domingo, 1 de fevereiro de 2015

Patrimônio de Youssef é bem maior que o declarado, diz ex-sócio de doleiro

Mário César Carvalho - Folha de São Paulo


O empresário Leonardo Meirelles, que foi sócio de Alberto Youssef, diz que o doleiro tem patrimônio oculto e sociedades com empreiteiras que não foram declaradas no acordo de delação premiada que fez com procuradores.
Se isso for comprovado, o acordo pode ser anulado.

Em entrevista à Folha, Meirelles disse que o doleiro teria de R$ 150 milhões a 200 milhões, e não cerca de R$ 50 milhões, como está no acordo.

Meirelles foi preso em 14 de março do ano passado pela Operação Lava Lato, acusado de ter emprestado empresas para Youssef fazer remessas ilegais de até US$ 140 milhões ao exterior. Saiu em 11 abril após confessar os crimes.
O advogado do doleiro não quis comentar a acusação.

Alan Marques/Folhapress
Leonardo Meireles durante depoimento no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, em Brasília (DF)
Leonardo Meirelles durante depoimento no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, em Brasília
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Folha - Você era laranja do Alberto Youssef?
Leonardo Meirelles - Não. Eu emprestava empresas para ele fazer remessas e ganhava 1% do valor. Ganhei US$ 1,5 milhão, ou quase R$ 4 milhões, em quatro anos. Youssef tenta se colocar como vítima dos políticos, mas ele era o mentor porque fazia a ponte entre os setores público e privado, entre empreiteiras e a Petrobras. Em 2003, ele era um doleiro municipal, mas depois tornou-se um doleiro federal, com poderes em ministérios.

Ele comentava isso?
Não, mas estava na sala dele para receber instruções e ouvia as conversas.

Youssef era sócio de Ricardo Pessoa, da UTC, em um hotel e um empreendimento imobiliário. Ele era sócio de outras empreiteiras?
De forma oculta, sim. Em vários processos que ele intermediou para as empreiteiras, em vez de ganhar recursos, ele adquiriu percentuais do projeto.

Você sabe de algum caso?
Tenho de resguardar os casos porque estão sob investigação. Estou colaborando com a Polícia Federal. Isso ocorreu com três ou quatro empreiteiras. Nesses empreendimentos, são criados FIPs, fundos de investimento em participações.

Como assim?
Você cria um fundo de investimento e uma sociedade de propósito específico: consta o que será feito, o regimento que será seguido e o número de cotas. Essa empresa compra um terreno para fazer uma construção. Essa empresa não tem acionistas, tem cotas e essas cotas são ao portador. Não dá para saber quem são todos os cotistas. Isso é legal, amplamente utilizado e serve para construir de prédios a hidrelétricas.

Como Youssef virou seu sócio?
Eu tinha o projeto de laboratório, mas não tinha o parque fabril de insumo farmacêutico. Isso foi em 2009, 2010. A negociação com ele durou até 2013, quando vimos que dava para fornecer para o governo por meio de parcerias.

A parceria com o Ministério da Saúde seria possível sem a ajuda de integrantes do PT?
Seria impossível. Como a Labogen, só existem cinco empresas desse tipo no país, de insumos farmacêuticos. Isso é tratado pelo governo federal como uma questão estratégica, de interesse nacional. O Brasil não produz nem 5% dos insumos que são usados nos remédios que estão nas farmácias. Três anos atrás começaram os incentivos do governo federal porque esse setor é fundamental para o país. Estou falando de oncologia, de cardiologia, de remédios de ponta, que precisa de muita pesquisa. Eu comprei patentes na Coreia do Sul, na Índia, na Alemanha.

Daria para conseguir a parceria sem a influência do ex-deputado André Vargas?
Não. O Vargas foi colocado de forma equivocada e injustiçada nesse processo.
Por que você diz que o Vargas foi envolvido indevidamente?
Apadrinhamento político não quer dizer que eu dei algum tipo de recurso a ele. Nunca dei um centavo ao Vargas. Tudo que eu fiz em Brasília foi oficial. O ajuste político não era comigo. O Vargas voou no jato de Youssef. A relação com o Vargas era com o Youssef e outros sócios. Foram feitas sindicâncias do Ministério da Saúde e da Anvisa e elas não apontam irregularidade na Labogen. Se tivesse visto o Vargas receber algum benefício, eu falaria.

Mas houve influência política?
Teve influência política antes de montarmos a fábrica. Foi influência política do PT, por meio do André Vargas. Estive várias vezes com ele. Mas o projeto tinha viabilidade econômica e era de alto interesse para o país. Existe uma espécie de cartel entre as empresas farmacêuticas. São quatro, cinco empresas, todas capacitadas, não estou acusando ninguém. A Labogen não existiria sem apadrinhamento político.

Youssef assinou um acordo de delação em que entrega um patrimônio de R$ 50 milhões. Era esse o patrimônio dele?
Não. Tem muitas coisas ocultas, dentro de fundos ou são ao portador. O patrimônio dele é de R$ 150 milhões a R$ 200 milhões. O banco do Youssef, porque doleiro é como um banco, movimentava de R$ 30 milhões a R$ 40 milhões por mês.

Por que você decidiu confessar seus crimes?
Todas as provas são irrefutáveis. Está tudo documentado. Fiz as remessas pelo Banco Central. Fui solto em 11 de abril porque contei a verdade. Nunca mudei minha versão. Só não aceito que chamem a Labogen de empresa fantasma. Tenho licenças de 11 órgãos, todos dizendo que tenho uma fábrica operacional.