
Conhecida como AKK e também apelidada de "mini Merkel", Kramp-Karrenbauer obteve 517 votos de 999 delegados que participaram do pleito no segundo turno. Na primeira rodada, ela já havia superado com 450 votos o adversário Merz, que então tivera 392 votos. Para ser eleito, o líder do partido precisa ser apoiado por mais da metade dos delegados na convenção.
— Eu li muito sobre o que e quem eu sou: "mini", uma cópia, apenas "mais do mesmo". Prezados delegados, eu venho à frente de vocês do jeito que sou, como a vida me fez, e tenho orgulho disso — disse Kramp-Karrenbauer ao congresso da CDU. — Não ha nada de "mini" em mim.
A nova líder da CDU foi nomeada secretária-geral do partido no início do ano, aparecendo como a favorita nas pesquisas. Popular em Berlim, ela tem um estilo despretensioso e a reputação de ser uma analista calma e uma política astuta. Admirada por muitos pelo seu apelo a diversos setores do partido, ela agradeceu seus adversários e os convidou a dividir o palco com ela num sinal de união partidária que foi aplaudido pelos delegados.
— Eu aprendi o que é liderar, e acima de tudo aprendi que a liderança é mais sobre ser forte por dentro do que ser barulhento por fora — disse ainda Kramp-Karrenbauer ao congresso da CDU, mencionando a sua experiência de governo regional. — A pergunta é se estamos dispostos a deixar nossa zona de conforto e ter a coragem de fazer o que a população deste país está esperando.

Sua grande força também é sua maior desvantagem. Ela é leal a Merkel e é vista como alguém que irá reproduzir em grande escala o estilo e as políticas da chanceler federal. Nos últimos anos, defendeu abertamente a política migratória da chanceler, que permitiu que mais de um milhão de refugiados entrassem na Alemanha, e foi alvo de fortes críticas da oposição.
A decisão dos delegados é intepretada como uma escolha pela continuidade que poderá fortalecer a atual coalizão de Merkel com o Partido Social-Democrata, que esteve na corda bamba algumas vezes nos últimos meses. Além de enviar um forte sinal às mulheres alemãs, que poderão ver outra mulher no comando do país num futuro próximo.
— Ela é capaz de manter os democratas cristãos como um partido centrista que inclui pessoas de vários lados do espectro — disse Daniel Günther, governador de Schleswig-Holstein que votou em Kramp-Karrenbauer ao "The New York Times". — Para mim, significa não ignorar nenhuma das várias alas (do partido), incluindo aquelas em favor de políticas sociais, do mercado econômico ou conservadoras.
O principal adversário de Kramp-Karrenbauer, Friedrich Merz era uma figura poderosa na CDU na década passada, mas deixou a política após se desentender com a chanceler. Desde então, o advogado e empresário milionário de 63 anos — que mantém fortes laços com os EUA — construiu uma carreira no setor privado e passou a trabalhar apara a companhia americana Blackrock. Embora seja um duro crítico de Donald Trump, o empresário defende relações mais próximas com Washington e Paris, além do fortalecimento de entidades como a Otan e a União Europeia. Na sua campanha, prometeu reduzir pela metade o apoio popular à Alternativa para a Alemanha (AfD), de ultradireita, que vem ganhando espaço na cena política alemã.

Já Jens Spahn, visto como um nome jovem e cheio de energia, mas com poucas chances de vencer, ficou em terceiro lugar. Despontando na disputa como um jovem ambicioso, o ex-banqueiro de 38 anos já foi descrito por Wolfgang Schäuble, presidente do Parlamento alemão, como "uma das grandes esperanças para o futuro do partido". No entanto, seu estilo também lhe rendeu alguns desafetos na legenda. Gay, católico e conservador ferrenho, Spahn é visto por muitos na CDU como uma figura divisiva. Durante a crise migratória, criticou abertamente a política de Merkel, afirmando que "a CDU talvez tenha exagerado na abordagem humanitária da questão".
Merkel: 'Foi uma honra'

Mais cedo, no discurso de despedida do cargo de líder da CDU, Angela Merkel expressou gratidão pela oportunidade de liderar o partido por 18 anos, 13 deles como chanceler, durante os quais dominou a política europeia e se consolidou como a principal gestora de crises da região.
— Foi um grande prazer para mim, foi uma honra — disse ela, antes de ser ovacionada por quase dez minutos e lutando para segurar as lágrimas.
No discurso, Merkel descreveu os desafios que a Alemanha tem pela frente:da mudança rápida da tecnologia às mudanças climáticas e à tendência global de abandonar o multilateralismo para defender os interesses nacionais.
— Em tempos como estes, vamos defender nossas visões progressistas, nosso modo de vida, tanto em casa como no exterior — ressaltou a chanceler. — A CDU em 2018 não deve olhar para trás, mas olhar para frente. Com novas pessoas, mas com os mesmos valores.
Após quase duas décadas à frente da sigla, Merkel entrega nesta sexta-feira a liderança do partido conservador, na votação que pode ser decisiva para o rumo da Alemanha no mundo. A chanceler, no entanto, diz que pretende cumprir o mandato, até 2021. Isso dependerá em grande parte, porém, de seu sucessor à frente da CDU.
Diante da pressão do partido de extrema-direita Alternativa para Alemanha (AfD) e do Partido Verde (centro), a centro-direita alemã enfrenta um cenário de declínio eleitoral e precisa de um novo impulso. Ao lado do aliado bávaro CSU (União Social-Cristã), a CDU tem de 26% a 28% das intenções de voto, de acordo com as pesquisas. Nas legislativas de setembro de 2017, a coalizão recebeu 33% dos sufrágios.
Os social-democratas, que integram a grande coalizão de governo da Alemanha, enfrentam uma grave crise eleitoral. As perspectivas eleitorais do AfD — a terceira força política no Parlamento alemão após expressivo resultado em setembro do ano passado — ganharam força com o medo da imigração estimulada pela política de Merkel, que aceitou abrir as fronteiras do país e receber mais de um milhão de sírios e iraquianos entre 2015 e 2016.
Para os aspirantes à liderança da CDU, o principal objetivo é recuperar os antigos eleitores, que agora preferem a extrema-direita. Kramp-Karrenbauer aposta na proposta de repatriar os refugiados condenados por algum crime, inclusive os sírios. Merz questionou o direito de asilo na forma como está definido na Constituição alemã.
O Globo, The New York Times e Reuters