quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

"Sindicatos contra o trabalhador", editorial do Estadão

É preocupante a notícia de que centrais sindicais estão instruindo os sindicatos a desrespeitarem a legislação em vigor. Segundo reportagem do Estado, as principais centrais sindicais estão aconselhando seus filiados a aprovarem, por votação em assembleia extraordinária, a manutenção da cobrança da contribuição sindical. Essa orientação contraria o que determina a Lei 13.467/17, que trata da reforma trabalhista.
Até novembro de 2017, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) estabelecia que não era necessária autorização do empregado para cobrar a contribuição sindical. Com a entrada em vigor da reforma trabalhista, essa possibilidade foi extinta. “O desconto da contribuição sindical está condicionado à autorização prévia e expressa dos que participarem de uma determinada categoria econômica ou profissional, ou de uma profissão liberal, em favor do sindicato representativo da mesma categoria ou profissão”, diz o atual art. 579 da CLT, na redação dada pela Lei 13.467/17.
Apesar da sua clareza, algumas centrais sindicais ignoram o texto legal. Com 1.707 sindicatos filiados, a Força Sindical distribuiu em janeiro um modelo de como realizar uma assembleia para aprovar a cobrança da contribuição sindical. A União Geral dos Trabalhadores (UGT) e a Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) também orientaram seus sindicatos a realizarem assembleias para manter a contribuição.
A atitude dessas centrais evidencia, uma vez mais, a ruptura entre a atuação dos sindicatos e o interesse dos trabalhadores. A Lei 13.467/17 devolveu um importante direito ao empregado, assegurando que só ele tem o poder de autorizar o pagamento da contribuição sindical. Não se pode presumir que o trabalhador queira contribuir e não se pode transferir essa decisão a algumas pessoas presentes numa determinada assembleia.
Em vez de reconhecerem os benefícios da nova lei para o trabalhador, as lideranças sindicais simplesmente olharam para seus interesses imediatos, tentando, a todo o custo, que a reforma trabalhista não seja aplicada.
Vale lembrar que a Lei 13.467/17 não proíbe a contribuição sindical. Ela apenas exige que o trabalhador dê autorização prévia e expressa a essa cobrança. Ou seja, se a contribuição sindical é a principal fonte de receita dos sindicatos, o caminho para a sobrevivência dessas entidades é uma efetiva aproximação dos trabalhadores, de forma que estes se sintam representados e autorizem a contribuição. Driblar a lei com a realização de uma assembleia dispondo sobre o que não pode dispor é mais que arriscado – é sobreviver à margem da lei.
Além de assegurar que o trabalhador não terá um porcentual do seu salário descontado compulsoriamente, o que já é extremamente relevante, a disposição da Lei 13.467/17 é um forte estímulo para que os sindicatos cumpram adequadamente a sua função.
Os sindicatos são entidades que representam – devem representar – os interesses de seus sindicalizados. Ao estabelecer que sua principal fonte de receita dependa da anuência dos associados, a reforma trabalhista insta os sindicatos a trabalhar de fato a favor dos empregados. Caso contrário, estes não autorizarão a cobrança da contribuição sindical.
Talvez seja esse o principal motivo da resistência dos sindicatos à reforma trabalhista. Sob as regras anteriores, essas entidades estavam livres de maiores pressões de seus sindicalizados e dos trabalhadores das categorias que dizem representar. As lideranças sindicais atuavam como bem queriam e a renda – generosa e abundante – lhes chegava automaticamente, por força do caráter compulsório da contribuição sindical. Em 2017, só as centrais arrecadaram mais de R$ 200 milhões.
Em boa hora, portanto, a reforma trabalhista pôs o interesse e a vontade do empregado em primeiro lugar. Ainda que a realidade desagrade às entidades sindicais, elas não podem desrespeitar a lei e os trabalhadores.