemos em suas biografias, heterossexuais. Ou seja, são todos uma afronta à agenda esquerdista, tal como o são filósofos como Platão, Aristóteles e Kant (os quais foram objeto de uma petição, em 2017, na Inglaterra, para não serem mais estudados), e escritores como Shakespeare, John Milton, Alexander Pope, William Wordsworth e T.S. Eliot (objetos de uma petição, na universidade Yale, nos USA, para não serem mais abordados nas aulas de literatura inglesa).
A ideia é “decolonizar” o ambiente acadêmico, o que significa dizer: extirpar de nossa cultura o que nela há de mais elevado. Em verdade, isso significa eliminar a civilização mesma, com todos os seus pilares. Trata-se de nos reduzir a uma vida similar àquela dos povos primitivos, tão enaltecidos pelo nosso meio acadêmico, pelos mesmos “ungidos” que escrevem desde suas casas confortáveis, em seus sofisticados aparelhos eletrônicos com acesso à internet e a todas as benesses do mundo civilizado.
Por outro lado, todo aquele que vive em alguma cloaca socialista deseja desesperadamente fugir dela, assim como todo aquele que não usufrui das benesses do mundo civilizado anseia por ter acesso a essas mesmas regalias. Os críticos do mundo civilizado, de seus valores e instituições, são justamente os que mais desfrutam de seus privilégios, os negando aos demais. Tal é o que ocorre com a ‘economia de mercado’ (capitalismo).
Seus críticos são justamente os que mais usufruem da riqueza por ela promovida, como, por exemplo, a comunidade acadêmica, a qual se beneficia de uma economia de mercado (dos confortos por ela assegurados) e defende uma economia planificada (de matriz socialista). Claro, sabemos que em ditaduras socialistas seus tiranos vivem nababescamente, enquanto seu povo definha de fome e tem seus direitos fundamentais violados.
Por exemplo, durante as últimas cinco décadas mais de um milhão de pessoas fugiu de Cuba, abraçando qualquer coisa que boiasse e os pudesse levar até a Flórida, nos USA. Desnecessário dizer que muitos morreram no percurso. Um recente estudo da Universidade Católica Andres Bello (UCAB) revelou que 96% da população venezuelana está na pobreza, um índice que supera mesmo países africanos assolados pela fome e pela miséria. Desde que passou a implementar ideias socialistas, a Argentina, que, tal como a Venezuela, já teve uma economia pujante, passou a ter um crescimento nos índices de pobreza, tendo chegado a 40.9% (quase metade da população) no primeiro semestre de 2020.
E tais dados são crescentes, o que nos leva a prever que em breve ela poderá se aproximar do índice venezuelano.
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No entanto, o câncer da ideologia socialista segue fazendo metástase em nossas universidades, nas quais se insiste em ideias que causam miséria, sofrimento, mortes, etc. Isso fica claro quando identificamos os mecanismos utilizados para seu aparelhamento. Desse modo, uma forma de constatarmos o aparelhamento de nossas universidades está em discernirmos os pontos para provas em concursos públicos. Isso porque tais pontos servem como mecanismo de triagem para o ingresso daqueles que irão (de) formar os futuros formandos.
Nas “humanidades”, por exemplo, ao longo de muitos anos tem sido comum o estabelecimento de pontos que atacam frontalmente nossa tradição ocidental, particularmente nossas instituições e valores. Tais pontos, em geral, também enaltecem questões de gênero, raça, etc. E, claro, sempre encontramos ataques ao fantasma denominado, pela esquerda, de “neoliberalismo”.
Em suma, toda a agenda típica da esquerda está lá. Nesse sentido, a “prova” para ingresso é, na verdade, não um mecanismo para avaliar a capacidade e o conhecimento do candidato, bem como suas habilidades didáticas, mas, sim, seu alinhamento ideológico. Hoje é praticamente impossível um candidato liberal e conservador ingressar nas “humanidades”, por exemplo. Mesmo uma área pertencente às “humanidades” mas intimamente ligada à área da saúde, a psicologia, foi tomada de assalto pela agenda esquerdista.
Recentemente foi publicado um edital para concurso nessa área, no qual se destacavam pontos de prova como “subjetividade, identidade e capitalismo”, “intervenção do psicólogo nos processos de participação dos trabalhadores nas organizações”, “a psicanálise e o discurso capitalista”, “psicanálise, exclusão e segregação: questões étnico-raciais, de gênero, classe social e deficiências”, etc.
