Dono de uma gráfica investigada pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral), o ex-deputado estadual petista Francisco Carlos de Souza recebeu, segundo três delatores da Lava Jato, R$ 2,6 milhões em propina da Petrobras para pagar dívidas da campanha de 2012 do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT).
Souza, conhecido como "Chicão" ou "Chico Gordo", é proprietário da gráfica Souza & Souza, alvo de ação na Justiça Eleitoral movida pelo PSDB em processo que investiga a campanha presidencial da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer em 2014. A suspeita é de que a gráfica seja uma empresa de fachada, sem capacidade de produção de material para campanha e emissora de notas frias.
Na Lava Jato, o doleiro Alberto Youssef, o acionista da construtora UTC Ricardo Pessoa e o ex-diretor financeiro da empreiteira Walmir Pinheiro apontaram um homem apelidado de "Chicão" como destinatário de transações para quitar despesas de campanha de Haddad, mas não indicaram o nome completo dessa pessoa.
Em depoimento à força-tarefa da operação, em julho de 2015, Youssef afirmou que realizou os repasses para "Chicão" a pedido de Ricardo Pessoa. O delator disse não se lembrar do nome completo dele, mas deixou um número de celular que bate com o de Souza, conforme apuração da Folha.
Posteriormente, Pessoa também fechou acordo de colaboração e confirmou as transferências. O valor, segundo ele, seria descontado da "conta corrente" de propinas devidas ao PT, abastecida com desvios da Petrobras.
Pessoa disse que "Chicão" foi indicado como destinatário dos valores pelo ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto.
Segundo o ex-diretor financeiro da UTC Walmir Pinheiro, a dívida da campanha de Haddad foi negociada diretamente com "Chicão".
Pinheiro relatou ainda que, em reunião, Vaccari "afirmou que teria uma dívida da campanha de Haddad de R$ 3 milhões com uma gráfica" e "perguntou se poderiam pagar essa dívida e abater o valor na conta corrente que mantinham, decorrente das obras da Petrobras".
Ante a concordância de Pessoa, Pinheiro negociou o pagamento e conseguiu reduzi-lo para R$ 2,6 milhões.
No celular de Pinheiro, o nome de "Chicão" estava registrado como "Chicao jvn" –em referência às iniciais do ex-tesoureiro Vaccari.
Youssef complementou o relato, dizendo que o total do suborno foi repassado de forma parcelada em 2013, em dinheiro vivo ou transferências bancárias feitas por uma das empresas de fachada do doleiro, a Empreiteira Rigidez.
Quebra de sigilo bancário mostra que em 10 de junho de 2013 a Empreiteira Rigidez transferiu R$ 160 mil para outra gráfica ligada a Souza, a LWC Artes Gráficas, que pertencia a sua ex-mulher e a um irmão dele à época dos repasses.
De acordo com o doleiro, essa era parte da quitação em favor de "Chicão".
VÁRIAS GRÁFICAS
Nos anos 70, Souza foi metalúrgico. Na década seguinte, foi fundador do PT e elegeu-se deputado estadual pelo partido. Está no ramo gráfico desde os anos 90, época em que foi dono de uma terceira gráfica, a King Graf.
Na prestação de contas de Haddad em 2012 estão registradas despesas no valor de R$ 354 mil com a LWC.
Naquele ano, a LWC declarou ter prestado serviços para comitês de seis partidos no Estado. Foram R$ 960 mil em despesas oficiais, conforme registro no TSE. Desse total, R$ 866 mil vieram do PT.
OUTRO LADO
A assessoria de imprensa do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), a defesa do ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto e a assessoria do PT negaram envolvimento em um suposto repasse de propina para quitar dívidas de campanha do chefe do Executivo paulistano.
A assessoria do prefeito apontou que a única despesa da campanha de Haddad de 2012 relacionada a Souza referiu-se à gráfica LWC, no valor de R$ 354 mil, que foi paga ainda no período eleitoral.
"Os serviços prestados pela LWC Editora Gráfica à campanha de Fernando Haddad, em 2012, foram todos quitados durante a campanha eleitoral, como atesta a prestação de contas registrada e aprovada no TRE [Tribunal Regional Eleitoral]", afirmou a assessoria.
Segundo o diretório nacional do PT, "todas as operações financeiras do PT foram realizadas estritamente dentro dos parâmetros legais e posteriormente declaradas à Justiça Eleitoral".
O criminalista Luiz Flávio Borges D'Urso, advogado do ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, disse que não há provas de que seu cliente tenha participado de um acerto para pagar dívidas de campanha de Haddad com recursos ilícitos, e isso ocorre porque Vaccari não cometeu os crimes apontados pelos delatores da Operação Lava Jato.
Procurado pela Folha desde segunda (26) por e-mail, telefone e por intermédio de seu antigo advogado, Luís Carlos, o empresário Francisco Carlos de Souza não quis se manifestar.
Em janeiro, a respeito da apuração do TSE sobre supostas irregularidades na campanha da chapa Dima-Temer em 2014, Souza disse que sua gráfica prestou os serviços pelos quais foi paga.
Para isso, segundo o empresário, sua gráfica terceirizou parte dos serviços.