domingo, 1 de outubro de 2017

Padrão de vida do brasileiro só vai se recuperar em cinco anos

Douglas Gavras - O Estado de S.Paulo 


PIB per capita do País só deve retornar 

ao patamar pré-crise entre 2021 e 2023;

hoje, País está atrás do México 

e da Tailândia



O brasileiro vai ter de esperar mais cinco anos para conseguir recuperar o padrão de vida que tinha antes da recessão. Com a crise prolongada, o Produto Interno Bruto (PIB) per capita, medida que serve de referência do nível de riqueza da população, só deve retornar ao patamar de 2013 entre 2021 e 2023.
A expectativa é que o PIB per capita alcance R$ 33,5 mil, em números deflacionados, em quatro ou cinco anos, superando o patamar de 2013, de R$ 33,4 mil, segundo a consultoria 4E.
José Clemente
Hora ruim. O comerciante José Clemente, que deixou de vender relógios e eletrônicos novos para apenas consertá-los  Foto: Nilton Fukuda/Estadão
A recessão fez com que os ganhos no período de forte crescimento do País regredissem. Como reflexo da perda de renda e alta do desemprego, o brasileiro freou o consumo, adiou planos e aprendeu a viver com menos.
O relojoeiro José Clemente da Silva, de 56 anos, sentiu que a crise havia se agravado quando os clientes mais fiéis da loja na região metropolitana do Recife passaram a procurá-lo para consertar aparelhos, em vez de comprar novos. “Acabei diminuindo o negócio. Troquei o ponto por uma banca em que só faço reparos de relógios e eletrônicos. Cada um se vira como pode.”
No período de vacas magras, a compra de equipamentos novos foi substituída pela manutenção de aparelhos antigos. Enquanto a comercialização da linha branca, de televisores e de eletroportáteis caiu entre 10% e 21% nos anos de crise, segundo a Eletros (associação do setor), os reparos de aparelhos eletroeletrônicos subiram quase 8%, de acordo com a Abrasa. 
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Para Bruno Lavieri, da 4E, um dos fatores que afetaram o desempenho do País foi a queda nos investimentos nos últimos anos e os aportes mal feitos antes da crise, em setores que nem existem mais. “O PIB potencial também sofreu com o baixo crescimento da População Economicamente Ativa (PEA).”
O advogado Bruno Porto, de 46 anos, lembra do dia em que contou para a filha de dez anos que ela teria de mudar para uma escola com uma mensalidade menor. “A gente dizia que era um sacrifício, mas que ela iria estudar mais perto da casa nova – menor que a antiga. Foram dois anos em que a nossa vida mudou por completo, perdi o emprego, vendemos um dos carros e fui fazer bicos. No começo do ano, consegui outro emprego, mas que pagava menos da metade do anterior. Foi difícil, mas a gente se acostuma com tudo.”
A economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif, concorda que ainda será um longo caminho até que o PIB per capita do Brasil recupere o patamar pré-crise. “Ainda assim, a atual inflexão da economia é emblemática e deverá causar impacto na eleição de 2018”, afirma.
“O Brasil precisa correr muito para não ficar para trás. A crise de 2015 e 2016 foi quase que exclusivamente nossa, diferentemente de 2008, quando a crise foi generalizada”, diz Lavieri.
Crise particular. Quando se leva em conta o crescimento da renda, países emergentes de porte semelhante ao do Brasil registraram avanços entre 2013 a 2016 em comparação aos quatro anos anteriores, de 2009 a 2012. A economia brasileira teve o pior desempenho segundo esses critérios. 
“O Brasil está muito aquém de outros países. Segundo projeções para 2022, nosso PIB per capita vai crescer em média 0,9%, de 2017 a 2022, quase a metade da média de Chile, Argentina, México, Colômbia e Peru”, diz o economista Marcel Balassiano, do Ibre/FGV.
Em dólar, o PIB per capita do Brasil foi de US$ 16,2 mil, em 2014, para US$ 15,1 mil no ano passado, enquanto México e Tailândia subiram para US$ 17,9 mil e US$ 16,9 mil, respectivamente, segundo dados do Fundo Monetário Internacional (FMI) compilados pelo Banco Fibra.
“É preciso considerar as variações cambiais na comparação com outros países, mas o problema é que a política econômica anterior também desacelerou o crescimento do PIB potencial, por isso a recuperação sem reformas estruturais é lenta”, diz Cristiano Oliveira, do Banco Fibra. “A agenda reformista atual havia sido traçada, mas abandonada, por Fernando Henrique Cardoso e Lula. Para recuperar o tempo perdido, é preciso persistir numa política econômica que promova crescimento com produtividade e sem artificialismos.”