sexta-feira, 29 de abril de 2022

'Vinhos de todos os tipos, para todos os gostos', por Bruno Meyer

 

Foto: Yulia Mikula/Shutterstock


Aimportadora de vinhos Cellar e a marca Lovin surpreenderam até mesmo seus gestores pela velocidade com que captaram investimentos nas últimas semanas. Fundada há 25 anos, mas com uma nova gestão desde 2019, que multiplicou em dez vezes o volume em vendas, a Cellar levantou R$ 15 milhões de um grupo de dez investidores-anjo, como Antonio Salvador, ex-vice-presidente do Grupo Pão de Açúcar, e Marcelo Tavano, ex-executivo da Microsoft. Dias depois, a Lovin — uma startup que vende vinhos em lata no valor de R$ 19,90 — captou R$ 2,5 milhões em apenas nove horas por meio da plataforma de crowdfunding Captable. Essa é a segunda captação: a primeira ocorreu no ano passado, quando, pela mesma plataforma, a startup conseguiu R$ 2 milhões. 

Rodrigo Malizia, CEO da Cellar | Foto: Divulgação

A bola da vez

As duas recentes rodadas de investimentos mostram a força de um mercado aquecido no país: os vinhos — dos mais simples, vendidos até em latas, aos mais caros e sofisticados. “O Brasil é a bola da vez”, resume Rodrigo Malizia, ex-diretor comercial dos bancos Modal e Pan Americano, que, hoje CEO da Cellar, comanda uma equipe de 50 profissionais. A frase de Malizia não é achismo, mas uma reprodução do que escuta nas vinícolas a partir das inúmeras viagens que o executivo faz para a Europa em busca de novos rótulos. Até mesmo a guerra na Ucrânia impacta o Brasil: com a saída da Rússia, diversos produtores passaram a escoar a produção para outros países. Malizia inclusive fechou recentemente com um produtor alemão por esse motivo. “Os produtores estão de olho e querem estar no Brasil”, diz.

Cellar Vinhos | Foto: Divulgação

60 litros por ano

Motivo é o que não falta para os europeus quererem desembarcar por aqui: o brasileiro nunca consumiu tanto vinho como nos dois últimos anos de pandemia. Em média, foram 2,78 litros de vinho por ano, o que representa um aumento de 30%. Pode parecer um crescimento robusto (e é), mas é ínfimo se comparado com um país europeu, como Portugal, onde a população bebe, em média, 60 litros por ano, ou 5 litros por mês. “O mercado de vinhos no país está apenas no começo”, diz Malizia. A falta de acesso a vinhos de qualidade há uma década e o envelhecimento da população são outros motivos que explicam a efervescência do setor. “Sempre tem gente bebendo mais vinhos em lugares com pessoas mais velhas”, diz Malizia. Até por uma questão de poder aquisitivo. Os vinhos que a Cellar vende, por exemplo, estavam na faixa de R$ 300 a R$ 6 mil, geralmente os mais caros vindo da região francesa da Borgonha. O máximo já vendido foi no valor de R$ 25 mil — o Musigny, do Frederic Mugnier, da mesma região. Com os R$ 15 milhões em caixa, a Cellar quer agora investir em mais divulgação e tecnologia e baratear os vinhos. Baratear, em termos: os vinhos mais baratos saem por R$ 130. A cada mês, a empresa vende 14 mil garrafas no país. 

Latas de vinho da marca Lovin | Foto: Divulgação

O vinho no país do boteco…

No período em que viveu no Vale do Silício, após uma temporada como executivo da XP, o gaúcho Eduardo Glitz tem uma recordação das entradas nos supermercados da Califórnia: cada um tinha um imenso corredor com latas de vinhos. A percepção virou um negócio brasileiro em julho de 2020, a partir de uma sociedade entre sete amigos, mesmo que no início houvesse sérias dúvidas da adesão à novidade num país tropical. “O brasileiro tem uma cultura menos formal, e o vinho é um produto formal”, diz Glitz. “Precisa de harmonização. Se tomar de qualquer jeito, podem dar risada, e até pouco tempo atrás era uma bebida high level, vista como nobre.” E foi com esse conceito que nasceu a Lovin: descomplicar o vinho no país do boteco e da latinha de cerveja. 

…sem complicar 

No início, os maiores varejistas do país achavam que a ideia do vinho na latinha poderia até valer a pena, mas por um preço abaixo de R$ 10. Glitz e os sócios bateram o pé. “Se colocar produto vagabundo, não queremos fazer”, lembra. A solução foi montar um site e direcionar as vendas inteiramente on-line. As plataformas digitais engrossaram e novos produtos foram lançados. Com a base de dados conquistada no e-commerce, descobriu-se um publico majoritário e fiel: 95% dos clientes da empresa são do sexo feminino. Um palpite? “A mulher, em geral, não quer tomar cerveja, porque estufa e dá barriga”, diz Glitz. “A lata é descomplicada, tem glamour, há muitas que postam no Instagram e é uma dose individual, não precisa abrir uma garrafa inteira de vinho.” A Lovin vende 120 mil latas por ano e hoje comercializa no varejo para redes como Natural da Terra, Sam’s Club, Mambo e St. Marché. Outras redes estão em negociação. Os vinhos são nacionais, das vinícolas Perini e São João, ambas da serra gaúcha. Os carros-chefes são os espumantes brut e o rosé frisante, o que confirma que a mulher costuma gostar de bebidas mais doces. Com os novos R$ 2,5 milhões em caixa, a meta é dobrar de tamanho neste ano. Glitz mostrou que o país do boteco também pode ser o da latinha do rosé

Gustavo Montezano, presidente do BNDES | Foto: Marcos Corrêa/PR

O calote cubano

O presidente do BNDES, Gustavo Montezano, lançou uma pergunta nesta semana para uma plateia restrita em São Paulo, em um jantar organizado pelo grupo Esfera Brasil, com nomes como Claudio Lottenberg, do Hospital Albert Einstein, Fábio Galindo, da Aegea Saneamento, e João Camargo, da 89 Investimentos. 

— Como você explica para o cidadão brasileiro um calote de Cuba de US$ 1,5 bilhão?  

O tema era o inconcebível empréstimo para Cuba levantar o Porto de Mariel. 

A plateia ficou sem resposta. 

Vale quanto pesa?

Mesmo que Elon Musk ajeite a casa e aumente os lucros do Twitter a partir de 2023, muitos analistas do mercado financeiro creem que o empresário pagou mais do que a empresa vale. O estrategista Michael Viriato, da Casa do Investidor, faz um bom paralelo com o megainvestidor norte-americano Warren Buffett: “Musk pode estar caindo na mesma armadilha em que muitos investidores caem: se empolgar mais do que deveria”. Buffett comprou a Kraft Heinz em 2015 e, quatro anos depois, confessou em entrevista que pagou demais pela empresa. 

33 vezes mais

Na segunda-feira, depois de duas semanas de especulação e reviravoltas, Musk acertou a compra da rede social por US$ 44 bilhões. Para efeitos de comparação, o Twitter lucrou US$ 169 milhões em 2021, enquanto a fabricante de carros elétricos Tesla lucrou US$ 5,5 bilhões — ou 33 vezes mais. Na última semana, em apenas 24 horas, a Tesla perdeu US$ 97 bilhões em valor de mercado. Os investidores da companhia têm receio de que o chefão diversifique demais os negócios e não priorize sua mina de ouro, a Tesla.  

bruno@revistaoeste.com 

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Revista Oeste