Agora, pergunto: um psicólogo liberal e/ou conservador que dissertasse (ou ministrasse sua aula de didática) em defesa da economia de mercado, esclarecendo (com base em fatos, dados, autores, etc) como ela pavimentou nosso caminho para a riqueza e para a liberdade, seria aprovado nesse concurso? Mais: e se ele questionasse a ideologia de gênero, revelando (com base na ciência, nos fatos, dados, etc) que a mesma expressa um obscurantismo anticientífico com efeitos perniciosos sobre as pessoas?
Eu realmente duvido que ele fosse aprovado.
Na verdade, todo aquele que pretende ingressar em uma universidade está ciente disso. Eu já soube de candidatos conservadores, simpáticos ao liberalismo, que simplesmente conseguiram ocultar suas convicções para criar uma espécie de ‘persona esquerdista’, um ‘alter ego’ totalmente alinhado com a ideologia da esquerda. Cientes de que a capacidade intelectual não seria o critério para ingresso em concursos e seleções, liberais e conservadores estão simplesmente se adaptando e apresentando às bancas aquilo que elas esperam: um potencial doutrinador da ideologia esquerdista.
Isso implica em eles mascararem inclusive suas redes sociais, uma vez que hoje o acesso às plataformas digitais de candidatos se tornou (embora informalmente) um dos critérios determinantes para a seleção, muitas vezes mais determinante do que o currículo.
De qualquer forma, atualmente nem em instituições privadas os liberais e conservadores estão seguros, independentemente de suas credenciais curriculares. Em instituições privadas, ser liberal e/ou conservador pode ser motivo para a demissão do professor. Aliás, eu recentemente soube de um professor altamente qualificado que foi demitido de sua instituição, pois criticou, em plataformas online, o marxismo cultural vigente nas universidades, inclusive privadas. Sua demissão apenas corroborou o que ele havia defendido publicamente.
Embora não ocupasse suas aulas com essas questões, ele se tornou persona non grata em seu departamento por simplesmente ser simpático ao liberalismo e ao conservadorismo. Se tornou inaceitável para seus pares ele expor suas posições mesmo fora da universidade.
Assim, vejam: embora dominante nas universidades públicas, a ideologia de esquerda (“marxismo cultural”) também grassa pelas universidades privadas, as quais dependem justamente de uma economia de mercado para prosperarem. É comum professores em universidades privadas, com generosos salários e uma vida materialmente confortável, criticarem justamente as causas de seu conforto.
Desprezam a economia de mercado, o lucro, e agora se desesperam com a queda no número de alunos matriculados por conta da crise econômica causada pelo isolamento social forçado (houve uma queda de 56% no ingresso de alunos nas instituições de ensino superior privadas no segundo semestre do corrente ano).
Assim insisto: os maiores beneficiários de uma economia de mercado são, paradoxalmente, seus principais algozes.
Mas, voltando à questão do ingresso na universidade, embora seja uma estratégia de sobrevivência para aquele que deseja entrar no ambiente universitário, a necessidade dessa prática (de criar uma ‘persona esquerdista’) escancara o grande problema das universidades. Recursos humanos mais qualificados estão sendo obliterados e perdidos pela ideologização, uma vez que, desde a seleção do docente, se impõe uma triagem baseada em ideologias, não em qualificação para a atividade docente tendo em vista o propósito originário da universidade.
Desse modo, editais que demandem certos pontos, claramente direcionados à escolha não de professores, mas de doutrinadores e ativistas de esquerda, deveriam ser revistos para que se assegurasse uma seleção fundada no mérito, independentemente do viés político do candidato. Somente assim restituiremos as universidades ao seu propósito originário, assegurando não apenas o avanço do conhecimento nas mais diversas áreas, mas, em consequência, a prosperidade social em todas as suas formas.
Afinal, a universidade deveria ser uma das formas de levarmos a efeito a célebre máxima do direito romano: “salus populi suprema lex esto”. Não se trata, pois, de promovermos nossas ideologias, mas o bem comum.
Carlos Adriano Ferraz
Graduado em Filosofia pela Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), Mestre em Filosofia pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), doutor em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), com estágio doutoral na State University of New York (SUNY). Foi Professor Visitante na Universidade Harvard (2010). É professor da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), bem como membro do Docentes pela Liberdade (DPL) nacional e diretor do DPL/RS.
Jornal da Cidade