Alexandre de Moraes se mete em questões que legalmente não lhe dizem respeito ou, simplesmente, violam a Constituição e o restante das leis em vigor no país
É cada vez mais difícil, hoje, o ministro Alexandre de Moraes aparecer no noticiário sem que esteja provocando algum tumulto, ou se metendo em questões que legalmente não lhe dizem respeito ou, simplesmente, violando a Constituição e o restante das leis em vigor no país.
Seu último surto é a “convocação” de todos os comandantes das PMs estaduais para o seu gabinete em Brasília, com o propósito oficial de fazer “um balanço” de suas ações na última eleição, que acabaram há vinte dias, e discutir “as próximas”, que só vão acontecer daqui a dois anos.
Trata-se de pura e simples produção artificial, e deliberada, de confusão.
Em primeiro lugar, não cabe a um ministro do STF, em nenhuma hipótese legal, chamar as PMs do Brasil inteiro para tratar de assuntos operacionais; não faz parte de suas funções, nem de seus direitos como membro da Corte Suprema.
Além disso, é uma encenação flagrante: não pode sair disso nenhuma decisão que venha a beneficiar os cidadãos, nem melhorar a sua segurança, mas apenas tensão inútil, animosidade e desordem.
O que o ministro e o STF estão realmente querendo que as PMs façam?
Um dos projetos atuais de Moraes, pelo que ele tem dito em público, é proibir as repetidas manifestações populares que vêm sendo feitas diante de quartéis do Exército — e que ele já excomungou como “atos “antidemocráticos”, além de potencialmente “criminosos”.
O ministro não quer, ao que parece, nem a presença de gente “nas calçadas” próximas às guarnições.
Mas e se as pessoas continuarem a se reunir nos quartéis e suas vizinhanças — o que ele vai fazer? A lei não lhe permite chamar a polícia para dissolver manifestações públicas, e muito menos manifestações perfeitamente lícitas.
Mas os textos legais, até agora, nunca foram obstáculo para Moraes e o STF fazer o que bem entendem; ele pode, se lhe der na telha, mandar que sejam evacuadas as áreas próximas a instalações militares.
O problema é como executar isso na prática.
Comandantes de quartéis diante dos quais se fazem os protestos já afirmaram, com todas as letras, que não vão tirar os manifestantes de onde estiverem; houve, a propósito, discursos de chefes militares dizendo que a população tinha o direito legal de se manifestar pacificamente onde quer que fosse, inclusive na frente das casernas.
E então?
O ministro Moraes vai mandar a tropa de choque das PMs enfrentar a tropa do Exército para tirar as pessoas de lá?
Vão jogar gás lacrimogêneo e espancar a população na frente dos militares?
Vão abrir fogo, talvez?
É algo que ele deveria esclarecer nesta sua reunião com os comandantes das PMs.
Para executar o que decidiu, Moraes tem de dar ordens para a força policial reprimir os manifestantes, e isso, além de ilegal, é complicado de se fazer.
E se as PMs não obedecerem a essas ordens?
Um comandante já disse que não viu nenhum delito nas manifestações em sua área de atuação, e que não iria fazer nada a respeito.
Outros dois nem foram à reunião que o ministro convocou.
O mais simples, para o STF, seria não se meter nessa história; bastaria não tocar mais no assunto e deixar quieto, esperando que as pessoas se cansem com o tempo e parem, por conta própria, de se manifestar diante dos quartéis.
O problema é que este tipo de atitude não gera conflito, tensão ou desordem, e nem serve como exibição de força por parte do ministro Moraes e de seus colegas.
Não é, em geral, o que tem interessado ao Supremo.
Publicado originalmente no O Estado de S. Paulo
Revista Oeste