Alan Marques/Folhapress | |
O juiz Sergio Moro (à dir.), responsável pela Lava Jato, conversa com o presidente do senado, Renan Calheiros |
DÉBORA ÁLVARES
MARINA DIAS
CAMILA MATTOSO
Folha de São Paulo
MARINA DIAS
CAMILA MATTOSO
Folha de São Paulo
Ao participar de debate nesta quinta-feira (1º) sobre uma proposta de abuso de autoridade que tramita no Senado, o juiz Sergio Moro afirmou que a aprovação de uma lei nesse sentido pode "passar uma mensagem errada à sociedade brasileira".
"Uma nova lei de abuso de autoridade poderia ser interpretada nesse momento com tendo efeito prático de tolher investigações e persecuções penais. Faço essa sugestão com humildade", disse o juiz, muito aplaudido ao final de sua fala.
"Não quero censurar o que faz o Senado. Mas o Senado pode passar imagem errada à sociedade brasileira", completou.
Mesmo sem fazer menção ao caso, Moro aproveitou para criticar a votação na Câmara do pacote anticorrupção, quando os deputados desfiguraram as medidas enviadas pelo Ministério Público com emendas aprovadas ao longo da madrugada de quarta (30).
"Essas emendas da meia-noite que não permitem debate da sociedade mais aprofundado do Parlamento não são apropriadas em temas tão sensíveis."
Nesse pacote aprovado na Câmara, passou um trecho que abre a possibilidade de juízes e integrantes do Ministério Público responderem por crimes de abuso de autoridade com base em várias condutas, algumas de caráter subjetivo.
Na noite desta quarta (30), logo que a proposta chegou ao Senado, o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), bancou um requerimento para acelerar a tramitação do pacote e levá-lo direto ao plenário. Ele foi derrotado por 44 votos a 14.
A avaliação nos bastidores é que, um dia antes de receber Sergio Moro no Senado, o senador peemedebista, um hábil parlamentar conhecedor da temperatura do plenário da Casa, só queria "assustar" e "enfrentar" os procuradores da Lava Jato. Isso após reação deles, na qual disseram que deixariam as investigações caso o Congresso aprove qualquer medida de abuso de autoridade.
DEBATE
Moro disse que teria "várias sugestões" para o projeto de abuso de poder que tramita no Senado, mas ali no plenário se restringiria a uma: preservar o agente da lei para que ele não seja punido "por uma interpretação errada de uma lei de abuso de autoridade".
O juiz sugeriu incluir no projeto que "não configura crime a divergência na interpretação da lei e na interpretação de fatos e provas".
Moro disse ainda que acredita não estar na hora de votar o projeto. "Tenho alguma preocupação, com todo respeito, que talvez não seja o melhor momento para a deliberação de uma nova lei de abuso de autoridade, considerando o contexto, que existe uma investigação importante em andamento. Não só a Lava Jato, mas várias outras importantes."
Ele participa da segunda rodada de debates sobre um projeto de lei que endurece o abuso de autoridade. A proposta é encampada pelo presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL).
Também convidado, o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes discordou de Moro e questionou: "Vamos ter que esperar um ano sabático das investigações para que a gente possa fazer esse debate?".
Ao tratar da proposta anticorrupção do Ministério Público, afirmando que é preciso olhar "com atenção" também para projetos de iniciativa popular, o ministro ironizou as medidas: "Hoje frequento muito São Paulo e aprendi que quem contrata o Sindicato dos Camelôs, em uma semana, consegue mil assinaturas. Portanto, não vamos canonizar iniciativas populares".
Ao abrir a sessão desta manhã, Renan saiu em defesa da proposta e negou qualquer intenção de "intimidação de autoridades no exercício regular de suas funções". "Tenha-se a santa paciência. Não se pune a autoridade, mas o abuso exatamente para garantir a autoridade. O projeto ainda é ameno, bastante ameno", completou.
"É preciso tomar um cuidado especial para que, a pretexto de se coibir o abuso, a legislação prevista não tenha efeito prático contrário".
Dirigiu-se ainda ao juiz convidado para o debate. "A minha segunda palavra, excelentíssimo juiz Sergio Moro, é de reflexão. O consenso supera o confronto. A concórdia prevalece sobre o dissenso. A compreensão e o entendimento afastam a discórdia. As soluções negociadas para as divergências são sempre possíveis, por mais distantes que possam parecer", afirmou.