O que já aconteceu outras vezes no Supremo — um pedido de vista, agora do ministro Luiz Fux — congelou um julgamento já decidido por maioria de votos sobre um tema polêmico.
É o caso rumoroso do decreto de indulto de Natal assinado pelo presidente Michel Temer em fins de 2017, que provocou rápida reação contrária da procuradora-geral da República, Raquel Dodge. Ao relaxar critérios usuais em indultos concedidos pelo chefe do Executivo federal, Temer passou a ser acusado de usar uma prerrogativa presidencial para ajudar condenados pela Lava-Jato.
À época, a ministra Cármen Lúcia, então presidente do STF, responsável pelo plantão de fim de ano do tribunal, acolheu o pedido de liminar de Dodge. O ministro Luís Roberto Barroso foi sorteado relator do processo e deu, na quarta-feira, um forte voto contra os termos do indulto. Mas, por maioria, mesmo com o julgamento não finalizado, já está derrotado por seis a dois, faltando apenas três ministros a votar. O resultado só será promulgado depois da devolução do processo por Fux, sendo que até lá ministros podem mudar de posição.
A delicadeza da matéria em julgamento cria o risco da crítica fácil e de se entender, de forma ligeira, que o voto vencedor apoia corruptos. Na verdade, o centro do debate é jurídico, porque uma leitura simples da Constituição respalda o poder do presidente de definir os termos do indulto. As divergências nascem de formas diversas de os ministros interpretarem a Constituição. Discute-se, na realidade, o alcance das prerrogativas do presidente na República. Ele tudo pode? Não deveria.
Mas, como nada é simples neste tipo de embate nos tribunais, além de Barroso, também o ministro Edson Fachin acolheu a reclamação da PGR.
Sem citar nomes e fatos, alegou que se a Justiça pôde impedir a nomeação de Lula, por Dilma, para a Casa Civil, também pode interferir no perdão dado por Temer.
À parte minúcias jurídicas, o momento por que passa o país — envolvido num decisivo enfrentamento contra o crime organizado em geral, e em particular o que corruptos e corruptores fazem dentro da máquina do Estado, esvaziando os cofres públicos —, a prudência aconselha o Judiciário a não abrir espaços que possam ser usados por essas quadrilhas.
O decreto reduz de um terço para um quinto o cumprimento da pena para efeito do perdão, e ainda inclui os crimes típicos de corrupção na lista dos indultáveis, sem esquecer as multas. O efeito deletério, mesmo que não seja este o objetivo, é não apenas soltar condenados da Lava-Jato, como desestimular futuras delações premiadas. Apesar de bem fundamentadas argumentações técnicas em favor da prerrogativa de Temer.
Como disse o ministro relator Barroso, o crime de corrupção é grave.
Mata de forma silenciosa por meio de estradas malconservadas e redes públicas de saúde desabastecidas devido à falta do dinheiro público em cofres saqueados.