- Robson FonsecaA partir da esq., o governador Geraldo Alckmin (PSDB) em Mauá (SP), ao lado do candidato Átila Jacomussi (PSB) e do vice-governador Márcio França (PSB)
A tarde havia sido encerrada pela chuva, mas o calor, beirando os 30ºC, persistia em Mauá, na região do ABC, na Grande São Paulo. Com o suor caindo pela testa e molhando os poucos fios de cabelo que ainda lhe atravessam a cabeça, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) levantou as mãos do candidato do PSB à prefeitura da cidade, o deputado estadual Atila Jacomussi, e do vice-governador e presidente estadual da sigla aliada, Márcio França, após proferir o discurso que ressaltava a união dos esforços dos dois partidos nas eleições.
Não era simplesmente um agrado: no segundo turno, Alckmin tem dedicado mais tempo às candidaturas do PSB do que às de seu partido na região metropolitana. Uma prova disso foi antecipar a ida a Mauá, preterindo as visitas às maiores (e mais importantes) Santo André e São Bernardo do Campo, que contam com candidatos tucanos no segundo turno.
O ato foi uma espécie de dívida de gratidão de Alckmin a França. Nestas eleições, o PSB do vice-governador tornou-se aliado de primeira hora: viabilizou a candidatura de João Doria à Prefeitura de São Paulo, ao ser o primeiro partido a aderir à chapa do hoje prefeito eleito, carregando mais três partidos do que França chama de "bloquinho da Assembleia Legislativa", que dá sustentação ao governador (PSB, PPS e DEM --o PV, que também integra a coalização, apoiou Celso Russomanno, do PRB).
No ABC, os partidos de governador e vice venceram em São Caetano do Sul e Rio Grande da Serra, com o PSDB, e Ribeirão Pires (PSB). Disputa o segundo turno em Santo André, São Bernardo do Campo e Mauá. Diadema está entre candidatos PV, também apoiado por PSDB e PSB, e PRB. Ou seja, essa base pode terminar com a quase totalidade dos prefeitos, algo que o PT, cujo berço eleitoral é a região, jamais conseguiu --pela primeira vez na história, o PT pode inclusive não conquistar nem sequer uma prefeitura.
O PSB foi o terceiro partido mais votado no primeiro turno no país, com 8,3 milhões de votos. Ficou atrás apenas das megaestruturas de PSDB e PMDB. Em São Paulo, reelegeu em primeiro turno Jonas Donizette em Campinas, a terceira maior cidade do Estado, e lidera com folga a disputa na segunda maior, Guarulhos, com o advogado Gustavo Henric Costa, o Guti, 31.
Esses resultados reforçam o cacife de Márcio França, hoje o maior fiador da candidatura de Geraldo Alckmin para a Presidência em 2018 --algo que, se concretizado, colocará o Palácio dos Bandeirantes no colo do pessebista no mesmo ano.
"A gente é mais Alckmin do que PSDB", afirma França. "Se nosso bloco migrasse para a base do Andrea Matarazzo [candidato a vice-prefeito derrotado na chapa de Marta Suplicy (PMDB) que havia enfrentado Doria nas prévias tucanas na capital e abandonou o partido], talvez ele ganhasse a eleição. Mas é a liderança quem dá o tom, por isso o Alckmin sobressai. Estou à disposição dele, e a minha prioridade é o seu projeto de candidato a presidente."
O racha entre Alckmin e os caciques tucanos se estendeu da capital para as cidades vizinhas. Em Mauá, o candidato tucano no primeiro turno, Clovis Volpi, anunciou apoio ao adversário de Átila, o petista Donisete Braga, contra a orientação do partido, e foi expulso. Em Guarulhos, segunda maior cidade do Estado, embora o PSDB municipal tenha apoiado a candidatura de Guti (PSB), o ministro das Relações Exteriores, José Serra, e o senador Aloysio Nunes Ferreira estiveram na cidade apoiando o adversário, Eli Correa Filho (DEM). O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso gravou depoimento veiculado nas redes sociais pelo candidato do Democratas.
