Juan Carlos Hidalgo-21.out.17/AFP | |
O premiê da Espanha, Mariano Rajoy |
DIOGO BERCITO - Folha de São Paulo
Com um gesto inédito, o governo espanhol destituiu nesta sexta-feira (27) o presidente catalão, Carles Puigdemont, depois de o Parlamento regional da Catalunha ter aprovado um processo constituinte para proclamar sua independência.
A destituição foi aprovada pela maioria absoluta do Senado e anunciada pelo premiê espanhol, o conservador Mariano Rajoy.
Rajoy também dissolveu o Parlamento catalão e afirmou que as eleições catalãs serão antecipadas para 21 de dezembro, quando estavam previstas apenas para o fim de 2019.
"É nessas horas de ânimos exaltados que importa a prudência e a serenidade, mas também a confiança de que o Estado dispõe de meios suficientes para, de forma pacífica, recuperar a normalidade legal", afirmou.
A decisão se baseia no Artigo 155 da Constituição, sob o qual o Estado pode forçar uma administração regional a cumprir a lei -neste caso, a Catalunha, território que tem insistido em sua independência, considerada ilegal pelo governo central.
Com a destituição do governo catalão, Madri irá assumir suas competências em caráter temporário, distribuídas entre os ministérios.
As representações catalãs no exterior, que servem como espécie de embaixadas, foram destituídas por Rajoy.
A aplicação Artigo 155 tem o apoio das principais siglas espanholas, como o PSOE (Partido Socialista Operário Espanhol) e o Cidadãos, de centro-direita. Mas esse texto nunca foi antes utilizado na Espanha, e as consequências são por ora imponderáveis.
INDEPENDÊNCIA
A destituição de Puigdemont se choca com o voto do Parlamento catalão, também na sexta-feira (27), no que foi interpretada como uma declaração unilateral de independência. Houve 70 votos a favor, 10 contra e 2 em branco para formar uma constituinte à república catalã.
A medida havia sido proposta pela aliança separatista Junts pel Sí, em acordo com a CUP (Candidatura de União Popular), cujos legisladores celebraram cantando o hino catalão Els Segador.
Foram essas duas forças que impulsionaram o plebiscito separatista de 1º de outubro. Menos da metade da população catalã apta a votar, porém, o fez: foram só 43%, sendo que, destes, 90% apoiaram a secessão.
"Sim. Ganhamos a liberdade para construir um novo país", declarou o vice-presidente catalão, Oriol Junqueras.
A declaração do Parlamento não tem valor legal e não foi reconhecida nem por Madri nem pelos principais interlocutores internacionais. Mas, em clima de celebração, sedes regionais do governo catalão, como a de Girona, retiraram a bandeira da Espanha de sua fachada.
Outras siglas, como o Partido Popular e o Cidadãos, deixaram a sala quando a votação foi anunciada -entre gritos rivais de "viva Catalunha!" e "viva Espanha!".
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Raio-x Catalunha |
Um legislador do partido Cidadãos contrário à independência rasgou na plenária o texto dessa votação.
Em meio ao agravamento da crise, o Ministério Público pode acusar Puigdemont e o restante da liderança catalã pelo crime de rebelião, que leva a até 30 anos de prisão. A acusação pode vir já na próxima segunda-feira (30).
Mas o fato de que o voto no Parlamento catalão foi secreto e feito em papel, apesar dos protestos da oposição, dificultará esse processo.
O Tribunal Constitucional espanhol deve analisar durante os próximos três dias um recurso apresentado pelo Partido Socialista da Catalunha para anular a declaração feita pelo Parlamento.
A declaração catalã foi rechaçada por importantes atores globais, como o presidente do Conselho Europeu, o polonês Donald Tusk. "Para a União Europeia, nada muda. A Espanha é o único interlocutor", ele afirmou.
O governo alemão, em uma nota, disse que "a soberania e integridade territorial da Espanha são e permanecem invioláveis. Uma declaração unilateral de independência por parte do Parlamento catalão é uma violação desses princípios".
Já um porta-voz do governo do Reino Unido disse que "esta declaração se baseia em uma votação considerada ilegal pelos tribunais espanhóis". A Itália se pronunciou nessa mesma linha.