terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Deu no 'JN': Testemunha reforça tese de que cartel dividia contratos da Petrobras

TV Globo


Ex-gerente jurídico da Petrobras diz que foi advertido por reclamar de desrespeito ao manual de procedimentos contratuais da estatal





A atuação das empreiteiras no desvio de dinheiro da Petrobras é relatada por várias testemunhas. E elas chamam de “clube” o grupo de empresas que se reuniram para dividir, entre elas, os contratos com a estatal. E, agora, uma nova testemunha reforçou a tese da existência desse cartel.
O ex-gerente jurídico da Petrobras Fernando de Castro Sá prestou depoimento ao Ministério Público Federal. Segundo ele, normas internacionais - criadas para dar segurança aos contratos - não eram bem seguidas pela Petrobras. “Adotava de uma forma meio tupiniquim”, relata.

Fernando Sá conta que inclusive as normas internas eram afrouxadas para favorecer as empreiteiras. Ele diz que, a partir de 2011, a Diretoria de Serviços, então comandada por Renato Duque, deixou de respeitar o manual de procedimentos contratuais da estatal.

“Eu vinha constantemente reclamando de que algumas reuniões, porque daí criaram uma Comissão de Direito Contratual. E quando chegava na proposição das coisas na reunião da comissão vinha assim: ‘Porque a Abemi solicitou, porque a Abemi quer’. E ai esse negócio foi me tirando do sério. Um dia eu escrevi abertamente, eu disse assim: ‘Os advogados da Petrobras estão trabalhando para Petrobras ou para Abemi?’ Ai eu fui advertido”, conta Fernando Sá.

Por causa das reclamações, ele conta que foi chamado junto com Venina da Fonseca, ex-gerente executiva da área de Abastecimento, para uma reunião com os ex-diretores Paulo Roberto Costa e Renato Duque e o ex-gerente Pedro Barusco. Os três são investigados pela Operação Lava Jato.

“Literalmente eu e a Venina levamos uma escovada do diretor Duque, que a gente estava atrapalhando, que a gente não sabia como as empreiteiras trabalhavam, que se não fosse do jeito que as empreiteiras faziam não ia se conseguir contratar”, afirma Fernando Sá.
A formação do cartel das empreiteiras também foi detalhada por Augusto Mendonça, da empreiteira Toyo Setal, em delação premiada. Ele disse que o cartel começou a ser organizar em meados da década de 90, no governo Fernando Henrique.
“Isso começou no meio dos anos 90. O setor passou por uma crise muito forte. Muito também por conta dos investimentos da própria Petrobras, da forma como a Petrobras contratava e geria esses contratos. De modo que algumas empresas através da associação Abemi, que é a associação das companhias de engenharia do Brasil, se organizaram e iniciaram uma conversa com a Petrobras, criando um grupo de trabalho no sentido de discutir e melhorar as condições contratuais de modo a que as empresas pudessem performar melhor”, conta Augusto Mendonça.
Mas que, segundo ele, o grupo se tornou efetivo a partir de 2004, já no governo Lula. “Isso passou a ter efetividade de fato a partir do ano de 2004, quando este grupo negociou com a diretoria da Petrobras, dois diretores da Petrobras, Paulo Roberto e Renato Duque, de modo que a lista de convidados fosse restrita às empresas que participassem desse grupo”, afirma Augusto Mendonça.

Essas informações passadas pelos ex-gerentes Fernando e Venina e pelo delator Augusto Mendonça vão ser usadas para reforçar as denúncias já propostas pelo Ministério Público Federal e também vão servir para aprofundar outras investigações que ainda estão em andamento.

Nas denúncias já feitas contra executivos de empreiteiras, o Ministério Público Federal revela que a composição do cartel variou com tempo.

A denúncia faz uma espécie de linha do tempo do cartel. Até meados da década de 2000, o cartel das empreiteiras, batizado de “clube”, era formado por nove empresas.

Em 2006, com o que os investigadores chamam de sofisticação da empreitada criminosa, o cartel foi ampliado, passou a contar com 16 empresas e com o auxílio de diretores da Petrobras - Renato Duque e Paulo Roberto Costa.

E em 2011, o “clube” teria alcançado tanta sofisticação que passou a contar com regulamento. As empresas negam a formação do cartel, dizem que, para conseguir qualquer contrato, eram achacadas pelos ex-diretores.
O PSDB disse que defende as investigações e que espera que elas sejam levadas a fundo para que os responsáveis pelo desvio bilionário da Petrobras sejam punidos. O partido declarou ainda que espera que as investigações ponham fim ao que chamou de "reiteradas tentativas de lançar suspeições sobre todos os agentes políticos". E que vai trabalhar para que a nova CPI da Petrobras atinja seus objetivos.
O PT foi procurado pelo Jornal Nacional, mas não se pronunciou. A Abemi negou que tenha alterado normas contratuais da Petrobras e que os contratos tivessem que passar pelo crivo da associação.