sábado, 30 de abril de 2016

Brasil patina porque gasta muito e mal, indica estudo do Credit Suisse

Erica Fraga - Folha de São Paulo


A combinação entre gastos públicos elevados e pouco eficientes tem freado o crescimento do Brasil.

É o que indica um estudo do banco Credit Suisse que analisa o patamar das despesas do governo de diferentes países, a expansão de suas economias e os resultados alcançados por suas políticas.

Cálculos feitos pela Folha com base nos dados levantados pelo banco mostram que, nos países emergentes e em desenvolvimento que cresceram 5% ou mais entre 1999 e 2014, em média, o governo geral teve gastos anuais médios de 25% do PIB (Produto Interno Bruto).

Já nas nações com expansão média menor do que 3,5%, as despesas do governo geral foram o equivalente a uma média de 33,3% do PIB.

É nesse grupo de pior desempenho que o Brasil se encontra. Entre 1999 e 2014, a economia brasileira teve expansão de 3,1% ao ano, com gastos do governo em torno de 38% do PIB.

Baixa eficiência

A baixa eficácia das despesas efetuadas pelo governo brasileiro ajuda a explicar o resultado ruim do país.

Ou seja, o Brasil gasta muito, mas gasta mal.
A pesquisa do Credit Suisse mostra que o Brasil é o 28º entre 39 países em eficiência dos gastos públicos. Em áreas como educação e saúde, a situação é ainda pior -a posição brasileira cai para 33ª e 34ª, respectivamente.

Os cálculos do banco usam uma metodologia que contabiliza os resultados auferidos pelos gastos dos governos em seis diferentes áreas.

Para avaliar a eficiência da administração pública, por exemplo, a instituição confrontou o consumo do governo como proporção do PIB com indicadores de corrupção, burocracia, qualidade do Judiciário e informalidade.

Em saúde, foram analisados os gastos totais do setor público na área e os índices de mortalidade infantil e expectativa de vida ao nascer.

A área em que o Brasil se saiu melhor em relação aos outros países foi distribuição de renda (com base no índice de Gini). Uma leitura disso é que o país tem avançado na redução da desigualdade gastando relativamente menos do que outros países.

Ou seja, as políticas desenhadas têm sido eficientes.

Nas seis áreas, o banco analisou todos os países para os quais os mesmos dados estavam disponíveis.

"Os dados indicam que o setor público do Brasil é, de forma geral, pouco eficiente, considerando todos os gastos que têm sido feitos para conseguir certos resultados", diz o economista Leonardo Fonseca, do Credit Suisse.

Outros dois cálculos de eficiência do setor público feitos pela instituição usando diferentes metodologias confirmaram a posição desfavorável do Brasil em relação a outros países emergentes e desenvolvidos.

crise fiscal

A discussão sobre a necessidade de aumento da eficiência do gasto público no Brasil tem ganhado força, impulsionada pela severa crise fiscal que enfrenta o governo.

"Até 2011, 2012, parecia que o país não tinha restrição orçamentária. O governo só aumentava o gasto, como se os recursos não fossem escassos", afirma Paulo Coutinho, economista do Credit Suisse.

O forte aumento dos gastos do governo gerou um rombo nas contas públicas, que contribuiu para a crise econômica. Com o aprofundamento da recessão, a arrecadação tem caído, piorando ainda mais a situação fiscal.

SEM RUMO, POLÍTICAS FAVORECEM MENOS POBRES

O aumento da frequência em creches públicas no Brasil tem sido maior entre crianças das classes média e alta do que entre as de famílias mais pobres.

Entre os 10% mais ricos, o percentual de crianças atendidas saltou de 1% para 6% do total entre 2001 e 2014.

Na classe média (que engloba famílias entre o 4º e o 7º decil da distribuição de renda), a cobertura, que em 2014 variava de 20% a 21%, em 2001 era de 5% a 7%.
No caso das crianças que estão entre os 10% mais pobres, a fatia das que frequentam creches públicas saltou de 6% para 14% do total.

Os dados levantados pela equipe do economista Ricardo Paes de Barros, titular da Cátedra Instituto Ayrton Senna, no Insper, e colaborador para a área social de um eventual governo Michel Temer, indicam que, se a
tendência continuar, o desequilíbrio que existe na distribuição de vagas crescerá.

A expansão das vagas em creches públicas é um exemplo de gasto social que aumentou no Brasil, mas corre o risco de não atingir seu principal público-alvo.

Políticas pouco eficientes acabam não contribuindo para o desenvolvimento econômico do país. Por isso cresce o coro de economistas que defendem a necessidade da criação de mecanismos para avaliação da
eficiência dos gastos governamentais.

Esse debate ganhou atenção por causa da sinalização de Temer de que adotará medidas nessa direção caso assuma o governo.

A principal pergunta a que avaliações devem responder, segundo pesquisadores, é: o objetivo esperado tem sido atingido? O problema é que, muitas vezes, nem o objetivo de certas políticas é claro.

"Hoje no Brasil uma pessoa tem uma ideia de política, ela é implementada, e a avaliação é feita contando só o número de beneficiários. Isso não é avaliação de impacto. A sociedade precisa entender isso", diz Naercio
Menezes Filho, coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper.

O economista Paulo Coutinho, do Credit Suisse, ressalta que o Brasil se destaca na produção de dados. "Falta utilizá-los para fazer avaliações muito mais frequentes."

Esse é o caminho, diz, para aumentar a eficiência do gasto público no país.

A partir das avaliações, seria possível decidir que políticas precisam ser focalizadas em grupos sociais mais vulneráveis, assim como áreas em que o setor privado pode atuar de forma mais eficiente do que o governo.