Havia uma expectativa também que o número de sindicatos caísse, já que muitos teriam sido criados apenas para receber essa contribuição obrigatória. Mas isso não ocorreu. Em setembro, o país tinha 16.663 sindicatos — um ano atrás, o número era ligeiramente menor, de 16.517 sindicatos.
O fim da contribuição sindical afetou as negociações entre patrões e trabalhadores. Entre janeiro e setembro, o número de acordos e convenções salariais firmadas caiu 28% em relação ao mesmo período do ano passado, anterior à reforma, segundo dados da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe).
Disputa em convenções
Na avaliação de especialistas, o principal entrave à concretização das negociações até agora tem sido a interpretação dos sindicatos dos trabalhadores sobre a possibilidade de aprovar em assembleia a cobrança da contribuição sindical anual, nos moldes anteriores à reforma. Antes da legislação ser alterada, a contribuição sindical era um desconto obrigatório que equivalia a um dia de trabalho.
No entanto, em junho, o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou a tese dos sindicatos, de aprovação de contribuição sindical via convenção coletiva. A partir de então, ninguém pode ter esse desconto, a não ser que formalize a intenção de contribuir por meio de uma carta individual, que deve ser entregue à empresa e ao sindicato.
— As formas de financiamento dos sindicatos são os pontos mais sensíveis. Os sindicatos estão tentando incorporar formas de financiamento via convenção coletiva, mas alguns contrariam o que diz a reforma. A contribuição sindical do empregado só pode ser cobrada se houver anuência expressa e individual. E estão tentando instituir a cobrança via convenção coletiva — explica Gilberto Stürmer, coordenador da pós-graduação em Direito do Trabalho da PUC-RS.
Por essa razão, quando a convenção chega à empresa, explica Hélio Zylberstajn, economista da USP e coordenador do estudo da Fipe, ela devolve o documento para que retirem essa cláusula, causando um impasse entre as duas partes:
— Os sindicatos fazem a assembleia e aprovam dentro do pacote que todos vão fazer a contribuição, mas há jurisprudência que diz que a manifestação tem de ser expressa e individual, então o jurídico da empresa não assina, pois pode ser questionado judicialmente por algum trabalhador no futuro.
Clemente Ganz Lúcio, sociólogo e diretor-técnico do Dieese, diz que o fim da obrigatoriedade da contribuição sem a criação de uma compensação afetou os sindicatos, sobretudo os menores, num momento em que, justamente por causa da reforma, a negociação coletiva ganhou força nas relações de trabalho:
— Os sindicatos perderam capacidade de conduzir convenções coletivas, de prestar serviços de assistência jurídica, médica e odontológica gratuitos e de preparar as pessoas para a aposentadoria. Os que não cancelaram serviços, tiveram de reduzir o padrão e passar a cobrar por eles.
João Carlos Gonçalves, o Juruna, secretário-geral da Força Sindical, entidade que representa 1.720 sindicatos e 13 milhões de trabalhadores no país, reclama que a reforma não deu tempo para os sindicatos se adaptarem ao corte de receita:
— Colônias de férias e prédios onde funcionavam subsedes foram colocados à venda, foram demitidos médicos e alguns já não oferecem mais assistência médica e jurídica.
Fim de curso gratuito
A saída foi tentar aumentar o número de associados, que contribuem com mensalidade. A alternativa tem dado certo no Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil de São Paulo, que representa 270 mil trabalhadores, mas não é suficiente para compensar perdas. A arrecadação com o imposto caiu 60%, segundo o presidente, Antonio de Sousa Ramalho:
— Demitimos 60% dos funcionários. O quadro caiu de 457 para 157 pessoas, o atendimento médico e odontológico agora funciona fora da sede, por meio de parceria, e o jurídico, que era gratuito para todos os trabalhadores, passou a ser cobrado. Quem é sócio paga um preço mais baixo.
O sindicato da Construção Civil do Rio, que cobre 32 cidades, teve de cortar benefícios, como a cesta básica oferecida aos trabalhadores por três meses após o fim do seguro desemprego. Também reduziu os funcionários de 23 para 4, o número de clínicas médicas de 36 para dez, e o de assessores jurídicos de seis para apenas um.
— Nossa categoria não depende só do imposto sindical. Mas o desemprego ajudou a piorar o quadro porque fez com que as contribuições caíssem ainda mais — diz o presidente Nilson Duarte.
No Sindicato dos Garçons, Barmens e Maîtres (Sigabam) do Rio, a arrecadação com esse imposto caiu 90%, conta Antonio Anjo, presidente da entidade, que representa 12 mil profissionais. A contribuição obrigatória representava quase um terço da receita do sindicato. Os cursos de qualificação, antes gratuitos, agora têm mensalidade de R$ 300.
Daiane Costa, Pollyana Brêtas e Marcello Corrêa, O Globo