terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Fora do Congresso, 81 ex-parlamentares perdem foro especial

André de Souza e Eduardo Bresciani - O Globo

Ações contra os que não se reelegeram vão do Supremo para outras instâncias


Pelo menos 81 parlamentares federais deixarão de responder processos abertos no Supremo Tribunal Federal (STF) contra eles porque não se reelegeram e já não têm, desde sábado, direito ao foro privilegiado. As ações e inquéritos irão para outras instâncias da Justiça. Ao todo, 228 deputados e 23 senadores deixam de ser parlamentares, sendo que alguns renunciaram anteriormente para assumir outros cargos. Ao todo, quatro senadores e 77 deputados eram processados ou investigados no STF.


Há na lista crimes desses parlamentares de homicídio a trabalho escravo. São acusados de assassinato os agora ex-deputados Júlio Campos (DEM-MT), Alexandre Roso (PSB-RS) e Paulo César Quartiero (DEM-RR). Respondem por trabalho escravo João Lyra (PSD-AL), Camilo Cola (PMDB-ES) e Urzeni Rocha (PSD-RR). A maior parte dos procedimentos contra parlamentares é por crimes contra a administração pública, como peculato, corrupção, contra a lei de licitações, ou eleitorais.

Dois viraram governadores

Dos 81 ex-parlamentares que perdem o foro, 66 responderão às acusações na primeira instância, da mesma forma que os demais cidadãos. Dois foram eleitos governadores e serão processados no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Os demais ocupam cargos que os permitem responder perante os Tribunais de Justiça de seus estados. Os parlamentares são de 19 partidos e somente no estado de Sergipe não foi encontrado ninguém nessa situação.

Quartiero é quem tem o maior número de pendências no STF. São sete ações penais e cinco inquéritos, quando a investigação está ainda no começo. Ele foi eleito vice-governador de Roraima e responderá às acusações no TJ local. Uma das investigações aparece no sistema da Corte como homicídio. Seu advogado, Ticiano Figueiredo, afirmou que a acusação é de tentativa de homicídio. De acordo com ele, o MP apontou Quartiero como responsável em um conflito entre arrozeiros e indígenas na época da demarcação da reserva Raposa Serra do Sol.

No confronto, um indígena foi alvejado, mas não morreu. Figueiredo afirmou que seu cliente não estava na região e não tem ligação com o caso. E alegou que as ações são fruto de perseguição política.

A acusação de homicídio contra Júlio Campos também envolve conflito por terra. Ele é acusado de mandar matar duas pessoas em 2004, para se apropriar de terras em Mato Grosso que seriam ricas em diamantes e outras pedras preciosas. Campos não foi localizado. A defesa negou que ele tenha participação no crime.

Alexandre Roso, por sua vez, é médico e a acusação contra ele é pela morte de cinco pessoas por complicações decorrentes de cirurgias de gastroplastia entre 2001 e 2003. Rafael Favetti, seu advogado, disse que está esperando o fim da perícia pedida. Segundo ele, não há nexo entre as cirurgias e as mortes.

As acusações de trabalho escravo são todas relativas à possível exploração de trabalhadores em fazendas. João Lyra já foi o parlamentar mais rico do Congresso e o grupo de usinas que leva seu nome está em situação falimentar. O coordenador jurídico do grupo, Flávio Moura, negou a ocorrência de crime nas fazendas de Lyra.

Do Rio, 7 parlamentares

São sete os ex-parlamentares do Rio na lista. Entre eles está Anthony Garotinho (PR-RJ).

Ele é réu em uma ação penal que trata de corrupção passiva, quadrilha e lavagem de dinheiro. Responde ainda a um inquérito por peculato. Adrian (PMDB-RJ) é investigado por crimes eleitorais. Dr. Paulo César (PR-RJ) responde a inquérito para apurar crimes da lei de licitações e contra a paz pública. Rodrigo Bethlem (PMDB-RJ) responde a inquérito por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Vitor Paulo (PRB-RJ) é réu em ação penal por crime eleitoral. Walney Rocha (PTB-RJ) é réu por corrupção passiva e investigado em outro inquérito pelo mesmo crime. Eurico Júnior (PV-RJ) é investigado por crimes na lei de licitações.

O ex-presidente do STF Carlos Velloso é crítico da prerrogativa de foro, que leva a constantes mudanças de juizado. Segundo ele, essa “dança de foro” favorece a impunidade.

— Isso é ruim. É decorrência do mal maior que é a existência do foro privilegiado. Tem casos inclusive que o processo vem para o Supremo, depois baixa novamente, sobe novamente — afirmou Velloso.