Alguma coisa subiu à cabeça de Sérgio Cabral. E não se parece com bom senso. Interrogado por Macelo Brettas, o presidiário achou que seria uma boa ideia repetir com o juiz da Lava Jato no Rio de Janeiro a tática de suspeição que Lula utiliza em âmbito nacional contra Sergio Moro. Cabral fez pose de injustiçado. Injetou a família do juiz na sua prosa de vítima. Foi como se bulisse em caixa de marimbondos. Saiu ferroado. O magistrado determinou sua transferência para um presídio federal.
Multiprocessado, Cabral foi levado à presença de Bretas para se defender no processo em que é acusado de lavar dinheiro de corrupção na compra de joias da H.Stern. O detento não nega a aquisição das peças. Mas sustenta que foram compradas para presentear sua mulher, não para lavar verbas sujas. O dinheiro não é de boa origem, Cabral admite. Entretando, vem de sobras de campanhas eleitorais, não de propinas.
Lero vai, lero vem, Cabral decidiu dar uma aula para Bretras. “Não se lava dinheiro comprando joias.” Como se fosse pouco, o detento insinuou que sabe da vida do juiz mais do que ele poderia supor. “Vossa excelência tem um relativo conhecimento sobre o assunto, porque sua família mexe com bijuterias. Se eu não me engano, é a maior empresa de bijuterias do Estado.”
Cabral disse que seu governo não era uma quadrilha. Munido de autocritérios, declarou: “Trabalhei muito pelo Estado do Rio.” O magistrado aconselhou o depoente a responder às perguntas. “O senhor está querendo criar mais uma vez o discurso de injustiçado”, disse. Cabral não se deu por achado: “É meu direito dizer que sou injustiçado. O senhor está encontrando em mim uma possibilidade de gerar uma projeção pessoal e me fazendo um calvário.”
O juiz chamou o feito à ordem: “Não recebi com bons olhos o interesse manifestado pelo acusado de informar que minha família trabalha com bijuteria. Esse é o tipo de coisa que pode ser entendida como ameaça.” E Cabral: “Ameaça? Eu estou preso.” O tempo fechou. Nem a defesa do presidiário parecia entender aonde seu cliente queria chegar. A audiência foi suspensa por cinco minutos.
Ao final, o procurador Sérgio Pinel, que representava o Ministério Público, requereu a transferência do preso para um presídio federal. “A prisão não tem sido suficiente para afastar o réu de informações de fora da cadeia”, justificou. Brettas achou uma boa ideia: “É no mínimo suspeito que o acusado, que não só responde a este processo, mas a 16, podendo ser mais… É muito inusitado que venha trazer ao juízo informação de que acompanha, talvez, a rotina da família do magistrado. […] Tem acesso privilegiado a informações que talvez não devesse ter.”
Há quatro cadeias federais no país: Catanduvas (PR), Porto Velho (RO), Mossoró (RN) e Campo Grande (MS). Caberá ao Ministério da Justiça informar para onde Cabral será enviado. Longe do seu habitat natural, o preso talvez descubra o valor das qualidades qualidades iniciadas em ‘H’. A honestidade é como a virgindade. Não dá segunda safra. E Cabral parece mais interessado em mimetizar Lula do que em restaurar a probidade perdida. Mas a humildade é coisa muito democrática. Está ao alcance de todos.