André de Souza, O Globo
Há hoje, no Supremo Tribunal Federal (STF), 33 habeas corpus aguardando análise do plenário ou de uma das duas turmas e que foram liberados para julgamento antes do pedido da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Alguns estão prontos para serem apreciados desde 2009 e 2010, mas, até hoje, não foram julgados. São casos de anônimos e famosos, como o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci.
O STF tem cerca de 5 mil habeas corpus em tramitação, dos quais 141 aguardam julgamento no plenário ou nas turmas. Entre esses, há pedidos mais recentes ou mais antigos que o apresentado pela defesa de Lula. Também há aqueles cujo julgamento já começou, mas foi interrompido ou ainda não terminou. Nos 33 mais antigos, há casos em que o relator, por decisão individual, negou o pedido da defesa, ou não foi tomada uma decisão sequer até agora.
Em 14 de janeiro de 2009, chegou um pedido para suspender uma ação penal no Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG). Em fevereiro de 2009, a relatora, ministra Cármen Lúcia, que hoje preside o STF, negou liminar ao réu. Em outubro daquele ano, o caso foi levado para julgamento da Primeira Turma do STF, mas o ministro Ayres Britto, hoje aposentado, pediu vista. Ele devolveu o caso para julgamento apenas em 22 de outubro de 2013. De lá para cá, nada ocorreu. Nem o STF julgou o caso, nem a defesa insistiu no pedido. Em 2015, o réu morreu assassinado. No andamento do processo na Corte, não há nada, porém, que indique isso.
Além dos anônimos, há alguns famosos. É o caso do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci, preso em Curitiba há um ano e meio, que protestou contra o fato de o recurso de Lula ter “furado a fila”. O habeas corpus até poderia ter sido julgado antes pelo plenário do STF. Mas, em novembro do ano passado, a própria defesa pediu a retirada do caso até a volta do ministro Ricardo Lewandowski, que estava de licença médica. Lewandowski voltou. Os advogados de Palocci fizeram em 2018 vários pedidos para que o habeas corpus seja julgado logo, mas isso ainda não ocorreu.
Outro caso famoso é o do ex-presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) José Maria Marin. Mas o habeas corpus que pede ao governo brasileiro um pedido de extradição à Suíça, onde estava preso na época, foi apresentado por um advogado que não integra sua defesa. Em fevereiro de 2016, o ministro Marco Aurélio Mello negou liminar. Em abril de 2017, liberou o caso para a pauta do plenário, onde ainda não foi analisado. Enquanto isso, Marin foi extraditado para os EUA.
Há ainda um pedido da defesa do ex-médico Roger Abdelmassih, condenado a 278 anos de prisão pelo estupro de pacientes em sua clínica de reprodução assistida. O HC foi liberado pelo ministro Dias Toffoli para a Segunda Turma em abril do ano passado, mas não foi julgado. Enquanto isso, Abdelmassih vem colecionando vitórias no próprio STF e em instâncias inferiores. Em outro habeas corpus, o ministro Ricardo Lewandowski garantiu a Abdelmassih prisão domiciliar.
Habeas corpus servem para garantir o direito de ir e vir de uma pessoa. Mas, muitas vezes, são usados com outros fins. Houve até mesmo um para tentar anular o processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. O ministro Marco Aurélio negou a liminar.
Em outubro de 2017, liberou o caso para julgamento no plenário do STF, o que ainda não ocorreu.
Dos 33 habeas corpus prontos para julgamento, há 12 no plenário, incluído o de Palocci.
Outros 14 estão na Primeira Turma, e sete na Segunda. Em três HCs, houve decisão nas turmas, mas apenas deliberaram que eram casos para serem analisados no plenário, onde não foram julgados.
PANO DE FUNDO: PRISÕES APÓS 2ª INSTÂNCIA
O plenário é composto por todos os 11 ministros do STF e analisa habeas corpus quando há divergências entre as duas turmas sobre o assunto discutido. As turmas, por sua vez, têm cinco ministros cada, ficando de fora apenas a presidente da Corte, Cármen Lúcia. Ela define a pauta do plenário.
Em 21 de março, após pedidos para pautar ações que reanalisam a prisão após condenação em segunda instância, Cármen Lúcia marcou para o dia seguinte o julgamento do pedido de Lula. O habeas corpus diz respeito somente ao ex-presidente, mas tem como pano de fundo a discussão sobre o início da execução da pena: se ela já pode ocorrer na segunda instância, se após análise do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que funcionaria como uma terceira instância, ou se somente depois do trânsito em julgado, quando não há mais possibilidade de recurso.
O julgamento não foi concluído e será retomado na próxima quarta-feira. Em entrevista veiculada pela rádio “Jovem Pan” em 23 de março, Cármen Lúcia negou que Lula tenha recebido tratamento especial. Questionada por que o caso de Lula foi para a “dianteira da fila”, respondeu:
— Não foi para a dianteira. As turmas julgaram dezenas de habeas corpus que entraram depois.
Há um grupo de 18 HCs liberados recentemente pelo ministro Marco Aurélio para julgamento na Primeira Turma, ou seja, depois de Lula. Mas ficaram alguns anos parados no STF.
Marco Aurélio costuma ser o ministro que mais libera habeas corpus para análise em conjunto com seus colegas. Assim, dos 33 que esperam julgamento há mais tempo que Lula, 13 são de sua relatoria.
Um dos casos com Marco Aurélio é de um preso condenado por estupro, que chegou ao STF em 3 de agosto de 2009. Em agosto de 2015, o ministro o liberou para julgamento no plenário. Em abril do ano passado, a Defensoria Pública da União alegou o princípio constitucional da duração razoável do processo para que fosse dada prioridade ao caso, tendo em vista que ele não havia sido analisado ainda e o condenado continuava preso.
Em resposta, em junho de 2017, Marco Aurélio deu um despacho em que disse que era de Cármen Lúcia a atribuição de incluir o habeas corpus na pauta.