domingo, 22 de fevereiro de 2015

"Do silêncio ao vazio", editorial da Folha de São Paulo

Poderiam ter sido apenas patéticas, mas são preocupantes as declarações da presidente Dilma Rousseff (PT), após várias semanas de silêncio, sobre o caso Petrobras.

Repetiram-se, na sua entrevista de sexta-feira (20) –a primeira desde que começou seu novo mandato–, considerações já conhecidas de quem se recorda dos debates travados na campanha eleitoral.

Dilma voltou a insistir na tecla de que os casos de corrupção agora são investigados com mais rigor, dada a independência do Ministério Público e da Polícia Federal.

Ao reproduzir essa tática argumentativa na atual conjuntura, todavia, a presidente agrava a impressão de que nunca teve nada de efetivo para apresentar à sociedade diante da crise na Petrobras; nada, a não ser a quase envergonhada demissão de Graça Foster e a indicação de Aldemir Bendine para o comando da estatal.

Nessa troca de nomes, feita como que a contragosto, sem nenhuma afirmação verbal de liderança, sem nenhum sinal de que tomasse a condução política dos fatos, Dilma colocara-se como espectadora, reagindo diante do inevitável.

Esse seria o lado patético de sua entrevista: a falta de outro discurso além daquele, pífio, proposto pelos publicitários nas últimas eleições e a permanência de uma atitude inerte, passiva, diante do episódio.

O lado preocupante, todavia, chama mais a atenção. Transparece, na entrevista de Dilma, a expectativa de que ainda possa estar convencendo alguém quando projeta para 1996 ou 1997 a raiz da atual crise na Petrobras (talvez nem mesmo nos ambientes do petismo a tese ganhe credibilidade).

Se houvesse investigações sobre corrupção naquela época, "nós não teríamos o caso desse funcionário da Petrobras que ficou durante quase 20 anos [atuando no esquema]", disse a presidente.

Como se, depois de transcorrida a gestão de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), não tivesse havido o primeiro e o segundo mandatos de Lula, seguidos dos anos de governo da própria Dilma.

Pode-se, sem dúvida, discutir quando começou a corrupção na Petrobras. Mas o espantoso no raciocínio presidencial está em sugerir que Lula, Dilma e toda a camarilha são vítimas de irregularidades cometidas 20 anos atrás. Assim, PT, PMDB e PP, partidos que delatores apontaram como beneficiários de bilhões desviados, seriam meros bodes expiatórios.

Levando adiante o que sustentou a presidente, se Lula tivesse ganho as eleições em 1994, levando Dilma ao conselho da Petrobras, a rapinagem nunca teria chegado ao ponto a que chegou.

O cinismo, às vezes, confunde-se com a estultice; entre a falta de sensibilidade política, a fraqueza argumentativa e o desgaste de sua liderança, a presidente Dilma Rousseff rompe o silêncio para criar somente uma sensação de vazio ainda maior à sua volta.