"Ele não é sofisticado, por isso há a rejeição no partido", diz França. "O Alckmin é um binômio de cautela e simplicidade. É como a bandeira de São Paulo: linhas retas, iguais e repetidas. Ele é o picolé 'de virtudes' [em alusão ao apelido criado pelo humorista José Simão, 'picolé de chuchu'], marido da dona Lu e o anestesista de Pindamonhangaba."
Foi ele quem se aproximou e formalizou o convite para os candidatos de Mauá e Guarulhos. "Eu sou muito próximo do Atila por trabalharmos juntos na Assembleia Legislativa. E ele era do PCdoB, ainda na esfera do petismo", diz. Na aliança de Mauá, o PSB conseguiu unir partidos como PCdoB, DEM e PMDB e famílias tradicionais do município, como a do ex-prefeito Leonel Damo, que indicou a mulher, Álice, como vice, e a de Márcio Chaves, um ex-petista que havia sido o mais votado para a prefeitura em 2004, mas que teve a candidatura cassada, hoje no PSD.
Em Guarulhos, a aproximação foi inusitada. França tem base eleitoral em São Vicente, cidade em que já exerceu o mandato de prefeito. O filho Caio, torcedor santista, encontrou na arquibancada da Vila Belmiro o chefe de gabinete de Guti, vereador em Guarulhos, que enfrentava dificuldades em seu então partido na cidade, o PV do ex-prefeito Jovino. Havia o convite do PSDB, mas ele teria que disputar prévias com Carlos Roberto, candidato que esteve no segundo turno em 2008 e 2012 --em ambas, perdeu para o prefeito Sebastião Almeida (PT). Foi acertada a ida de Guti para a sigla de França, onde foi escolhido por aclamação.
"Fui bastante desgastado pelas lideranças do PV na cidade", diz Guti. "Fui para a Justiça Eleitoral para sair do partido antes da janela [eleitoral] e tive a guarida do vice-governador. Escolhi o PSB porque acho que é a renovação, e essa aliança com o governo do Estado pode abrir mais espaço para a cidade, que hoje não conversa com o governador", diz o candidato guarulhense.
Caio França afirma que a estratégia, de distanciar o partido do PT, deu certo. "Nosso projeto estava muito unido com o deles e queríamos ficar longe", diz o deputado estadual. A união do PSB com os petistas no Estado durou de 1990 até 2010. Em 2011, por sugestão de Márcio França, o partido passou a integrar a base de Geraldo Alckmin na Assembleia Legislativa paulista. Em 2014, França foi eleito vice na chapa do governador.
O presidente do PSB não vê alguém no partido com projeção nacional para a disputa presidencial em 2018. Nas últimas eleições, o PSB lançou candidato próprio (Anthony Garotinho, em 2002), apoiou o PT em 2006 e 2010 e foi surpreendido pela morte de Eduardo Campos na campanha de 2014 --optou por substituí-lo pela recém-filiada Marina Silva, que chegou ao partido após negociação com França.
"O momento descarta voos inusitados", diz o vice, que rejeita a reaproximação com a hoje líder da Rede ("sem tempo de TV, ela não tem projeção, o que ficou evidente nesta eleição"). Ele enxerga três grandes eixos em 2018: o PSDB, Lula e Ciro e o atual governo. "Se houver um grande consenso, não haverá prévia [no PSDB]. O Aécio Neves tem 56 anos, o Alckmin, 63. O Aécio tem mais umas três eleições pela frente. A hora é a do Alckmin."
E se o governador paulista não for escolhido? "Eles terão uma surpresa muito grande com o Alckmin", diz. A reportagem questiona: uma provável ida para o PSB? Márcio França apenas arregala os olhos e sorri com as bochechas cheias de ar, como quem quer falar algo, mas ainda é cedo para afirmar. Pela solidez da atual aliança com o governador, surpresa não será.