sexta-feira, 29 de abril de 2016

Romero Jucá: "Faremos um governo de salvação"

Gisele Vitória - IstoE



O senador Romero Jucá (PMDB-RR) , 61 anos, é hoje o principal articulador político de Michel Temer. Cotado para assumir o Ministério do Planejamento em um eventual novo governo, se o impeachment da presidente Dilma Rousseff for aprovado, o economista pernambucano sorri sobre as possibilidades lançadas diante de sua participação num futuro ministério.


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FUTURO '
'O maior desafio do provável novo governo não será o impeachment. Será o dia seguinte''


“Jogo em qualquer posição, de goleiro a ponta-esquerda”, diz. “Sou o presidente do PMDB. Não há nada definido. Tem que ver o que vai acontecer.” No Palácio do Jaburu, em Brasília, ele foi o único aliado de Temer a participar da conversa do vice-presidente com o ex-presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, favorito para assumir o ministério da Fazenda. Dias antes, em Foz de Iguaçu (PR), durante o Fórum Empresarial do Lide, ele negociava com políticos do PSDB, tranquilizava empresários e ouvia economistas.

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''Demérito não é ser investigado, é ser condenado. A Lava Jato 
vai continuar, mas não pode ser o cerne do governo''


Lá, numa roda com um grupo de empresários, Jucá acalmava os que se preocupavam com os riscos de Temer cair no processo no TSE que investiga a chapa eleita. Cuidadoso para não se precipitar no discurso, Jucá já é tratado como ministro. 

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''Temos que resgatar a credibilidade. Joaquim Levi falava e ninguém acreditava''



Parece fácil para a oposição conduzir as próximas semanas antes da votação do impeachment no Senado. Que problemas o sr. vê para a concretização de um eventual governo Temer?

O grande desafio da oposição não é em si o processo de impeachment. O desafio é o dia seguinte. O impeachment já é algo que está consagrado na cabeça da maioria dos brasileiros. Vai ter resistência, bagunça, vai ter movimentação de setores ligados ao PT. Haverá este preço. Mas o maior problema da oposição não é esse. O problema é o que fazer no dia seguinte e em que velocidade fazer. Tudo depende disso para termos o respaldo da população. 

E o que fazer no dia seguinte? 
Temos discutido muito. A escolha do ministério é de Michel Temer. Mas, independentemente dos nomes, temos que formar um ministério que tenha como pré-requisito número 1 ter uma base política sólida, congressual, estável. Sem base, não adianta fazer ações na economia porque haverá dúvidas no mercado se essas ações terão sustentabilidade política. A política virou um desastre. O algoz da Dilma foi a política. Não foi só a economia. O ministério que o Michel formará tem que demonstrar isso.

Henrique Meirelles trará essa base? Como o governo demonstraria?
Michel não fechou convite para ninguém. O ministério tem que ser consistente politicamente, formado por gente competente. Michel vai ter um governo de dois anos. Não vamos ter 200 programas. É um governo de recuperação nacional. Faremos um governo de salvação. Não será um governo de quatro anos, estruturado. Faremos um governo que terá os pressupostos básicos para, em 2018, a gente ter uma eleição calcada na política. O que aconteceu, na prática, foi um descredenciamento da política perante à sociedade. Só que, fora da política, não tem solução. Não adianta ir para uma eleição em 2018, com Dilma do jeito que está. A eleição seria a da anti-política. Seria a eleição da bravata, do outside da política. Ora, como você faz uma eleição onde você nega a política e no outro dia tem que fazer ajustes políticos em um congresso? Fazendo negação da política? Não tem como dar certo. Seria uma situação do Collor piorada. Temos que recuperar a política e reorientar o país. Em 2018, as eleições serão parecidas com a de 1989.

Temer será candidato em 2018?
 Temer não será candidato em 2018. Ele diz isso o tempo todo.

Qual será o maior desafio do provável governo Temer?
O desafio do País é recuperar alguns pressupostos que, se não existirem, não conseguimos dar a volta na economia. Temos que reerguer pilares. Credibilidade do governo, perdida, é um deles. Guido Mantega falava e ninguém acreditava. Joaquim Levi falava e ninguém acreditava. Segundo ponto: garantir a segurança jurídica. O governo foi intervencionista em equações econômicas financeiras de concessão que já estavam pactuadas. Começou a se meter. O terceiro ponto: criar uma previsibilidade para a economia. Se a economia não tiver uma leitura confiável, não cresce. A economia vive de expectativas. O Brasil é um País capitalista. Busca-se resultado. Ninguém entra para ter prejuízo com o governo. Essa visão o governo Dilma nunca teve.

E Lula?
O governo Lula teve um pouco. Lula não se metia, não queria tabelar lucro, ganho. Não fazia concessão nivelando por baixo. Se o governo não consegue dar uma previsibilidade confiável, o que acontece? Cada agente constrói o seu próprio cenário. Qual é a tendência de quem faz isso sozinho? É ser mais conservador do que a realidade. E assim todo mundo trava. Ninguém arrisca. Ninguém compra. Ninguém contrata. É um círculo vicioso. A insegurança agrava o processo de reação da economia, que vai para o buraco.

 Isso aprofundou a crise de governabilidade?
Quando se perdeu receita, perdeu a confiança,  a governabilidade foi para o espaço. O governo está com um prejuízo enorme. O governo está com R$ 100 bilhões de dívida por redução de arrecadação só nesses três meses. Gosto do (ministro Nelson)Barbosa. Ele entrou querendo fazer alguma coisa, mas só levou porrada do PT. Os caras são dogmáticos. A economia não pode ser dogmática. 

