Uma chanchada eleitoral com todos os ingredientes para terminar em clamoroso desastre social
Neste sábado, 28, fim de fevereiro para não esquecer, o Consórcio Estaleiros Paraguaçu(CEP) - formado pelas empreiteiras OAS, UTC e Odebrecht - confirma o triste desenlace de um engodo anunciado: o encerramento das atividades na obra monumental de engenharia naval em Mararagogipe, coração do Recôncavo Baiano. Prometia empregar 5 mil pessoas na fase de construção e mais 6 mil em seguida à inauguração, anunciada para o ano eleitoral de 2014.
O megaempreendimento de infraestrutura nacional, realizado na Bahia, foi vendido pelo governo federal, desde o lançamento da pedra fundamental em julho de 2012, como sonho dourado no Nordeste. Atravessou assim a campanha que reelegeu presidente da República a petista Dilma Rousseff. De quebra, fez de Rui Costa (empurrado pelo muque do então ocupante do Palácio de Ondina e atual ministro da Defesa, Jaques Wagner) governador do estado já no primeiro turno.
A miragem de R$ 2 bilhões prometida com pompa e circunstância, em badalação sem tamanho no lançamento da pedra fundamental, foi um festival de guisos e euforia. Presentes Dilma, Wagner, Rui, Graça Foster, Gabrielli e a nata do poder no governo petista. Todos ao lado de poderosos empresários nacionais e estrangeiros, acatados executivos de empresas (antes da Lava Jato), prefeitos, parlamentares e a gente humilde e trabalhadora do lugar.
Tudo, ou quase, desmorona agora em meio ao silêncio quase completo. De omissão ou cumplicidade.
Propagava-se o ressurgimento da indústria pesada Off-Shore na Bahia (plataformas e equipamentos para exploração, transporte e distribuição de petróleo). Tudo antes de explodir a Lava Jato, que arrola corruptos e corruptores no maior escândalo da história brasileira e tem como pano de fundo a Petrobras, empresa do coração de todos. Executivos das empresas brasileiras do Consórcio estão presos, há meses, na carceragem da PF em Curitiba. Dilma, então, disse em seu discurso sobre a construção do estaleiro, "ser esse o jeito - diferentemente dos europeus - do governo brasileiro enfrentar a crise econômica: criando mais emprego e promovendo desenvolvimento". Uma peça histórica de retórica e enganação, que está na Internet e merece consulta.
O saudoso humorista Zé Trindade, honra da Era de Ouro do Rádio e glória do chamado cinema de chanchada no Brasil, fez o seu povo sorrir e espantar o mau humor durante décadas. Mesmo em épocas as mais bicudas, e em governos os mais caóticos e mais desastrados, ou os mais intolerantes, partia dele a tirada, a galhofa, o chiste ou a piada que levava à gargalhadas, ajudava sua gente a suportar e resistir ao tranco.
Zé Trindade usava duas expressões que funcionavam como cartão de visita em suas apresentações e filmes. A primeira era uma espécie de registro de identidade geográfica e afetiva que ele afirmava alto e bom som em todo lugar: "Eu sou baiano de Maragogipe!", marca registrada ainda mais engraçada pelo o acento genuíno que o artista emprestava ao pronunciar o nome da sua cidade.
A segunda, de cunho político e social (além de alcance nacional), era um bordão crítico. Provavelmente, se vivo estivesse, o fabuloso humorista o estaria repetindo com frequência nestes dias cavernosos do segundo mandato presidencial da petista Dilma Rousseff: "Nossa situação é lamentável", dizia o maragogipano famoso, acentuando com seu sotaque e jeito inimitáveis cada sílaba da palavra la-men-tá-vel.
Difícil imaginar, apesar de seu prevalente bom humor, o sentimento de Zé Trindade, diante do quadro destes dias em sua terra. Gritos de desempregados e familiares que se multiplicam. Choro de desiludidos e indignados diante da situação que se delineia na véspera do encerramento das atividades no estaleiro do Paraguaçu, como mostrou ontem a Tribuna da Bahia, em esclarecedora reportagem.
Ô, Bahia! É triste, dramático até em algumas passagens. Mas é necessário relembrar sem esconder ou escamotear fatos, a tragicomédiaque se desenrola em Maragogipe. Uma chanchada eleitoral com todos os ingredientes para terminar em clamoroso desastre social na terra de Zé Trindade. A conferir.
Estaleiro Paraguaçu, em Maragogipe encerra atividades neste sábado (Imagem: Divulgação)