Muita gente me pergunta como vão ser as coisas depois da pandemia. Respondo que o ser humano é péssimo para prever o futuro. Quando insistem, digo que o futuro será igual diferente.
Como vou trabalhar, vender meus produtos? Igual diferente. Como vou viajar? Igual diferente. Isso pode tranquilizar as pessoas porque, mesmo quando o mundo muda, e a tradição do mundo é mudar, essências permanecem.
Os carros de Ford mantiveram as rodas e os bancos das charretes. E os motores dos carros até hoje são medidos em cavalos de potência.
Não jogamos tudo fora para parir o novo. Misturamos o que já existe para criar as novidades.
A mercearia aqui no condomínio começou a usar o zap para vender seus produtos e vai muito bem. Todo mundo que pode foi ou está indo para o digital. Milhões de serviços se digitalizaram na marra. O que levaria anos levou semanas. E esses novos entrantes estão renovando as novas plataformas.
Por que a loja de rua não pode se juntar com a loja do lado para criarem um shopping virtual, pelas redes, naquela vizinhança que conhecem tão bem? Isso já está acontecendo.
Esses inputs de quem ainda não era ligado em tecnologia, mas teve que se conectar, serão vitais para forjar esse igual diferente.
Market places digitais aceleram ainda mais sua expansão apresentando uma saída espetacular para negócios sem negócios e perspectivas. Aliás, o Alibaba explodiu depois da epidemia de Sars na China no começo do século, que fez o país e a Ásia darem um salto na digitalização.
O Brasil só vai sair dessa crise cuidando dos pequenos e médios empresários que agora estão ameaçados pela pandemia provocada pelo vírus chinês. São eles que põem a mão na massa, geram os empregos e fazem a economia do país rodar. Para essas pequenas empresas, os market places e a nova comunicação podem ser redentores. Eles são mais acessíveis e mais baratos do que os modelos e serviços que os precederam.
As empresas e os indivíduos vão ter de se transformar para seguirem entregando o que seguiremos desejando, como viajar, sair para jantar, encontrar os amigos.
A baixa estação pode ser a que terá os preços mais caros. A nova companhia aérea pode ser aquela que conseguir solução de ar fresco e saudável, tanto que se chamará Fresh Air. A melhor mesa do restaurante será ao ar livre. Isso tudo é chute, mas a inteligência humana adora dificuldade, desafio e risco. E já está criando o igual diferente.
Estou morando a 100 km de São Paulo e quero passar mais tempo aqui depois que isso tudo passar. O zoom me deixou mais perto dos meus clientes. Consigo mais qualidade de vida e foco no trabalho porque descobri que não trabalhava só na comunicação. Eu era também motorista, passava horas por dia no trânsito, mas essa nobre profissão não era a minha profissão.
E o home office é mais sadio que o office home daquelas pessoas que moravam no trabalho. Aquilo, que eu também pratiquei, não era sadio. Não acredito também no home office pleno. Daqui a pouco a minha mulher vai me matar...
Vou mudar da minha casa em São Paulo para um apartamento porque percebi que não precisava de tanta coisa. Por que quis tudo isso? Porque você me vendeu isso como publicitário, respondo a mim mesmo. Assim como estou conversando comigo mesmo, o mundo está conversando consigo mesmo.
O que vamos querer? Minha aposta é que vamos gastar mais em serviços do que em produtos, mais em experiencias do que em consumo. O século 21 é o século do aprendizado permanente e das profissões que serão mais arquitetura do que construção. Este doloroso freio de arrumação está nos preparando para isso.
Folha de São Paulo