Como o sr. vê o fator Lava Jato    em um eventual governo Temer?
O fator Lava Jato tem duas vertentes. Toda a operação foi extremamente positiva. A Lava Jato mudou o paradigma da política no Brasil. Ele mudou, com toda essa confusão que se instalou, a relação entre partido político, candidato e empresas. Ou seja, o financiamento de campanha, o gasto de campanha, tudo isso está sendo passado a limpo. Isso é salutar. Tem uma aura de sanidade. A segunda vertente é que houve problemas operacionais ou pontuais de desgaste, mas isso não pode ser o cerne da ação política do País. A Lava Jato vai ter que ser fortalecida e agilizada.

A título de acalmar o País, o governo Temer abafaria a Lava Jato?
 O governo Temer vai apoiar a Lava Jato. Queremos rapidez na operação. Não dá para ficar uma nuvem negra sobre todos os políticos do Brasil. Independentemente de ter ou não culpa. Está todo mundo sob desconfiança.

O  sr. é investigado. 
Todo mundo. Eu estava num almoço e prestei as informações. E daí? Não vieram de volta e disseram: ‘Explica isso daqui.’ Não provaram nada. Qualquer um que foi mencionado é investigado. (Jucá aparece na delação do ex-diretor de abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa. Foi citado entre 27 políticos que seriam beneficiários em desvios de contratos da estatal. Em depoimento à PF, Jucá admitiu ter estado uma vez com o empreiteiro Ricardo Pessoa, da UTC, a fim de pedir doações para as eleições de 2014 em Roraima). Na democracia, do presidente ao menor funcionário público, todos devem explicação. O demérito não é ser investigado, é ser condenado. Mas a investigação tem que ser rápida e definir quem tem responsabilidade. A Lava Jato vai continuar, mas não pode ser o cerne do governo. Quem for culpado,  responde e está fora do jogo. Mas isso não é o eixo central do País.

Como o sr. explicará à imprensa internacional que não vai ser golpe?
Michel me pediu e vou falar com a imprensa internacional. Vou explicar e mostrar o rito. Mandei levantar todos os pedidos de impeachment que o PT fez. São mais de 50. É um instrumento legitimado pelo PT.

O sr. foi líder do governo no Senado. Por que o sr. rompeu com o governo?
Rompi no começo de 2014, quando anunciei que o governo estava indo por um caminho equivocado na economia. Anunciei ao Michel que não ia votar nele em 2014. Votei no Aécio (Neves). Eu já havia rompido com o governo na convenção do PMDB e me posicionei contra o acordo com o PT. Participei do encontro com Lula, em São Paulo, junto com Renan, Jader, Eunício. Fomos ao Lula e dissemos que, com a Dilma, seria difícil ganhar a eleição e que ele estaria autorizado pelo PMDB a dizer no PT que só haveria coligação se ele, Lula, fosse o candidato. Lula disse que estava preocupado e que, se o projeto estivesse em risco, ele entraria como candidato para corrigir o rumo. A história do impeachment não é uma história abrupta.

É uma crônica anunciada?
O impeachment é uma crônica anunciada. Não caiu de paraquedas. Esse desastre do governo foi construído meticulosamente. Uma posição ideológica equivocada desaguou no intervencionismo econômico, no corporativismo, e numa visão autoritária da presidente. O (ministro do STF) Dias Toffoli diz: ‘A Dilma não tem dúvida, só certezas’. Ela acha que é a dona da verdade.

Isso contou para o impeachment?
 Acho que sim. Em política, o resultado do produto é o processo. A forma dela foi desastrosa. Ela não quis ouvir. Ela não se deu ao trabalho – e olha que a gente ajudou. Eu ajudei o tempo todo, mesmo discordando. Eu me reunia com Guido (Mantega), me reunia com Paulo Bernardo, me reunia depois da eleição com Levy, me reunia com Nelson Barbosa. Em 2014, após a eleição, eu não tinha mais posição no governo, mas era relator do orçamento.

E como era essa ajuda?
Em 2014, eu dizia o tempo todo para a área econômica: não vai fazer superávit, vocês estão equivocados, melhor falar a verdade dos números. 

E as pedaladas prosseguiam?
Sim. Em 2014, o Guido me mandou uma proposta de ajuste de superávit que dizia que ia ter R$ 10 bilhões de superávit no final de 2014. Eu fui ao Guido e falei: ‘Guido, não vai ter superávit’. ‘Vai ter, sim’, ele dizia. Eu insistia: ‘Guido, deixa eu te falar, vocês estão errados.’ Eles queriam abater desoneração, uma série de coisas. Como relator do orçamento, eu mudei o texto que eles me mandaram.

O que o sr. mudou?
Eles escreveram e enviaram assim: ‘ … do superávit primário, poderá ser abatido isso, isso isso..’. Se o texto ficasse assim, significaria que o governo teria obrigatoriamente que ter superávit. Mas não teria. Então, eu, por minha conta, substituí a palavra no texto: ‘Do resultado  (que poderia ser superávit ou déficit) poderá ser abatido isso, isso..’ Fiz isso. E  aprovei, no pau, mesmo contra o governo, mesmo sem ter votado na Dilma. O governo já não tinha feito a questão fiscal, já estava desmoralizado. Se o governo manda isso para o Congresso e não tem base política naquele momento para aprovar o orçamento, seria uma leitura externa terrível. Então eu me meti. Briguei com o PSDB, briguei com PT, com todo mundo, encarei os caras e aprovei a condição que deu, no fim, déficit. 

 Seria injusto, então, o sr. ser chamado de conspirador, traidor?
 Não me incomoda porque são uns babacas. Estou muito tranquilo com isso. Na área econômica, ninguém ajudou mais do que eu.