A reforma da Previdência é considerada a medida mais importante dos primeiros 100 dias. Por se tratar de um tema polêmico e que mexe com a vida de muita gente, sua aprovação é difícil no Congresso. Integrantes da equipe econômica se articulam em várias frentes para derrubar resistências às mudanças. Estão nos planos aprovar uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para retirar da Carta dispositivos que o governo pretende alterar. Assim, todas as mudanças poderão ser implementadas via projetos de lei, que não exigem quórum qualificado (308 votos em dois turnos na Câmara dos Deputados e no Senado).
Em outra frente, o novo governo pretende ganhar o respaldo de especialistas em Previdência antes de enviar propostas ao Congresso. Criou um conselho consultivo de notáveis que tomarão conhecimento de antemão de todos os pontos em debate. Integrantes do grupo, como o ex-presidente do Banco Central (BC) Armínio Fraga e o economista Paulo Tafner, encaminharam sugestões à equipe do presidente eleito.
Também faz parte da estratégia do governo negociar previamente com líderes da categoria de servidores com influência no Parlamento, como procuradores, auditores fiscais, policiais federais. Assim, todos se sentirão co-autores da reforma, explicou uma fonte ligada à equipe de transição.
Prioridades de Moro
De uma das principais estrelas de seu governo, o futuro ministro da Justiça Sergio Moro, Bolsonaro receberá o texto do decreto para ampliar o prazo de posse de arma. Mas o juiz da Lava-Jato tem outras prioridades. Uma de suas metas no início de governo será reestruturar as equipes da Polícia Federal que estão à frente das investigações da Lava-Jato em São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba e Brasília. O ministro entende que a Lava-Jato avançou muito, mas pode ser ainda mais efetiva com aumento de policiais e da estrutura de investigações que, nos últimos meses, pareciam em declínio. Ele promete não dar trégua a políticos, empresários, lobistas e servidores públicos já fisgados em etapas anteriores da Lava-Jato.
Moro espera aprovar no Congresso, ainda em fevereiro, alguns projetos de lei que considera importantes para o combate à criminalidade. Entre as propostas estão uma nova lei que define com clareza o cumprimento de pena a partir de condenação em segunda instância; a prisão imediata para quem for condenado em tribunal de júri; a ampliação de prazos de prescrição de crimes e a regulamentação do lobby. O pacote também prevê restrições na progressão da pena de quem comete homicídios.
Na saúde, em meio à recorrente falta de recursos e os problemas de gestão, o futuro ministro Luiz Henrique Mandetta prometeu começar pelos hospitais federais. Propôs mudanças na administração dos seis hospitais federais mantidos na cidade do Rio de Janeiro, que, segundo ele, precisam de um choque de gestão.
Revisão do Mais Médicos
Mandetta também prometeu intensificar o combate ao surto de doenças como sarampo após a migração em massa de venezuelanos ao Brasil e melhorias na atenção básica e nas equipes de saúde da família. O ministro também afirmou que vai rever o Mais Médicos para acabar com distorções e as “improvisações” do programa federal.
O teste do Congresso virá em fevereiro, quando serão eleitos os presidentes das duas Casas. Na Câmara, onde seu partido, o PSL, já deu mostras públicas de desentendimento e falta de coesão, por enquanto, dois grupos medem forças para conquistar o comando. De um lado, cinco parlamentares com candidaturas avulsas firmaram um pacto de apoio mútuo em caso de segundo turno. De outro, Rodrigo Maia (DEM-RJ) costura uma ampla aliança, inclusive com participação de partidos de oposição. Para que a eleição não resulte em uma derrota política, o PSL não terá candidato próprio. Por tratar-se de uma questão delicada, um jogo de poder importante para a governabilidade, a legenda ainda não conseguiu traçar uma estratégia para a disputa.
A política externa é outra área em que Bolsonaro promete mudar os rumos. A transferência da embaixada do Brasil de Tel Aviv para Jerusalém foi anunciada e provocou polêmica. A relação com o Mercosul não está clara. O futuro presidente deu sinais de que tem outras prioridades nas relações internacionais, com o já definido alinhamento com os Estados Unidos.
Veja as prioridades de Bolsonaro em cinco áreas para os primeiros cem dias de governo:
Reforma da Previdência
O governo quer aprovar emenda à Constituição que retira da Carta dispositivos sobre o tema. Com isso, aprovaria mudanças sem precisar de 308 votos. Um “grupo de notáveis’’ deve opinar sobre as propostas, antes de serem levadas ao Congresso.
Segurança Pública
Uma das primeiras medidas será aprovação no Congresso de um pacote de ações para endurecer o combate ao crime organizado. Outra prioridade será a reestruturação de equipes que atuam na Lava-Jato em Curitiba, São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro.
Crise no Saúde
O governo deve mudar a gestão de seis hospitais federais do Rio, antes de propor alterações aos estados. Também devem ser adotadas medidas relacionadas à atenção básica e ações urgentes de prevenção ao surto de sarampo na fronteira com a Venezuela.
Disputas na Câmara e no Senado
O teste do Congresso virá em fevereiro, quando serão eleitos os presidentes das duas casas. Para evitar o risco de derrota na Câmara, o PSL não terá candidato próprio. No Senado, Renan Calheiros (MDB-AL) aparece como candidato de oposição
Novo rumo da diplomacia
Além da definição sobre a mudança da embaixada do Brasil em Israel para Jerusalém, o novo governo deve indicar o caminho das relações com parceiros tradicionais. No radar, os países do Mercosul e o alinhamento com os Estados Unidos.
Bruno Góes, Geralda Doca, Jailton de Carvalho e Natália Portinari, O Globo