A crise econômica que se avizinha para o pós-pandemia provocada pelo vírus chinês na Argentina será imensa, é o que dizem 10 de cada 10 economistas com quem se conversa nos dias de hoje. Três notícias recentes começam a mostrar que o cenário, de fato, não pinta bem para o médio e longo prazo. Uma delas foi o anúncio do encerramento de operações da Latam Argentina, que deixará sem empregos mais de 1.700 funcionários, e causará desemprego indireto nos destinos turísticos para os quais a aerolínea voava. Além disso, deve aumentar o preço das passagens internas disponíveis, favorecendo uma das únicas aerolíneas locais de porte, a Aerolíneas Argentinas.
Outra notícia foi o novo adiamento do prazo para negociação da Argentina com seus credores. O país deve mais de US$ 60 bilhões, e vem negociando, por enquanto, com três grandes grupos de credores uma reestruturação de sua dívida em lei estrangeira. Já foram desobedecidos quatro prazos, e agora o país tem como último deadline para essa parte da dívida o próximo dia 24 de julho.
Tecnicamente, o país já está numa “moratória técnica”.
Porém, com os EUA e o FMI (Fundo Monetário Internacional) vêm ajudando a acalmar a raiva dos credores, estes ainda não declararam a Argentina em moratória nem buscaram a Justiça. Isso basta, pelo menos para o governo argentino, para dizer que não está em “moratória”. Mas, como a possibilidade de cumprir esses compromissos parece distante, e os credores vão chutando a bola pra frente como quem também não acredita, é bastante possível que o “calote técnico” vire “calote real” nas próximas semanas.
Isso fará com que a Argentina volte a ser pária no mercado financeiro internacional, perdendo acesso a linhas de crédito justamente quando poderá necessitar delas, para recuperar-se dos efeitos da pandemia.
E o terceiro fato que agrava a situação da Argentina foi a tentativa do governo de expropiar… isso mesmo, expropiar, uma empresa privada de processamento de cereais, a Vicentín, em nome da “soberania alimentar” do país. A oposição aí não perdoou a atitude que mais se parecia às medidas bolivarianas de Hugo Chávez em seu auge. Houve buzinaços e manifestações. Também muita pressão do meio empresarial, e a Justiça acabou derrubando a decisão do governo. Por enquanto.
Obviamente, é cedo para fazer comparações com outros momentos históricos, que sempre deixam lacunas e passam por cima de peculiaridades. Em 2001, uma delas era o fato de governo ser não-peronista, o que é importante pois líderes peronistas têm instrumentos para a contenção popular que outras forças não possuem. Outra, é que em 2001, as ruas marcaram o passo da crise desde o começo, e desta vez isso não ocorre, por conta da pandemia. Outro elemento que não existe agora é uma divisão política muito exacerbada. Isso não ocorre porque a pandemia fez com que a oposição (ou turma do Macri) se sentasse na mesma mesa do governo (a turma da Cristina), eliminando, por ora, os possíveis atritos em nome da saúde pública.
Porém, mesmo com essas ressalvas, será muito difícil que o governo de Alberto Fernández evite o que fatalmente virá, assim como aconteceu em 2001, uma das piores crises econômicas que o país já teve. Depois de 2001, foram 15 anos para que o panorama econômico começasse a melhorar na Argentina. Outro tombo agora e mais outros 15 anos para recuperação seria acabar com as perspectivas de mais uma geração de argentinos.
Além dos casos Latam, Vicentín e dívida, vejamos o que mais está mal e sem possibilidade de melhora imediata:
_ Para sustentar seus planos de auxílio aos que necessitam nessa pandemia, o país está emitindo moeda, o que pode fazer com que a inflação aumente.
_Há fortes restrições para comprar dólar, e uma diferença de mais de 100% entre o dólar oficial e o paralelo, o que também pode fazer disparar a inflação quando a pandemia terminar, além de impactar no comércio exterior.
_O governo estima que o PIB encolherá 4% neste ano, mas a visão do FMI é mais pessimista, e joga o número para 5,7%, isso num cenário que já era recessivo antes da pandemia.
_Antes da emergência sanitária, a pobreza era de 40% da população. Agora, se estima que vá subir para mais de 50%, com o aumento do desemprego.
_As medidas restritivas da quarentena, que impedem a abertura de comércio não essencial, já fez com que fechassem as portas de modo definitivo 20% das lojas de Buenos Aires.
_Segundo a UIA (Unión Industrial Argentina), se a quarentena tiver mais de 100 dias (o que ocorrerá nesta semana), 40% das indústrias terão seu funcionamento comprometido.
_A produção das pymes (pequenas e médias empresas) caiu 34,9%, e elas correspondem a 70% do emprego na área privada.
_Por decreto, Fernández impediu empresas públicas e privadas que demitam durante a pandemia. Mas isso não vai evitar a demissão em massa que deve ocorrer assim que esse decreto perder a validez.
Obviamente não há saída fácil no pós-pandemia nem para a Argentina nem para ninguém. Porém, a crise econômica aqui parece que será mais intensa do que em outros países da região que não estavam em recessão antes, como a Colômbia ou o Peru.
Alberto Fernández, que tinha 81% de popularidade no começo da pandemia, muito por conta da mão-firme para conter o coronavírus, agora está com 60% de aprovação popular. Como disse antes, é difícil que haja uma explosão nos bairros populares num governo peronista, mas isso não significa que eles estejam passando bem. E que a pandemia poderá segurar manifestações anti-quarentena, anti-governo e pró-abertura da economia.
Essas manifestações já vêm ocorrendo todos os sábados. E, neste último (20), ela foi maior. Ocorreu no Obelisco, na Praça de Maior, em Rosário, Córdoba e outras cidades. Este setor da população que gritou contra a nacionalização da Vicentín é o mesmo que já chama a gestão de Alberto Fernández de “infectadura”. Por enquanto, não é majoritário. Mas não será o momento de o governo mudar de estratégia?
Com informações de Sylvia Colombo, Folha de São Paulo
Em tempo: Argentina, não é novidade, retornou à cartilha do Foro de São Paulo. Governo perdulário, populista, corrupto, e farós apontados para o comunismo, que está levando, outra vez, milhares de pessoas às ruas para protestar. Como os argentinos já viram o filme várias vezes, sob o peronismo e seus seguidores, tipo Kirchner, sabem o roteiro e final infeliz.