domingo, 27 de fevereiro de 2022

'Guerra de percepções', por Guilherme Fiuza

 

Policiais em operação para dispersar manifestantes em Ottawa, capital do Canadá, no último fim de semana| Foto: EFE/EPA/AMRU SALAHUDDIEN


– O que você tá achando da guerra?


– Muito boa.


– Hein?! Não entendi. Você disse que está achando a guerra boa?


– Isso mesmo.


– Como alguém pode achar uma guerra boa?


– Achando.


– Mas guerra é violência.


– Às vezes é necessário.


– “Às vezes” quando?


– Quando o mal que está sendo combatido é maior que o mal da guerra.


– E existe isso no mundo hoje?


– Claro que existe.


– Explica melhor.


– Quando a sociedade começa a ser induzida por parte dos indivíduos a um caminho que nega a civilização, é preciso deter esse descaminho, do jeito que for.


– Complicado... E você quer dizer que isso está acontecendo agora?


– Quero, não. Estou dizendo.


– Mas não te incomodam as cenas de violência militar?


– Violência, não. Força.


– Pra quem está do outro lado dá no mesmo...


– Cada um colhe o que planta.


– O que esses que estão sendo atacados plantaram?


– Negacionismo.


– Hein? Onde você viu negacionismo nessa guerra?


– A guerra só está acontecendo por causa do negacionismo. E é para combatê-lo. Para impedir que a civilização se desvie da virtude.


– Onde você viu ofensiva militar contra negacionistas?


– Em vários lugares. Foi um cerco muito bem feito.


– Dá um exemplo.


– Gostei muito da cena das forças de segurança abafando e prendendo uma mulher que gritava contra a ciência.


– Não vi isso na guerra.


– Por isso você não entende a guerra. Não está prestando atenção.


– Estou, sim. Desde o primeiro ataque vi tudo que apareceu na TV e na internet.


– Nem tudo é informação visual. Tem a parte estratégica que você só compreende se ler bastante sobre o assunto.


– Claro. Você está aprovando a estratégia?


– Totalmente. Estou aplaudindo de pé.


– O que você destaca nas táticas de guerra que viu até agora?


– O bloqueio bancário.


– Teve isso?


– Tá vendo? Você não está acompanhando direito a guerra. Essa foi uma das principais medidas estratégicas da ofensiva.


– Realmente não notei. Como é essa medida?


– O comando nacional determinou a interrupção do acesso às contas bancárias dos que fossem flagrados como negacionistas. Uma asfixia dura, mas necessária. Pode crer que o avanço do negacionismo é pior do que qualquer medida dessa ofensiva.


– E muitos negacionistas foram flagrados pelo comando?


– Muitos.


– Que tipo de gente são eles?


– Vários. Com certeza uma boa parte são caminhoneiros.


– Caminhoneiros negacionistas?


– Isso.


– É, não estou mesmo acompanhando essa guerra direito. Não tinha visto nenhuma notícia sobre bloqueio bancário contra caminhoneiros ucranianos.


– Que ucranianos, companheiro? Como é que ia sair um comboio da Ucrânia até o Canadá?


– Que Canadá? Quem falou de Canadá? Estamos falando da guerra.


– Exatamente. A guerra do Trudeau contra os negacionistas. Estado de emergência, asfixia militar e armamento pesado contra os que ameaçam a higiene e a paz sanitária. Uma das maiores ofensivas das forças de segurança da história do país, exemplo pro mundo todo.


– E o Putin?


– Acho fraco. Sou mais o Trudeau.


Gazeta do Povo