segunda-feira, 14 de setembro de 2020

Assassinado há 18 anos (Alô, Lula! Alô, Dirceu! Alô, Gilberto Carvalho!) Celso Daniel ainda mobiliza campanha em Santo André. Guerra entre gangues pela divisão da grana roubada levou ex-prefeito de Santo André à morte

A figura do ex-prefeito Celso Daniel, assassinado há 18 anos, ainda exerce influência na disputa pela prefeitura de Santo André, na Grande São Paulo. Ao menos três herdeiros políticos do ex-prefeito estão concorrendo, e até adversários usam as gestões do petista, que governou a cidade por dois mandatos – de 1989 a 1992 e de 1997 a 2002, como referência.

Entre os que se apresentam como seu herdeiro na disputa está o irmão do político assassinado em 2002, Bruno Daniel (PSOL). A lista conta ainda com o antigo vice de Celso Daniel, João Avamileno – ex-prefeito e candidato pelo Solidariedade – e Bete Siraque, candidata pelo PT. Celso é elogiado pelo tucano Paulo Serra (PSDB), atual prefeito que disputa a reeleição e foi secretário da gestão petista de Carlos Grana (2013 a 2016), e até por Wagner Grillo, que concorre pelo MDB.

Rompido com o PT desde 2019, Avamileno comandou Santo André entre 2002 e 2008. Foi eleito vice em 1997, e assumiu o cargo após a morte de Celso, reelegendo-se em 2004. Ele admite que o pleito deste ano deixa explícita a influência do ex-prefeito, sempre resgatado nas eleições. “Pelo seu modo de governar, sua capacidade, a maneira como foi assassinado e os trabalhos sociais, isso acabou criando uma memória.”

Celso Daniel ainda mobiliza campanha em Santo André
Irmão mais novo do ex-prefeito, Bruno Daniel 
concorre à prefeitura pelo PSOL.  
Foto: Taba Benedicto/Estadão

Na tentativa de recuperar o governo da cidade, o PT aposta na vereadora Bete Siraque, mulher do ex-deputado federal Vanderlei Siraque, que deixou o PT e hoje está no PCdoB. A candidata trabalhou na Secretaria de Educação de Santo André durante o segundo mandato de Celso Daniel. Ela afirma que a influência do ex-prefeito é “inegável”. “Ele é uma referência até os dias de hoje”. Diante da candidatura do irmão de Celso pelo PSOL, Bete faz questão de afirmar que o legado deixado no município é “parte de um trabalho construído pelo partido”.

“Celso fazia parte de um partido com outras pessoas que ajudaram a fazer seu programa de governo à luz do que o PT defendia. Todo mundo quer usar o nome do Celso, mas o legado da história do que realizamos em nossos governos é do PT.” Bete admite que o resgate de Celso Daniel pode ajudar na campanha, mas afirma que o PT necessita apresentar um projeto consistente para a cidade.

Candidato do MDB, Grillo afirma que Celso Daniel foi “o melhor prefeito” que Santo André já teve por sua capacidade de “agregar valores ao município”. “Ele fazia os orçamentos participativos e cumpria. Era bem claro no cumprimento das propostas.” Serra, atual prefeito, também teceu elogios ao petista assassinado.

Corrupção

Elogiada pelos atuais candidatos à Prefeitura de Santo André, a gestão de Celso Daniel foi marcada por um escândalo de corrupção. Em 24 de novembro 2015, a Justiça condenou três pessoas por liderar um esquema de cobrança de propina de empresas de transporte contratadas pelo governo municipal: os empresários Sérgio Gomes da Silva e Ronan Maria Pinto e o ex-secretário Klinger Luiz de Oliveira Sousa. A sentença foi confirmada pelo Tribunal de Justiça dois anos depois. Os três negam as acusações.

Celso Daniel ainda mobiliza campanha em Santo André
Bruno Daniel: 'Foi no mestrado que começamos
a despertar para a política'. 
Foto: Taba Benedicto/Estadão

‘Querem atribuir a mim acusações que não fiz’

Pré-candidato do PSOL à prefeitura de Santo André, o professor de Economia Bruno Daniel (PSOL) concorre pela primeira vez a uma eleição. Ao lado da família, Bruno defendeu a apuração do crime, independentemente da possibilidade de as investigações atingirem a imagem de Celso ou a do PT. 

Em 2006, teve que deixar o Brasil com a família. Ele foi alvo de ameaças de morte após depor na CPI dos Bingos, que investigava um esquema de propinas para o PT. Na ocasião, chegou a acusar dirigentes petistas de receber propina, o que foi negado, óbvio, pelo partido de Lula.

Após 18 anos, a morte de Celso ainda suscita polêmica. “Nunca falei que o PT estava envolvido nisso. Sempre disse: é necessário investigar o que aconteceu e, se os investigados têm ou não vínculo com o partido, isso deve ser obtido a partir das apurações. Muitos querem atribuir a mim acusações ao PT que eu nunca fiz”, afirma. “Instalou-se no governo do Celso uma máfia, e máfia atua de um jeito que sai de qualquer tipo de lógica racional.” De volta ao Brasil, em 2012, Bruno rompeu com o PT, partido do qual foi fundador. Agora diz querer o resgate do legado de Celso.

De família tradicional – seu pai, Bruno José Daniel, dá nome ao estádio municipal – o pré-candidato diz que interesses em comum levaram ele e o irmão a fazer mestrado em Administração e Planejamento Urbano na FGV. “Foi no mestrado que começamos a despertar para a política. Foi a primeira vez que a gente estudou Marx, Lenin e Trotsky.”

Petista foi morto em 2002

Então prefeito de Santo André e coordenador do programa de governo da campanha de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência, Celso Daniel foi encontrado morto com marcas de tiro em 20 de janeiro de 2002, dois dias após ser sequestrado. Um inquérito policial concluiu que o crime foi cometido por uma quadrilha da favela Pantanal, zona sul de São Paulo. Seis homens foram condenados. O Ministério Público investigou se o assassinato foi motivado para acobertar um esquema de corrupção que existia na prefeitura, mas a tese não prosperou.

Com informações de Rodrigo Sampaio, O Estado de S.Paulo